Morte cruzada no Equador

Morte cruzada no Equador

O que pesa contra Lasso é acusação de malversação de verbas públicas.

Jurandir Soares

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Acossado pela possibilidade de votação de um pedido de impeachment, o presidente direitista do Equador Guillermo Lasso cometeu uma espécie de autofagia ou morte cruzada: destituiu o Congresso, o que significa que ele também terá que deixar seu mandato e submeter-se a novas eleições. Só que ele terá ainda um período de fôlego e de poder. A lei estabelece que fique no cargo por um período de seis meses, governando por decreto. Ou seja, poder absoluto nesse período que, segundo analistas, pode se estender a oito meses devido aos procedimentos legais. A decisão foi tomada com base no artigo 158 da Constituição. As opções de Lasso, além dessa que tomou, eram enfrentar o processo de impeachment e ser destituído, tendo em vista que a esquerda tem maioria no Parlamento, ou ficar no cargo e tentar governar com o Legislativo dominado pela esquerda. Uma esquerda que é controlada à distância pelo ex-presidente, e ainda muito poderoso, Rafael Correa, que em fevereiro de 2018 viu ser derrubado num referendo popular o sistema de reeleição sem limite. Pelo qual pretendia perpetuar-se no poder. Mas, como todo líder esquerdista, Correa gosta das benesses do capitalismo, pois vive na Bélgica.

O que pesa contra Lasso é acusação de malversação de verbas públicas. Ele não teria encerrado um convênio com uma frota petroleira, apesar de estar dando um prejuízo 6 milhões de dólares ao país. Abro um parêntese para dizer que é um país onde o dólar americano é a moeda corrente desde o ano 2000, o que lhe valeu uma estabilidade monetária. Fechado o parêntese, vou ao otimismo de Lasso com a sua decisão. Disse que ela “é democrática, não só porque é Constitucional, senão porque devolve ao povo equatoriano o poder de decidir o seu futuro nas próximas eleições”. E mais: “que abre o caminho para recuperar a esperança e tranquilidade”. Tranquilidade não é algo que os equatorianos tenham vivenciado nos últimos anos. Isto porque o país, que era um produtor de droga, passou a ser também um consumidor, o que demanda não só ações repressivas pela Polícia, como também as disputas de gangues pelo controle e toda a violência decorrente disso, conforme bem conhecemos aqui no Brasil.

Só para se ter uma ideia do que acontece, em outubro de 2021, Lasso teve que decretar Estado de Emergência no país e colocar as Forças Armadas na rua. Em meio às disputas pelo controle do tráfico também passaram a acontecer motins em prisões. Só em um desses episódios, em Guayaquil, morreram 181 prisioneiros. E vejam que o movimento se internacionalizou, pois, segundo o Ministério Público, os confrontos pelo controle local opuseram presos ligados à quadrilha dos Choneros, apoiada pelo cartel mexicano Sinaloa, a grupos de outras gangues, como Tiguerones, Lobos e Lagartos, apoiados pelo CJNG, Cartel de Jalisco Nueva Generatión, também do México.

Lasso, que está no poder desde maio de 2021, tem apenas 25 deputados de um total de 127 na Assembleia, que é dominada pela coalizão entre Partido União pela Esperança, do ex-presidente Rafael Correa, Partido Social Cristão e o representante do grupo indígena Pachakutik. Como um ex-banqueiro e dono de 14 empresas offshore, Lasso sempre foi visto com desconfiança pela esquerda. Para concorrer à presidência ele teve que se desfazer dessas empresas, pois o então presidente Rafael Correa impôs um decreto, em 2017, proibindo de concorrer quem tivesse capital em paraísos fiscais. Na ocasião, ele disse que anos atrás manteve “investimentos legítimos em outros países” e que se desfez dos recursos para concorrer às eleições presidenciais. Ele sustentou ainda que seu dinheiro provém do Banco Guayaquil, um dos mais importantes do país. Durante seu governo, segundo o instituto Cedatos, Lasso chegou a alcançar 73% de aprovação, graças, em boa parte, à eficiente campanha de vacinação contra a Covid-19. Agora poderá governar por decretos, porém o novo Legislativo terá poder de derrubá-los. Os novos eleitos para Assembleia e Governo – Lasso poderá candidatar-se – deverão completar o atual mandato até maio de 2025.


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