Prevendo Trump, Europa se reforça

Prevendo Trump, Europa se reforça

Donald Trump praticamente sedimentou sua candidatura no Partido Republicano às eleições presidenciais de 5 de novembro nos Estados Unidos, ao vencer neste final de semana as primárias da Carolina do Sul.

Jurandir Soares

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Afinal, sua adversária era Nikki Haley que por duas vezes foi governadora daquele estado. Assim, está praticamente certo que Trump irá concorrer com o atual presidente, Joe Biden. E o cenário do país está indicando que Trump muito possivelmente será o vencedor. As pesquisas o dão com pequena margem à frente de Biden. No entanto, todos conhecem a impetuosidade do ex-presidente, que irá enfrentar um presidente com o desgaste natural do cargo que ocupa e com condições físicas que não inspiram confiança. Nem tanto por sua idade avançada, 81 anos, mas pela debilidade que demonstra ao caminhar ou ao movimentar-se de um modo geral. Se vencer, ao assumir estará com 82 anos e ao término do governo com 86.

Assim, diante deste quadro cresce a perspectiva de retorno de Donald Trump à Casa Branca. E, por extensão, crescem as preocupações dos europeus com relação ao seu maior aliado. Afinal, quando era presidente Trump já demonstrava desprezo pela OTAN, a aliança militar do Ocidente, que tem como principal expoente justo os Estados Unidos. Sob Biden, EUA e União Europeia estão desenvolvendo todos os esforços no sentido de ajudar a Ucrânia a derrotar a Rússia. Trump já disse que se assumir vai cortar essa ajuda, o que significa entregar a vitória de bandeja para a Rússia. Deixando caminho aberto para o presidente Vladimir Putin não só tomar parte do território ucraniano, com sentir-se à vontade para investir contra países vizinhos como Moldávia, Georgia e, quem sabe, até as repúblicas do Báltico. Neste último caso, um fato que obrigaria a OTAN a entrar em ação. No recente episódio que envolveu a morte do ativista político Alexey Navalni, Trump levou vários dias para se manifestar e, mesmo assim, não mencionou a Rússia nem criticou o presidente Putin. E no Congresso norte-americano continuou instruindo os republicanos a não aprovarem ajuda para a Ucrânia.

Diante deste quadro, a Europa está tratando de ser menos dependente dos EUA. E para isto precisa se armar e aprimorar seus serviços de inteligência. Não é sem razão que a presidente do Banco Europeu de Investimentos (BEI), a espanhola Nadia Calviño, que está há apenas dois meses no cargo, disse ao jornal El País estar convencida de que a Europa deve “reforçar sua indústria de segurança e defesa, assim como sua capacidade dissuasória. E nesse sentido ela já criou um aporte de 8 bilhões de euros para ajudar a impulsionar o setor. Na quinta-feira (22) encerrou-se a Conferência Anual de Segurança da Europa e a maioria dos líderes europeus voltou de Munique mais convencida do que nunca de que os Estados Unidos estão prestes a abandoná-los. Antes de partir, a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, chegou a anunciar que a Dinamarca entregaria toda a artilharia do seu país à Ucrânia, bem como os caças F-16. “Temos que fazer mais”, disse Frederiksen, na reunião realizada dois dias antes do aniversário de dois anos da invasão da Ucrânia pela Rússia. Uma prova de quão longe a Europa está se afastando da América e em direção à autossuficiência foi uma coluna de opinião do presidente da Estônia, Alar Karis, publicada no dia 19, em seu blog, em que discutiu a defesa da região sem uma única referência aos Estados Unidos ou a Donald Trump. Disse ele: “Qualquer país europeu teria dificuldade em enfrentar a Rússia sozinho, mas quando estamos unidos, somos invencíveis.”

O ex-embaixador dos EUA na OTAN, Ivo Daalder, escreveu um artigo para o site político UE no qual comenta a tomada de consciência dos europeus de que “a era de presidentes transatlânticos fortes pode estar chegando ao fim.” Ele narra uma sensação predominante de “uma Europa confrontando os seus maiores medos”, que a Rússia vença a Ucrânia e se volte para o resto da Europa e que os EUA elejam um líder que não acredita na OTAN e que trata os aliados mais como inimigos. O artigo destaca que os aliados da OTAN estão cada vez mais preocupados com a possibilidade de Putin desafiar diretamente a organização. Embora não seja uma ameaça imediata, seria algo possível nos próximos seis anos. Ou seja, conforme ressalta a revista Crusoé, a Europa encontra-se entre Putin e Trump e o continente precisa agora descobrir uma forma de cuidar de si próprio. Ironicamente, algo que Trump muito cobrava era o fato de que nem todos os países membros da OTAN destinavam 2% de seu PIB para a organização, conforme reza no estatuto. Pois, na reunião de Munique ficou acordado que todos irão destinar o tal percentual.


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