Índia é a aliança cobiçada

Índia é a aliança cobiçada

Tensões diplomáticas e estratégias geopolíticas se entrelaçam enquanto o presidente Joe Biden busca reparar uma declaração infeliz, na qual chamou o líder chinês Xi Jinping de ditador.

Jurandir Soares

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O presidente Joe Biden procurou minimizar nesta quinta-feira a desastrada declaração que fizera na quarta, quando, evocou o superado episódio do balão chinês explodido pelos Estados Unidos e chamou o líder chinês Xi Jinping de ditador. Isto um dia após seu secretário de Estado, Anthony Blinken, ter sido recebido em Pequim por Xi Jinping e ter conseguido distensionar as relações entre as duas potências. Fato que gerou fortes protestos dos chineses, inclusive por parte do embaixador do país em Washington. Biden falou à imprensa na quinta-feira e disse que suas palavras não terão maior repercussão e que ele espera encontrar-se com Xi brevemente. Sempre tenho reafirmado que a política dos EUA para com a China e a Rússia não é uma política de governo, mas de Estado. Basta observar as atitudes tomadas ao longo do governo Trump e que tiveram continuidade com Biden. A desastrada manifestação de Biden se constituiu num escorregão que fugiu do script.

O remendo ao que havia dito aconteceu enquanto recebia, com toda a pompa, na Casa Branca o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi. Foram concedidas a ele, que é apenas chefe de governo, as honras de chefe de Estado. Tudo porque os Estados Unidos querem reforçar a aliança com aquele que passou a ser o país mais populoso do mundo. E que também vem se tornando uma potência na Ásia, a ponto de ser um parceiro importante no chamado grupo Quad, que tem como componentes, além de EUA e Índia, o Japão e a Austrália. Este grupo fora criado justamente para ser uma oposição à China no Indo Pacífico. Área marítima que a China ocupa como se fosse sua propriedade, apesar dos protestos dos vizinhos Vietname, Filipinas, Malásia e outros. Ocupa as ilhas e cria ilhas artificiais onde coloca bases militares.

Assim é que, enquanto busca um diálogo com China, procurando aliviar as tensões e também procura afastá-la da Rússia, EUA busca também se precaver contra as ações do gigante asiático. Foi neste contexto que surgiu o Quad, oficialmente conhecido como “Quadrilateral Security Dialogue” (Diálogo Quadrilateral de Segurança). Porém, trata-se de uma aliança informal entre os quatro países, que procuraram incrementar seus laços econômicos e de segurança com o objetivo de manter “os oceanos livres e abertos” para o tráfego marítimo. Na realidade, a cooperação entre eles começou em 2004, por ocasião do tsunami no Oceano Índico. Mas hoje os países – todos democracias – trabalham em uma agenda muito mais ampla, que inclui lidar com questões de segurança, econômicas e de saúde na região. Foi o comportamento cada vez mais agressivo da China na região que fez com que os líderes dos quatro países buscassem, a partir de 2021, definir uma agenda de cooperação.

Este encontro com Modi visou também afastar a Índia da Rússia, principal fornecedor de armas para os indianos. E, até certo ponto, Biden conseguiu dois avanços nesse aspecto. Por exemplo, os EUA assinaram uma transferência de tecnologia de motores para a Índia, que começará a produzir seus próprios aviões de combate. Ao mesmo tempo, a Índia, que não condenara a Rússia pela invasão da Ucrânia, assinou um comunicado conjunto em que os países fazem um apelo por respeito “ao Direito Internacional, aos princípios da Carta da ONU e à integridade e soberania territoriais”. Ou seja, aquilo que os EUA defendem. Modi disse que seu país está “completamente pronto para contribuir de qualquer forma para restaurar a paz” na Ucrânia. E ainda de acréscimo, Índia concordou em remover tarifas para certos produtos americanos, como grão-de-bico, lentilhas e amêndoas.

Enfim, neste tabuleiro da geopolítica os EUA conseguiram mover a seu favor algumas peças importantes nesta semana. O fundamental é Biden não dar mais uma escorregada.


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