Aceno de mudança na Argentina

Aceno de mudança na Argentina

O problema é a falta de numerário da moeda americana no país.

Jurandir Soares

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Se a 22 de outubro confirmar-se o resultado das primárias realizadas neste domingo, o libertário Javier Milei irá suceder o peronista Alberto Fernandez no governo da Argentina. Claro que até lá muita articulação política será desenvolvida, especialmente pela candidata da coligação de direita Juntos pela Mudança, a ex-ministra da Segurança do governo Macri, Patrícia Bullrich. Assim como pelo candidato governista, o atual ministro da Economia, Sergio Massa. Este, apesar de ser o responsável direto pela crise econômica que vive o país, teve a coragem de concorrer, que o atual ocupante da Casa Rosada não teve.

As primárias na Argentina, chamadas de Paso, têm o papel de facilitar a vida dos partidos, buscando definir aqueles que irão concorrer em outubro. O exemplo mais claro da importância da eleição deste final de semana ficou por conta da coligação de direita Juntos pela Mudança, que tinha dois pretendentes à indicação. O prefeito de Buenos Aires, Horácio Larreta, que conquistou 11,3% dos votos e perdeu para Patrícia Bullrich, que alcançou 17%. No somatório foram 28,3%, ficando atrás do movimento A Liberdade Avança, de Milei, que chegou a 30,2%. Mas à frente do esquerdista Sérgio Massa, que bateu o sindicalista Jaun Grabois e somou 27,2%. Uma peculiaridade das primárias é que o partido que não alcançar 1,5% da votação fica fora da disputa de outubro. Além de presidente e vice, os argentinos irão eleger 130 dos 260 deputados e 24 dos 72 senadores, que representam as oito províncias do país. Vão eleger também 43 deputados para o Parlasul, o Parlamento do Mercosul. Você sabia que existe? Não temos livre trânsito entre os países do bloco, não temos uma legislação unificada de trânsito, nem tampouco uma sanitária. Para dirigir na Argentina temos que ter uma “carta verde” e ficamos sujeitos a exigências diferenciadas de equipamentos para os veículos e por aí afora, Mas temos um Parlamento do Mercosul! A pergunta é: para que serve?

Voltando ao processo eleitoral argentino, o novo governante terá o desafio de conter a inflação, que fechou os últimos 12 meses em 116% e que é a maior preocupação para 55% dos argentinos, segundo pesquisa da Universidade de San Andres. A segunda preocupação é a segurança, com 38%. Para conter a inflação o novo governante terá que tomar algumas medidas amargas, como cortar algumas benesses que são oferecidas pelo Estado, como os subsídios a luz, água, gás e transporte. O governo terá também que procurar entrar na era digital e parar de imprimir moeda, o que tem feito a rodo nos últimos tempos e que é um dos fatores de desvalorização do peso. Aliás, já se está precisando de 600 pesos para adquirir um dólar. E a propósito, uma das propostas de Milei é dolarizar a economia da Argentina, à semelhança do que já foi feito no Equador em 2000, em El Salvador em 2001 e no Panamá desde 1904. Os argentinos já têm a cultura de negociar praticamente tudo em dólar.

O problema é a falta de numerário da moeda americana no país. Por exemplo, a seca prejudicou tremendamente a última safra. Consequentemente, venderam menos para o exterior e receberam menos dólares. Milei quer também acabar com o Banco Central, mas o seu mote que mais ecoa é a luta contra a corrupção. Este mal endêmico da América Latina parece estar mais forte na Argentina do que no Brasil. Lá, caracterizado ultimamente pelas administrações dos Kirchner. Aliás, Cristina parece estar querendo sair de cena. Porém, seguramente irá ainda concorrer a um cargo de senador, para manter sua imunidade parlamentar e não ir para a cadeia pelas condenações que já recebeu. E, apesar de tudo, não faltará eleitor para ela.

Para finalizar, mais duas colocações. Uma, a urna usada na Argentina é semelhante à que a direita queria que fosse usada no Brasil. Lá o eleitor votou em urna eletrônica a qual forneceu-lhe um comprovante, em que ele pode conferir o seu voto e depois colocá-lo em uma outra urna convencional, para o caso de necessidade de auditoria. E outro fator é a indagação que é feita, se alguém da oposição ganhar, lembrando o governo Macri. Ele derrubou o candidato peronista, mas foi impedido de governar pelos movimentos peronistas. Neste caso, conforme o analista Gustavo Segré, é fundamental o vencedor ter a maioria no congresso para poder aprovar seus projetos. Com o que fica esta condicionante: não será suficiente para um candidato ganhar a presidência, terá também que compor a maioria no Parlamento.


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