Mercosul e a democracia

Mercosul e a democracia

Neste encontro de Puerto Iguaçú, cobrou uma posição clara do Mercosul com relação à Venezuela.

Jurandir Soares

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O presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, mais uma vez assumiu uma posição firme em defesa da democracia na América do Sul. Já havia feito isto, no final de maio, em Brasília, quando o presidente Lula convocou uma reunião de presidentes sul-americanos, para dizer que a Venezuela era vítima de uma narrativa. Lacalle Pou, secundado pelo chileno Gabriel Boric, desmontou a narrativa de Lula, assegurando que a Venezuela é uma ditadura. Mesma postura o uruguaio voltou a ter nesta semana, por ocasião da reunião do Mercosul, em Puerto Iguazú, na Argentina. A rigor o encontro objetivava tratar dos assuntos comerciais do Mercosul. Mas, Lacalle Pou enfatizou que o Mercosul não é só isto. É também democracia. Aliás, fator que determinou o afastamento da Venezuela do grupo, que integra na condição de observador. Até hoje a Venezuela está pendurada, mas, poucos fazem alguma coisa no sentido de pressionar o governo Maduro no sentido de mudar. E, destes poucos, a voz mais forte tem sido a de Lacalle Pou.

Neste encontro de Puerto Iguaçú, cobrou uma posição clara do Mercosul com relação à Venezuela. Disse ele: “Todos sabemos o que pensamos sobre o regime venezuelano, todos temos opinião clara. É preciso que sejamos objetivos. Está claro que a Venezuela não vai virar uma democracia saudável e quando há um indício de possibilidade de uma eleição, uma candidata como María Corina Machado, que tem um enorme potencial, é desqualificada por motivos políticos, não jurídicos.” Ele seguiu: “Alguém pode dizer: o que isso tem a ver com o Mercosul? Tem a ver porque os distintos blocos e associações do mundo alçaram sua voz a favor da democracia. Tem que haver um sinal claro para que o povo venezuelano possa se encaminhar para uma democracia plena, o que hoje claramente não tem.” O que tem na Venezuela hoje são eleições de cartas marcadas. Aliás, Lula, nos seus ridículos manifestos em defesa de Maduro, disse que a Venezuela tem mais eleições do que o Brasil. Até pode ter, mas, eleições desse tipo, em que os principais opositores são afastados do caminho. Como o que acontece hoje, não só com María Corina, mas também com Henrique Capriles, Leopoldo Lopez e Juan Guaidó, entre outros.

E quando escapa ao controle do sistema e a oposição consegue eleger uma maioria na Assembleia Nacional, como aconteceu em 2017, a caneta do sistema entra em ação.

Naquela ocasião, a oposição alcançou a maioria de dois terços na Assembleia, e o que fez o sistema? Primeiro, caçou cinco deputados para impedir a maioria absoluta. Porém, logo depois destituiu a própria Assembleia e convocou uma Assembleia constituinte, que foi eleita, logicamente, com a quase totalidade de integrantes do sistema. Antes da fala de Lacalle Pou no Mercosul, o paraguaio Abdo Benítez, que está de saída da Presidência e colocou seu sucessor Santiago Peña ao seu lado na reunião, discursou na mesma linha. “O único limite razoável \[para a integração dos países] deve ser o respeito à democracia e aos direitos humanos”, declarou.

Já a propósito do Mercosul como organismo de integração regional tem sido um fracasso. As negociações entre os países membros que há 20 anos superavam os 18%, hoje não passam de 11%. E, com o sem Mercosul, o que está sendo negociado seria feito da mesma maneira. Os maiores exemplos de incompetência do Mercosul estão em dois fatos. Um, o de um cidadão, quando quer passar de um país membro para outro, ter que preencher um boletim de imigração na fronteira. E ter que devolver na saída, senão será visto como clandestino. Outro, o número de dias que um caminhão carregado de produtos espera na fronteira para a fiscalização. Não há sequer uma norma de trânsito unificada, mas há uma placa do Mercosul para os automóveis, que só veio piorar a identificação dos veículos.

Há que considerar ainda que os membros do Mercosul só podem fazer um acordo comercial com outro país se envolver todos os membros do bloco. E este é outro fator que o presidente do Uruguai está contestando, pois está vendo a possibilidade de fazer um acordo de seu país com a China, mas, as normas o impedem. Lacalle Pou considera que a China é hoje um dos principais atores do comércio internacional, que não pode ser desprezado. E ameaçou sair do bloco, o que levou os outros parceiros a considerar a possibilidade de um acordo do bloco com a China. Em suma, o uruguaio Lacalle Pou é atualmente a voz que chama os dirigentes sul-americanos à realidade. Especialmente, no que toca à democracia.


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