Em Cuba, para quê?

Em Cuba, para quê?

Na realidade, os motivos para Lula ir a Cuba são muitos.

Jurandir Soares

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Não é para receber os cerca de 600 milhões de dólares que Cuba deve ao Brasil, pelo porto de Mariel, que o presidente Lula está em visita à ilha. Antes de sua viagem o governo de Miguel Díaz-Canel já havia manifestado a sua falta de condições para cumprir a obrigação e acenou com um pedido de desconto da dívida. Nem mesmo charutos ou rum puderam ser oferecidos como forma de pagamento. 

Na realidade, os motivos para Lula ir a Cuba são muitos. Em primeiro lugar, encontrar-se com um governante com o qual se identifica, muito embora Lula tenha sido eleito democraticamente pelo voto popular e Díaz-Canel tenha ascendido ao poder pelas manobras de um partido que é o único na ilha, desde que o comunismo ali se implantou em 1959. Mas há pela esquerda brasileira uma idolatria por Cuba. Outro motivo para a ida é a paixão que Lula vem demonstrando pelas viagens internacionais. Afinal, são 20 visitas a 19 países diferentes – foram duas visitas à Argentina - entre janeiro e agosto de 2023. Tudo isso, sem contabilizar as idas a Portugal e Egito que ocorreram depois das eleições, mas antes de ele tomar posse como presidente. E sempre hospedando-se muito bem, como ocorreu na recente viagem à Índia, onde ele e a primeira-dama, Janja, ficaram no luxuoso hotel Taj Palace, em Nova Délhi, que custou quase R$ 2 milhões aos pagadores de impostos, de acordo com dados do Portal da Transparência.

Mais um motivo para a viagem é que Lula quer ser um importante ator na política internacional. Busca se alçar, inclusive, como um proponente de plano de paz para a guerra na Ucrânia. Para isto, no entanto, não pode falar de improviso. Sempre que o fez só deu fora, como quando falou a respeito daquele conflito. O seu mais recente absurdo é querer tirar o Brasil do Tribunal Penal Internacional para que o presidente russo, Vladimir Putin, venha ao país sem que tenha que ser preso. A adesão do Brasil à Corte se deu por força de lei aprovada pelo Parlamento. Com o que, não será por uma decisão da nossa diplomacia, como disse o ministro Flávio Dino, que o Brasil vai sair. E para finalizar os motivos da viagem, está o fato de que Lula estará numa reunião com dirigentes de países emergentes mais a China. Com os quais, de modo geral, tem bom trânsito.

Agora, toda a badalação de uma viagem a Cuba não se justifica. Volto ao fato de que a esquerda brasileira tem uma atração magnética pelo regime cubano. Certamente, por ser de um só partido e não ter contestadores. E por toda a economia estar na mão do Estado. Pois é preciso ressaltar dados da ONU para mostrar que 72% dos cubanos vivem abaixo da linha de pobreza. O estado supridor não consegue fornecer a cesta básica para a maior parte da população. Desde que perdeu o protetorado da ex-União Soviética, o país só afundou. Deu uma respirada quando a Venezuela de Hugo Chávez ainda gozava das benesses do petróleo, mas, com o caos estabelecido naquele país, isto também acabou. A salvação foi render-se ao capitalismo. Abrir a ilha ao turismo em parceria com as grandes redes hoteleiras internacionais. Isto deu emprego, mas não deixou de haver a exploração do trabalhador pelo Estado. Os funcionários cubanos que trabalham nos hotéis são pagos pelo governo, com salário em torno de 30 dólares. O governo recebe da rede hoteleira 600 dólares por cada funcionário. O salário de um engenheiro, um advogado ou outro profissional graduado na ilha vai de 30 a 40 dólares. Isto faz com que o sonho de qualquer um deles seja trabalhar de garçom em Varadero, como me contou numa ocasião um engenheiro. Isto porque, ganhando de gorjeta um dólar por dia, eles já fazem outro salário. Só que a gorjeta é muito maior que isto, fazendo com que esses tenham melhores condições de vida. Outra concessão que o regime teve que fazer ao capitalismo para dar melhores condições de vida à população foi a abertura de pequenos negócios. Desde uma carrocinha de cachorro-quente até um minimercado, passando por pequenas lojas. E também passou a valer a compra e venda de imóvel.

O que não muda na ilha é o controle estatal sobre os meios de comunicação. Rádio, jornal e televisão, tudo sob controle. O Granma ainda é o único jornal a circular. Nem no aeroporto encontrei outro jornal, mesmo que fosse de outro país. Em suma, a realidade do país pode ser resumida em dados citados em matéria da BBC.com: “Os salários são insuficientes, produtos necessários para a vida cotidiana são controlados, a maioria das instituições é comandada pelo governo e a corrupção continua sendo varrida para debaixo do tapete”. Ou seja, vamos parar com essa ilusão cubana. 


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