A reaproximação EUA-China

A reaproximação EUA-China

Os EUA apoiam a política de um país, a China, e não apoiam a independência de Taiwan ou qualquer mudança unilateral, disse Anthony Blinken.

Jurandir Soares

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Depois de muitos adiamentos, especialmente em decorrência da explosão pelos Estados Unidos de um balão de observações chinês, o secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, chegou à China neste domingo, para buscar uma convergência de pensamentos entre as duas potências, que vêm travando o que se convencionou chamar de Guerra Fria 2.0. Outro acontecimento mais recente também chegou a colocar em perigo a viagem: o anúncio de um acordo para a China estabelecer bases de inteligência em Cuba.

Mas Blinken viajou e foi muito bem recebido. Encontrou-se no domingo com o seu equivalente, Qin Gang, e nesta segunda-feira foi recebido pelo presidente Xi Jinping, num encontro que não estava programado, mas que foi apontado como uma boa vontade da China de melhorar as relações com os Estados Unidos. Na pauta das conversações, três assuntos principais. A cooperação em desafios globais, como mudanças climáticas ou pandemias; trocas e disputas econômicas justas; e convivência pacífica entre os dois regimes. Dois regimes que se diferenciam profundamente no que toca a parte política, pois um é democrático e o outro é uma ditadura. Mas se igualam na parte econômica, pois neste setor a China passou a ser um ator global. O desafio é fazer com que haja competição entre os dois países e não conflito. Neste aspecto está o embargo que os EUA aplicaram aos semicondutores chineses. O que a China considerou uma manobra injusta, ameaçando retaliar.

No entanto, o que pesa mais é o fato de a China estar numa ação expansionista econômico-militar, atuando em áreas tradicionais de influência Ocidental. Com o seu programa Belt and Road Iniciative, considerado a Nova Rota da Seda, a China está financiando obras de infraestrutura pela Ásia, Europa, África e já está chegando à América Latina. São rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. A China financia e constrói. Se o país não paga o financiamento, ela assume o controle. E um detalhe fundamental: com ou sem controle do país, em caso de guerra essas obras servirão de apoio para forças chinesas. Sem contar a expansão chinesa pelo Indo-Pacífico, onde constrói ilhas artificiais para servir de base militar. Tudo isto soma-se às preocupações de Washington.

Apesar de todos esses problemas, EUA tem procurado ser pragmático. Ao olhar para o mercado chinês de 1,4 bilhão de habitantes, percebe, de uma parte, uma mão de obra barata para suas empresas que lá se estabelecem. De outra, um crescente e poderoso mercado para os seus produtos. Afinal, a China tem hoje 300 milhões de pessoas de classe média. Além disto, busca afastar de Vladimir Putin aquele que hoje é o seu principal aliado.

No entanto, há outro grande problema entre os dois países e diz respeito a Taiwan. A ilha capitalista que a China considera uma república rebelde e quer reanexar. Algo que tem sido motivo de frequentes atritos entre Washington e Pequim. Os EUA têm fornecido armamentos para Taiwan e acenado com a possibilidade de defesa da ilha em caso de invasão. Posição que irrita profundamente a China. Pois, no encontro com Xi Jinping, Anthony Blinken parece ter esclarecido o assunto. Em coletiva de imprensa em Pequim, o secretário de Estado disse que “os EUA apoiam a política de um país, a China, e não apoiam a independência de Taiwan ou qualquer mudança unilateral”. Ou seja, reconhecem a China, não defendem a independência de Taiwan, mas também não aceitam uma decisão unilateral, que seria a falta de um acordo entre Pequim e Taipé para reunificação, com a consequente invasão da ilha pela China. Só que fica cada vez mais claro que, se a China invadir Taiwan, os Estados Unidos não irão sair em defesa da ilha. A estas alturas os negócios com a China e a questão geopolítica prevalecem.

Mas, enfim, ao buscar uma maior aproximação com a China, os EUA distanciam Pequim de Moscou. Hoje a China é o principal aliado da Rússia de Vladimir Putin. Mas, como disse o velho diplomata ex-secretário de Estado Henry Kissinger, do alto dos 100 anos de idade: “Creio ser possível criar uma ordem mundial com base em regras que Europa, China e Índia possam compartilhar”. Vale lembrar que Kissinger foi o responsável pelo reatamento com a China lá nos anos 1970, quando ele era secretário de Estado.


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