Receituário antigo, tragédia anunciada

Receituário antigo, tragédia anunciada

Equilibrar as contas não é narrativa, é matemática

Guilherme Baumhardt

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Fernando Haddad, ministro da Fazenda, quer meter a mão no seu bolso. Há alguns dias, o sujeito que colava nas provas de economia anunciou um pacote que pretende aumentar em mais de R$ 240 bilhões a arrecadação do governo federal. Deste total, apenas R$ 25 bilhões representam cortes de gastos (algo para esperar sentado, em se tratando de governo petista). O restante da grana vem de impostos e de um Refis (programa de refinanciamento de dívidas de empresas com a União). Ou seja, de um jeito ou de outro, sairá do meu, do seu, do nosso bolso. Isto é, em essência, um governo petista. Já estão com saudades do Paulo Guedes?

A própria imprensa – por falta de qualificação e por cair fácil no discurso de muito político – adota o mantra arrecadatório. “Governo teme perda de receita” ou ainda “administração pública teme não fechar as contas” são frases recorrentes no noticiário. Governo perder receita significa mais dinheiro no seu bolso. É simples. O setor público não gera riqueza. Quem gera riqueza é o setor privado. Se o setor público tem dinheiro em caixa é porque ele – via tributos – tirou este dinheiro do seu bolso. Ou seja, governo perder receita significa, salvo exceções, que você terá mais dinheiro na carteira.

Quando você não consegue fechar as contas em casa, medidas precisam ser adotadas. Você gasta menos, economiza, deixa de consumir um ou outro produto. Governos, em geral, estão mal-acostumados. Quando entram no vermelho, eles têm uma saída que você não tem: aumentar impostos. Ou seja, tirar mais dinheiro de você, o que não deixa de ser uma tremenda covardia produzida por gente que não conseguiu, por exemplo, enfrentar corporações.

Em linhas gerais, cidades, estados e países prósperos deixam que os seus cidadãos decidam como devem gastar aquilo que é fruto do seu suor, do seu trabalho. São lugares que não impõem uma terceirização à força, via cobrança tributária. São ambientes em que abrir uma empresa e fazer negócios é fácil. E é aí que a riqueza é gerada. Aliás, neste sentido Porto Alegre está de parabéns. A capital do Rio Grande do Sul assumiu o primeiro lugar em um ranking que mede o ambiente de negócios dos municípios. A conquista é resultado de uma equação simples, mas que muito político ainda não entendeu: a administração pública é uma prestadora de serviços e que deve ser norteada pela lógica do “fazer mais, com menos”. Além disso, o aumento do IPTU foi cancelado e outros tributos foram reduzidos. Há segurança jurídica e o governo municipal ajuda e não atrapalha.

Esperar que um governo petista entenda isso é querer demais. Basta ver Lula reclamando que não conseguirá aumentar o salário-mínimo como pretendia e chamar o equilíbrio das contas de “narrativa”. Não é narrativa, é matemática.

Narrativas fajutas

A turma que assumiu o Palácio do Planalto já percebeu que a lenga-lenga de que havia uma “herança maldita” não vai colar. Jair Bolsonaro e Paulo Guedes entregaram um país muito mais equilibrado do que receberam. E só não conseguiram mais em função da pandemia e de um Congresso refratário a reformas (a da Previdência, por exemplo, poderia ter sido muito melhor se a proposta aprovada fosse a original, e não com os arremedos que foram inseridos pelo Congresso). Se bater nesta tecla é perda de tempo – até a imprensa que fez oposição cega e sistemática a Bolsonaro e Guedes reconhece o mérito da gestão econômica –, o jeito é encontrar outra narrativa.

A onda do momento é dizer que o Brasil vai ser novamente inserido na agenda mundial e que o país estava isolado. Balela, conversa furada. Nenhum país do mundo que esteja isolado caminha como o Brasil caminhou rumo à OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Além disso, foram estabelecidos inúmeros acordos bilaterais, independentes do Mercosul. A turma que quer passar este cachorro é a mesma que acredita que estar inserido no mundo é viajar para países subdesenvolvidos e anunciar perdão de dívida. Nisso, Lula foi realmente campeão. Só que fez isso com o seu dinheiro.


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