Berlusconi foi um ator político

Berlusconi foi um ator político

Berlusconi: A trajetória marcante de um ator político controverso.

Jurandir Soares

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A mídia da Europa segue comentando o falecimento de Silvio Berlusconi, aos 86 anos, o que não é sem razão, pois ele foi um dos personagens mais marcantes do continente nos últimos 40 anos. E as definições a respeito da figura de Berlusconi são as mais diversas, porém uma dada pelo jornal espanhol El País parece caracterizar bem a sua figura. O analista Iñigo Domínguez disse o seguinte: “Silvio Berlusconi foi um dos maiores gênios políticos das últimas décadas, se entendermos a política como a arte de fazer o necessário para conseguir o que se quer, a qualquer preço, ou mesmo, sem nenhum escrúpulo”.

Não é sem razão que ele foi por três vezes primeiro-ministro da Itália e presidente do clube de futebol AC Milan, o qual tirou do ostracismo e o projetou como conquistador de título da Itália, da Europa e do mundo. Projetou-se como empresário da construção, mas deu o grande salto ao se tornar proprietário de uma rede de televisão. Foi o empresário que revolucionou a comunicação e a modernizou. Usando-a para o bem ou para o mal, conforme suas necessidades. De tendência política de centro-direita, conseguiu fazer até o seu próprio partido, usando um slogan da torcida italiana: “Forza Itália”.

Conseguiu unir política, esporte e publicidade. Sua fórmula era a imagem do homem rico, cheio de si e capaz de estender o seu êxito particular à administração pública. Não faltaram as ligações com a prostituição, que lhe causaram algumas vultosas indenizações. Inclusive, por envolvimento com menor de idade. E ligações com a máfia. Aliás, a duvidosa origem de sua fortuna passa pelo relacionamento com a Cosa Nostra. Não escapou tampouco de condenação por fraude fiscal, o que marcou o início de sua decadência. Mas, antes disto, seu Forza Italia dinamizou a política italiana e lançou a semente para o que veio na sequência, desde Matteo Renzi até o Movimento 5 Estrelas, passando por Matteo Salvini.

Seu começo foi como cantor em navios de cruzeiro. Simpático, com enorme capacidade de retórica, foi granjeando amizades. Ampliou seus conhecimentos sobre a realidade das famílias italianas vendendo pisos de porta em porta. A partir deste conhecimento e com os relacionamentos nada republicanos estabeleceu sua carreira de empresário da área da construção, fazendo grandes complexos urbanísticos nos arredores de Milão. Em 1978, fundou a Fininvest para sustentar o financiamento de seus projetos. Foi aí que passou à aventura midiática com a compra do Il Giornale, um diário que se encontrava em apuros. Logo foi a vez da Telemilano, uma cadeia local que resultaria num enorme pool cuja emissora principal era o Canal 5. Este meio serviu para sua conquista do poder, onde foi hegemônico ao longo de 25 anos. E ajudou a pavimentar o caminho da atual primeira-ministra, Georgia Meloni, cujo marido trabalhava para ele em um de seus canais.

O fato é que aquele político de sapatos lustrosos, terno de grife e ares de galã antigo caiu nas graças dos italianos. O escritor Andrea Camilleri define: “Os italianos se reconhecem nele. Veem ali um tipo que é denunciado múltiplas vezes, mas nunca é condenado, porque o delito prescreve ou porque muda a lei, sempre a seu favor, evidentemente. O italiano em geral gostaria de ser como ele”. Já o jornalista Pablo Ordaz é mais contundente. Diz que ele deixou “uma fatura tal que gerações inteiras de italianos e também de europeus terão que saldar. Foi o populismo que semeou na política, o vulgar, o grosseiro, a desfaçatez a céu aberto, a mentira sem complexos, que se converteram em uma praga para a qual, no momento, não há remédio”. Enfim, odiado por uns, mas adorado pela maioria, Berlusconi se tornou uma figura marcante da Itália e da Europa nas últimas quatro décadas. Um verdadeiro ator político, com as implicações que são destacas por Domínguez.


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