Putin, o inconfiável

Putin, o inconfiável

Está repercutindo pelo mundo a entrevista com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, feita pelo jornalista Tucker Carlson, ex-âncora da Fox News americana, para a sua rede privada de mídia.

Jurandir Soares

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"Os dominados querem se afastar de Putin e este segue tentando mantê-los sob seu domínio, fomentando os movimentos separatistas para depois intervir."

Putin mais uma vez justificou a invasão da Ucrânia pelo fato de a OTAN estar se aproximando de sua fronteira, buscando incluir aquele país e mais a Geórgia. Ao mesmo tempo, Putin tentou explicar que russos e ucranianos são um só povo. E, por fim, assegurou que a Rússia não iria invadir mais nenhum país.

Pois bem, começo pela afirmação de que não irá invadir mais nenhum país. Dá para acreditar? No início de 2022, quando ele mobilizou 100 mil soldados para junto da fronteira com a Ucrânia, afirmou que não iria invadir o país. Dizia que se tratava apenas de manobras militares. Chegou o dia 24 de fevereiro e o que era temor, e denunciado como certo pelo serviço de Inteligência dos EUA, se tornou realidade. Até hoje suas tropas estão em território ucraniano e não se vê a possibilidade de retirada sem que isto resulte na tomada de áreas do Leste ucraniano. Mas ele continuou chamando esta operação não de invasão, mas de “Operação Militar Especial”.

Quanto à igualdade entre russos e ucranianos também não existe. Existem semelhanças. E existe uma população de origem russa nessas áreas que ele quer tomar da Ucrânia. Tanto que o povo ucraniano já se manifestou através de consulta popular que quer a sua integração com a Europa, passando a fazer parte da União Europeia e da OTAN. Este mesmo sentimento é expresso pelas populações da Geórgia e da Moldávia, países que, como a Ucrânia, sentiram nos últimos tempos seus territórios serem invadidos pelos tanques russos. Foram confrontos tão violentos como o da Ucrânia, embora não tenham tido a mesma repercussão no Ocidente, porque foram breves. Durante o verão de 2008, o Exército russo interveio depois de as forças georgianas terem iniciado uma operação militar na Ossétia do Sul, um território separatista. Em apenas cinco dias, as forças de Moscou derrotaram o Exército georgiano e ameaçaram tomar a capital, Tbilisi. As potências ocidentais denunciam o que a Geórgia classifica como “ocupação” russa da Ossétia do Sul e da Abkházia, duas províncias que correspondem a 20% de seu território. Com a Moldávia aconteceu o mesmo com relação também a uma província separatista, a Transnístria. Assim é que a Rússia tem incentivado os movimentos separatistas nos países vizinhos para buscar desestabilizá-los. Porém, quanto mais Moscou age neste sentido, mais cresce a revolta nesses países contra a Rússia e mais aumenta o desejo de ligar-se ao Ocidente.

Curioso que na mesma semana em que Putin concedeu a entrevista a Carlson, ele decretou a busca e detenção da primeira-ministra da Estônia, Kaja Kalas, acusando-a de insultar a história russa. Na coluna da última terça-feira (13) falei a respeito das três repúblicas do Báltico, Estônia, Letônia e Lituânia, que estiveram por 74 anos sob o jugo de Moscou, mas que, tão pronto ruiu a União Soviética, trataram de passar para o âmbito do Ocidente, se tornando membros da OTAN para terem proteção contra a Rússia. Pois agora veio essa agressão não só contra a primeira-ministra da Estônia, mas também a uma série de ministros, políticos e dirigentes dos três países bálticos e mais um ministro da Polônia. O “crime” que cometeram foi descartar monumentos que haviam sido construídos ao tempo da União Soviética. Ou seja, ao tempo em que viveram sob o jugo comunista de Moscou. E é justamente isto que estão procurando esquecer.

Putin alegou na entrevista a Carlson que sua luta é por desnazificar a Ucrânia, alegando que a nazificação do país é que levou a estabelecer diferença entre ucranianos e russos.

Na realidade o que estabeleceu a diferença foi o comunismo. Os ucranianos sentiram na pele o que é a jubjugação ao comunismo, assim como aconteceu com poloneses, húngaros, búlgaros, romenos etc. Todos trataram de fazer como os países bálticos, tão pronto ruiu a União Soviética trataram de se associar à União Europeia ou a OTAN, assim como adotar o euro como moeda. Os ucranianos tentaram fazer o mesmo e foram sufocados pelos tanques russos. Na Belarus também surgiu fortemente um movimento pró-Ocidente, mas este foi sufocado pelo ditador Alexander Shevchenko, aliado de Moscou. Enfim, os dominados querem se afastar das garras de Putin e este segue tentando mantê-los sob seu domínio, fomentando os movimentos separatistas para depois intervir. Mas, descaradamente, na sua entrevista a Carlson diz que não irá atacar nenhum país mais.


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