Argentina afunda e Milei cresce

Argentina afunda e Milei cresce

Argentina enfrenta desafios econômicos e políticos enquanto se aproxima das eleições presidenciais

Jurandir Soares

publicidade

A Argentina colocou em circulação nesta semana a nota de dois mil pesos. Pois o valor desta “alta nota” equivale a simples quatro dólares norte-americanos. Retrato de um país que fechou março com uma inflação de 8.4%, o que faz com que a inflação acumulada do ano chegue a 108.8%, enquanto a taxa de juros está em 97%. Este quadro já fez o presidente Alberto Fernandez desistir de concorrer à reeleição. E como ele está brigado com a vice-presidente Cristina Kirchner, o governo fica sem articulação com vistas a um candidato. Mas, como a eleição presidencial é em outubro, a campanha está nas ruas.

E, apesar de ser uma das principais responsáveis por levar a Argentina a este estado caótico da economia em que o país se encontra, Cristina não desiste.

Ainda nesta quinta-feira, 25 de maio, data nacional, fez um enfático discurso, ressaltando o que ela considera uma grande conquista dos governos kirchenistas. Uma conquista que faz arrepiar qualquer liberal: “Em doze anos duplicamos o Estado”. E fez questão de mostrar com os dedos que o Estado era “chiquitito” e agora está ampliado, como se fosse um grande mérito e não o responsável que foi por afundar as finanças do país. Segundo dados publicados pelo jornal La Nación, quando Néstor Kirchner assumiu, o gasto do Estado em relação ao PIB era de 12,5%. Ou seja, de cada 100 pesos o Estado consumia 12,5 pesos. Quando passou o governo para Cristina já estava em 15% e quando ela concluiu seu mandato este percentual estava em 24%. Hoje já está em 46%. Entre as estatizações a que aludiu com orgulho Cristina, para justificar o crescimento do Estado, estão a YPF, a Petrobrás argentina, as Aerolineas Argentinas e a AFJP, que é o serviço de correios. Na realidade, ela mais do que duplicou o tamanho do Estado. Mas no seu discurso ela foi vivamente aplaudida pelos funcionários dessas estatais. Seus eleitores que costumam se mobilizar fortemente em qualquer eleição.

Diante desse quadro seria de se esperar que a oposição estivesse folgada na parada. Mas tal não acontece porque há uma divisão entre dois fortes candidatos da oposição. Um deles e o que mais vem crescendo é Javier Milei, um liberal de direita. A outra é a ex-ministra da Defesa Patrícia Bullrich.

Segundo o Centro Estratégico Latinoamericano de Geopolítica – Celag, Milei, do movimento Liberdade Avança, aparece com 29,3% das intenções de votos, o bloco governista Frente de Todos – FdT tem 26,1% e a coalizão de oposição Juntos por el Câmbio – JxC, cujos principais candidatos são Patrícia Bullrich e o prefeito de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta, está com 24.6%. Assim, salvo mudanças de rota, o que se apresentava como uma humilhante derrota do governo no primeiro turno eleitoral, já não tem muita consistência. Como não há consistência no fato de Cristina dizer que não irá concorrer.

Afinal, diante da estupidez de boa parte do eleitorado argentino, ela ainda é um nome forte.

Do outro lado do espectro político e econômico, Milei ganha força. Seu programa liberal é arrojado. Dentre suas propostas estão a dolarização da economia argentina, o fechamento do Banco Central e a privatização dos serviços de saúde, educação e previdência do país. A dolarização da economia seria apenas a oficialização daquilo que já vem sendo praticado. Com o diferencial de que os trabalhadores passariam também a ganhar em dólares. Algo que o Equador implantou em 2010 e que vem dando certo. Já as privatizações dos serviços vão de encontro à índole do argentino, acostumado que está a mamar nas tetas do Estado. Longe disto está o setor do agronegócio, que é o carro-chefe da economia do país, mas que vem sendo massacrado ao longo dos anos pelo regime vigente. A taxação, por exemplo, sobre as exportações da carne, fez com que este produto argentino deixasse de ser o número um do mundo em matéria de exportações.

É contra tudo isto que Milei se insurge. Ele representa a revolta dos setores que se opõem ao que acontece e que levou o outrora mais rico país da América Latina a ter 40% de sua população vivendo na miséria. E o faz de maneira virulenta. E algumas vezes até fora de propósito, fazendo com que tenha que se retratar. Como aconteceu quando defendeu a venda de órgãos para transplante. Mas Javier Milei é hoje a voz mais forte da oposição na Argentina. Resta ver se terá o apoio suficiente para desmontar a estrutura Estado-dependente que foi montada no país. Muito embora as evidências, que crescem dia a dia, mostrando que é este sistema que está afundando a Argentina.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895