Otan não quer fim da guerra

Otan não quer fim da guerra

Organização quer ampliar as sanções a Rússia e ver o país ir se enfraquecendo até ser derrotado

Jurandir Soares

publicidade

Quando a guerra na Ucrânia estava prestes a completar um ano, esperava-se que a data servisse para impulsionar algum acordo que resultasse, pelo menos, num cessar-fogo. A China inclusive apresentou um plano para tal, mas que foi saudado por uns e rejeitado por outros. Observando-se os últimos fatos, vai-se chegando a uma conclusão. A Otan, ou seja, EUA e Europa, não quer um acordo. Quer continuar a guerra, ampliar as sanções, ver a Rússia ir se enfraquecendo até ser derrotada e, depois, trazer a Ucrânia para a Aliança Atlântica, concretizando aquilo que a Rússia não queria e que foi o motivo da guerra: o estabelecimento das forças da Otan junto à fronteira russa.

Já há algum tempo o presidente Volodymyr Zelensky vem pedindo ao Ocidente o reforço em armamentos, especialmente o envio de tanques. Inicialmente, a Alemanha ficou reticente quanto ao envio dos seus Leopard 2, mas acabou concordando. Os integrantes da Aliança Atlântica se mobilizam de outra forma. Um grupo de nove países membros – Estônia, Reino Unido, Polônia, Letônia, Lituânia, Dinamarca, República Checa, Holanda e Eslováquia – se comprometeu a um envio “sem precedentes” de armas. O pacote envolve carros de combate, artilharia pesada, defesa aérea, veículos de infantaria e munições. O Reino Unido se comprometeu a enviar 12 tanques Challenger, que são equivalentes ao alemão Leopard 2. Os Estados Unidos também anunciaram uma ajuda correspondente a 2,5 bilhões de dólares, que inclui 90 veículos blindados de infantaria Stryker, além de novas unidades de blindados Bradley. Não cogitavam na ocasião o envio de Abrams, seu mais avançado carro de combate. Porém, depois do anúncio da Alemanha, resolveram também enviar 11 Abrams, que é outro equivalente do Leopard 2. A Suécia mandará blindados de infantaria e obuses Archer. A Polônia estava impedida de enviar os Leopard 2 que comprara da Alemanha, mas acabou sendo liberada para tal. A Espanha, por sua vez, também se mostrou disposta a enviar até 40 tanques Leopard A4, modelo mais antigo, que comprou de segunda mão da Alemanha. Porém, como esta compra se deu em 1995, existem muitas dúvidas quanto ao estado de conservação desses tanques. Então, o reforço em armamentos logo estará chegando para a Ucrânia fazer frente à Rússia.

A peça seguinte foi movimentada pelo secretário geral da Otan, Jens Stoltenberg, para quem a proposta chinesa não tem muita credibilidade porque a China não condenou a invasão russa. E pela presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, para quem a proposta chinesa não é um plano de paz e sim alguns princípios. Sempre lembrando que a proposta chinesa fala em respeito à integridade territorial, o que pressupõe a saída da Rússia das áreas que ocupa na Ucrânia. Mas a proposta também prevê a segurança da Rússia, estando implícita a não entrada da Ucrânia na Otan. E é aí que se dá a rejeição do Ocidente, que está apostando na continuação da guerra para consolidar a derrota da Rússia e a expansão da Otan. Esta aposta ficou muito clara nesta quarta-feira, na Finlândia, quando, ao encontrar-se com a primeira ministra Sanna Marin, Stoltenberg foi taxativo ao dizer que “a Ucrânia irá fazer parte da Otan”, mas a preocupação agora é com a garantia da independência e soberania do país.

Tudo isto partindo do princípio de que, ao receber os armamentos, a Ucrânia terá condições de derrotar a Rússia. Diante disto, volto a lembrar outro desvio de curso que o conflito pode ter e que é representado pelo papel da China, que até aqui está se apresentando como mediadora, mas que, de repente, pode se tornar aliada da Rússia, da qual se tornou o maior parceiro comercial. O gás e o petróleo que a Rússia deixou de vender para a Europa está vendendo para a China. E Pequim, na sua proposta de paz, já deixou claro que quer deter o expansionismo da Otan. Então, um desvio de rota no conflito pode levar a uma perigosa aliança entre dois regimes autoritários, Rússia e China, tendo ainda como pano de fundo outra questão que pode arrastar todos para uma guerra muito maior: Taiwan. Mas a aposta que a Otan está fazendo parece desconsiderar esta possibilidade.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895