Europa não quer acordo

Europa não quer acordo

Então, resumindo, não há perspectiva desse acordo avançar.

Jurandir Soares

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Ao partir para Bruxelas, a fim de participar da reunião da União Europeia com a Celac, a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos, o presidente Lula disse que objetivava fechar um acordo entre o Mercosul e a UE ainda neste ano. O encontro seria a oportunidade de implementar essas tratativas. Ao longo de dois dias discutiu-se muito, houve a promessa europeia de mobilizar 100 milhões de dólares ao ano destinado ao financiamento climático, para apoiar os países em desenvolvimento, e ficou a vã promessa de se seguir buscando finalizar o acordo UE-Mercosul. Digo vã promessa porque se torna cada vez mais claro que a Europa não quer este acordo. E não o quer simplesmente porque o seu setor do agronegócio não tem condições de competir com o latino-americano, especialmente o brasileiro. A agricultura na Europa já é toda subsidiada e, quando o governo francês, por exemplo, resolve falar em redução dos subsídios, os produtores cercam a torre Eiffel com suas vacas e seus tratores. Porém, mesmo com subsídio não há condições de competir com a latina. Em função disto, começam a colocar como contrapartida exigências na área ambiental que, se não cumpridas, seriam passíveis de sanções ao país, no caso o Brasil. Isto tudo de acordo com avaliações a serem feitas pelos próprios europeus. Também fizeram exigências no que toca a compras dos governos latinos, o que foi considerado prejudicial aos nossos interesses. Então, resumindo, não há perspectiva desse acordo avançar. A não ser que ocorram mudanças muito significativas.

Considerando-se o que ocorre hoje em função da guerra na Ucrânia, com o bloqueio da saída de cereais, cada vez se consagra mais o papel do Brasil como um dos grandes provedores de alimentos para o mundo. Mas podemos ser também grandes provedores de energia limpa. A Europa levou um tombo com sua dependência do gás russo e agora busca alternativas. Está procurando desenvolver suas próprias plantas de energia eólica e solar, porém as condições climáticas estão muito distantes das que são oferecidas por aqui. Nós avançamos cada vez mais na produção dessas duas energias, assim como do hidrogênio verde, tanto para uso interno como global. O Chile também está apostando pesado no hidrogênio verde, pretendendo ter até 2030 o mais econômico do mundo, para se tornar um dos principais exportadores em 2040. Aliás, de olho nessa fonte, a Europa já aportou 200 milhões de dólares no Chile. As projeções no Brasil para se tornar exportador apontam para mais longe, 2050. Mas, inquestionavelmente, somando todas as fontes, estamos nos tornando um líder mundial em energia limpa. Com 3% da população global, produzidos 7% da energia limpa que é gerada no mundo.

Voltando à reunião de Bruxelas, dois países estiveram em destaque nos debates: Rússia e Venezuela. A questão referente à guerra na Ucrânia chegou a gerar um atrito entre o presidente Lula e o seu colega chileno Gabriel Boric, o qual cobrou uma posição mais firme do grupo no que toca à condenação da Rússia. Lula, que só deu fora nas ocasiões em que falou sobre o conflito, comprou outra briga desnecessária ao menosprezar as colocações de Boric. Procurou dar um troco às críticas que o presidente do Chile fez quando Lula tentou empurrar goela abaixo dos presidentes sul-americanos que a Venezuela era vítima de “uma narrativa”. E justo a propósito de Venezuela houve a manifestação dos participantes do evento no sentido de cobrar a realização de eleições livres, como forma de serem suspensas as sanções que pesam sobre o país. Cumpre destacar que, ao participar desse posicionamento, Lula está admitindo que as eleições na Venezuela não são livres. O que, aliás, todo o mundo sabe. Só ele que tem procurado dourar a pílula. Vale ressaltar que a constatação de eleições livres precisa ser feita por organismos internacionais responsáveis. Há poucos dias, um alto represente do governo venezuelano disse que não queriam a presença da União Europeia como observadora do pleito. Se isto não for possível, é de se questionar quão livres serão essas eleições.


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