A perigosa aliança com a China

A perigosa aliança com a China

O Brasil é um país livre, democrático e tem todo o direito de firmar compromissos com quem quiser.

Jurandir Soares

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O presidente Lula assinou, nesta sexta-feira, 15 acordos com seu colega Xi Jinping e declarou que ninguém proibirá o Brasil de aprimorar o elo com a China. Uma declaração que demonstra ter um endereço certo: os Estados Unidos, que mantêm com a China a chamada Guerra 2.0 e uma profunda divergência no que toca a Taiwan. O Brasil é um país livre, democrático e tem todo o direito de firmar compromissos com quem quiser. No entanto, seu governante tem a obrigação de manter as boas relações com todos os países, em especial com aqueles que são nossos principais parceiros comerciais. E neste caso estão, evidentemente, os Estados Unidos, que por muito tempo foram o número um em nosso intercâmbio comercial. É sabido que nos últimos anos a China assumiu esse lugar. Porém, isto não pode ser fator de desprezar o mercado norte-americano. Até porque este intercâmbio segue em crescimento. Basta ver os números divulgados nesta sexta-feira pela Amcham, a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. A nota diz: “As exportações brasileiras para os EUA atingiram o recorde de US$ 8,7 bilhões no 1º trimestre de 2023, revela análise inédita da Amcham Brasil. O Monitor do Comércio Brasil-EUA, elaborado pela entidade, indica um aumento de 9% em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado representa quase o dobro da taxa de crescimento das exportações brasileiras para o mundo (4,8%)”.

É claro que não podemos perder a oportunidade de ampliar os negócios com a China, até porque o país asiático passou a ser um dos principais atores do comércio internacional, senão o principal. Segundo divulgou nosso Ministério da Fazenda, a projeção é de investimentos de 50 bilhões de dólares, envolvendo obras de infraestrutura e parcerias público-privadas, e um protocolo para fabricar e operar satélites CBERS-6. Há possibilidade até de a fabricante de carros elétricos BYD comprar a fábrica que a Ford desativou na Bahia para produzir os veículos no Brasil.

Foi acenado também com a participação do Brasil no programa Road and Belt Iniciative, que é chamado de a Nova Rota da Seda. Trata-se do maior plano de investimentos mundial. Criado em 2013, ele envolve nada menos do que US$ 5 trilhões, dinheiro que está sendo investido em 65 países, que juntos concentram 63% da população global, distribuídos por Ásia, Europa e África. E já está chegando à América Latina. A projeção é de investimentos ao longo dos próximos 40 anos. O objetivo é nítido. O megaprojeto inclui financiamento e construção de portos, rodovias, ferrovias, gasodutos, oleodutos e centros de distribuição, tudo para favorecer as exportações chinesas. Mas há um aspecto sombrio por trás desse programa. Está no fato de que, se o país não consegue pagar o financiamento, a China toma para si a respectiva obra. Isto já aconteceu no Sri Lanka, onde os chineses construíram um porto. O governo local não conseguiu pagar e então a China impôs a tomada da administração do porto por 99 anos. O mesmo aconteceu com um dos países de destaque da Europa, a Itália. Envolveu o porto de Trieste, que passou para as mãos dos chineses.

O Itamaraty vem afirmando que o Brasil não precisaria aderir ao projeto porque já é alvo de parte significativa dos investimentos internacionais chineses. E é verdade. Só nos últimos quatro anos os investimentos chineses no Brasil cresceram 79%. No entanto, o Itamaraty bate com uma ala do governo que quer uma adesão a tudo que a China oferece. E aí vem o perigo, que pode ser observado pelas próprias declarações de Lula. “A compreensão que o meu governo tem da China é a de que temos que trabalhar muito para que a relação Brasil-China não seja meramente de interesse comercial”, disse. “Queremos que a relação transcenda a questão comercial.” Pela manhã, no encontro com o presidente do Congresso Nacional do Povo, Zhao Leji, Lula já havia dito querer “elevar o patamar da parceria estratégica e, junto com a China, equilibrar a geopolítica mundial”. Observem a pretensão: parceria com a China para equilibrar a geopolítica mundial. Esta parceria já está sendo implementada com a contestação à utilização do dólar nas transações comerciais entre os parceiros dos Brics. Ou seja, estamos diante de um alinhamento amplo com a China e de uma certa afronta aos EUA. Nos ligamos a um país comunista e nos distanciamos, desnecessariamente, de um país democrático que, apesar dos pesares, ainda é o que tem o maior número de empresas estrangeiras operando em território brasileiro.

 


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