A China ao lado da Rússia

A China ao lado da Rússia

A bela cidade de São Petersburgo, que é um museu a céu aberto, viu-se em tensa agitação nesta terça-feira, tendo inclusive fechado o seu espaço aéreo

Jurandir Soares

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A bela cidade de São Petersburgo, que é um museu a céu aberto, viu-se em tensa agitação nesta terça-feira, tendo inclusive fechado o seu espaço aéreo. Tudo por um iminente ataque aéreo que fora anunciado, mas que não passou de uma ação de hackers que invadiram servidores de rádios e TVs de cerca de uma dúzia de cidades e divulgaram uma mensagem de ataque iminente com míssil. Houve uma interrupção do tráfego aéreo pela manhã em um raio de 200 km em torno do aeroporto de Pulkovo, em São Petersburgo. A agência de notícias RIA-Novosti, citando uma fonte anônima, afirmou que o motivo foi o avistamento de um objeto não identificado, talvez um drone, e que caças foram enviados para tentar elucidar o caso, sem sucesso. Segundo o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, Putin foi informado sobre a ocorrência em São Petersburgo, cidade natal e berço político do presidente. A interrupção durou uma hora e acabou por volta das 12h (6h em Brasília), com vários voos tendo dado meia-volta, segundo sites de monitoramento aéreo.

Esta ação, pelo que consta, não passou de ficção. Mas, evidentemente, causou enorme preocupação na Rússia. Pois já houve precedente de ataque ucraniano com o uso de drones. Vale lembrar que no início de dezembro duas bases aéreas russas de grande importância estratégica foram atacadas por drones ucranianos. Foram as bases de Engels, em Saratov, e de Diaguilevo, perto de Ryazan, sendo esta última situada a apenas 240 quilômetros de Moscou. Foi a primeira vez que a Ucrânia conseguiu penetrar mais de 600 quilômetros dentro da Rússia sem que seus drones fossem interceptados pelas defesas antiaéreas, desde o início da guerra. De acordo com a inteligência britânica, dois bombardeiros Tu-95 Bear foram danificados devido à explosão na base aérea de Engels e três pessoas morreram em Diaguilevo na explosão de um tanque de combustível. Na ocasião o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, deixou claro que o ataque foi com o uso de dispositivos próprios da Ucrânia, tendo em vista que os Estados Unidos não querem que a Ucrânia use os armamentos que manda para atacar dentro de território russo. É para ser apenas para uso defensivo.

Mas o episódio dos objetos voadores não identificados de São Petersburgo ocorre no mesmo momento em que EUA e China vivem uma crise em torno de igual tema. E também no momento em que o presidente da Belarus, Aleksandr Lukashenko, fiel aliado de Vladimir Putin, se encontra na China para conversas com o presidente Xi Jinping. E a primeira informação que transpirou foi o apoio de Lukachenko à proposta chinesa para um cessar fogo na guerra da Ucrânia. Uma proposta que o Ocidente está desconsiderando por entender que a China está ao lado da Rússia por não ter condenado a invasão da Ucrânia. Insisto, porém, que a proposta chinesa deveria ser levada em consideração, por um detalhe significativo: a parte que fala na defesa da integridade territorial. Isto pressupõe a integridade da Ucrânia de antes da guerra. O que, por dedução, implica na saída russa dos territórios que está ocupando. O que é uma reivindicação do presidente Volodymyr Zelensky. Só que ele está insistindo também na recuperação da Crimeia, tomada pela Rússia em 2014. Este é outro tema, porque a Crimeia, até 1954, já era território russo. Por outro lado, o plano chinês prevê também a segurança da Rússia, o fim de sanções e da expansão de blocos militares. Isto diz respeito à Otan, a aliança militar liderada pelos EUA que, com a entrada da Ucrânia, estaria junto à fronteira russa, o que, aliás, foi a causa da guerra.

Em última análise, a proposta chinesa é muito clara e oferece as condições para a paz, se ambos os lados realmente a estiverem buscando. Esta desconsideração de EUA e Otan para com ela deixa implícito um interesse em continuar a enfraquecer a Rússia, até porque preparam o envio de tanques e novos armamentos para a Ucrânia. A qual, é preciso salientar, é quem mais sofre com a continuidade da guerra. Afinal, até agora não morreu no conflito nenhum soldado norte-americano ou europeu. E se o conflito e a desconsideração para com a China continuarem, o Ocidente poderá ver aquilo que teme: a China realmente se tornar um aliado da Rússia.


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