Escalada ameaçadora

Escalada ameaçadora

Rússia quer uma mudança profunda na Ucrânia

Jurandir Soares

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A justificativa usada pelo presidente russo, Vladimir Putin, para invadir a Ucrânia é algo que beira o ridículo. Ele citou artigo da carta da ONU, o qual permite que um país-membro da organização que se sinta ameaçado por outro pode pedir ajuda a uma terceira nação. Disse que com base neste dispositivo atendeu os apelos da República Popular de Donetsk e da República Popular de Luhansk. Ora, essas repúblicas só existem na cabeça de Putin. Não tem um país no mundo que as reconheça e muito menos a ONU.

Nesta sexta-feira, em meio ao intenso bombardeio da capital ucraniana, Kiev, veio a informação de que poderia haver a convocação de uma reunião em Minsk, em Belarus, para discutir a neutralidade da Ucrânia. Para que o país assuma uma posição semelhante às da Finlândia e da Suíça. Mas aí é de perguntar: por que isto não foi discutido durante todas as negociações que foram levadas a cabo antes da invasão? Ainda no domingo o presidente francês, Emmanuel Macron, fez múltiplas ligações para Putin e acertou inclusive um novo encontro do russo com o norte-americano Joe Biden. E o que se viu? No dia imediato Putin declarou a independência das províncias rebeldes da Ucrânia, como se ele tivesse poder para decretar a fragmentação de um Estado soberano.

Enquanto escrevo não se tem uma definição do conflito, mas fica claro que a Rússia quer uma mudança profunda na Ucrânia. O chanceler russo, Serguei Lavrov, falou em “libertar a Ucrânia” e recuperar no país a língua e a cultura russa. Deixou implícita a intenção de mudança radical de governo em Kiev, com a correspondente colocação no poder de um títere de Moscou. Na medida em que vai se concretizando esta tomada da Ucrânia pela Rússia, fica a indagação se essa ação vai parar por aí ou vai seguir adiante. O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse que a Rússia é uma ameaça para toda a Europa e, em função disto, determinou reforço no armamento da organização nos países-membros. Fato que torna mais temeroso o futuro. Há um temor muito grande por parte dos países bálticos, Letônia, Estônia e Lituânia, de uma invasão russa. E foi justamente por isto que, quando eles se libertaram do jugo da União Soviética, trataram de se filiar à Otan.

Cabe ainda uma palavra a respeito da China. O governo de Pequim rejeitou chamar o ataque à Ucrânia de invasão. E isto se dá por um fato muito claro, que é o que envolve Taiwan. O governo chinês considera a ilha uma província rebelde e tem demonstrado sua determinação de retomar o controle sobre a mesma. Não foi sem razão que caças chineses fizeram voos ameaçadores sobre Taiwan nesta quinta-feira. Assim, Pequim e Moscou vão dando a mesma característica às suas ações com vistas a seus respectivos interesses. Dentro deste contexto, é possível que a China alivie as sanções que estão sendo impostas à Rússia, comprando inclusive o petróleo e o gás que a Rússia deixará de vender para a Europa. Não é sem razão também que já está em construção um gasoduto ligando Rússia e China. Enfim, cenário nebuloso pela frente. 


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