Putin saiu chamuscado

Putin saiu chamuscado

Grupo mercenário ameaça atacar Moscou em revolta contra Putin na guerra da Ucrânia

Jurandir Soares

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O presidente Vladimir Putin sofreu um impensável ataque contra as tropas russas por parte dos mercenários do grupo Wagner, que, ousadamente, ameaçaram atacar Moscou.

Isto que até aqui o grupo mercenário liderado por Yevgueni Prigozhin vinha sendo aquele que estava obtendo os melhores resultados para a Rússia na guerra que é travada na Ucrânia. Porém, vinha ao mesmo tempo se queixando do tratamento que recebia, tanto por parte do ministro da Defesa, Serguei Shoigu, como por parte do comandante das Forças Armadas, general Valeri Gerassimov. Sua queixa ia desde o descaso no fornecimento de equipamentos militares, passava pela tática de guerra que estava sendo empregada e ia até a denúncia de os integrantes do grupo terem sido atacados pelos próprios soldados russos.

Em se tratando da Rússia todas as informações são controladas, porém, pelo que se ficou sabendo e se viu pelas imagens, as forças russas tiveram que mobilizar grandes contingentes de homens e tanques pelas ruas de Moscou, onde, inclusive, foi decretado feriado nesta segunda-feira. A ação do Wagner só parou após uma negociação mediada pelo ditador da Belarus, Aleksandr Lukashenko. E aí vem um fato muito importante no atual contexto em que Putin manda prender quem simplesmente diz que a Rússia está em guerra na Ucrânia. Para ele trata-se de uma operação militar especial. E quem tem se oposto a seu governo enfrenta a condenação por parte dos tribunais, como está acontecendo com Alexei Navalni, que já foi envenenado, condenado e que está respondendo a outra acusação, cuja pena chega a 30 anos de prisão. E outro opositor, o jornalista Vladimir Kara-Murza, ganhador do Prêmio Vaclav Ravel de Direitos Humanos, foi condenado a 25 anos de prisão por criticar Putin. Pois com Prigozhin, que desafiou Putin e marchou contra Moscou, não acontecerá nada. Foi anistiado. Putin nunca foi tão indulgente.

Ou seja, o todo poderoso Putin acusou o golpe. Deixou transparecer que a Rússia está dividida. E isto, evidentemente, deverá influir no campo de batalha. A começar pelo fato de que Moscou perde a atuação do grupo Wagner, que, como disse, é aquele que tem obtido os melhores resultados para a Rússia na guerra com a Ucrânia. Há quem diga que, para tentar compensar, a Rússia virá com tudo agora para cima da Ucrânia. Não se pode esquecer que em fevereiro de 2022 os tanques russos entraram acintosamente na Ucrânia e se dirigiram para Kiev, para tomar a capital e tirar do poder Volodimir Zelensky, para colocar um títere em seu lugar. Passado esse período, Zelensky segue firme no poder, contando com forte ajuda do Ocidente, e Putin teve que movimentar seus tanques para proteger Moscou. Putin a estas alturas fica temeroso de uma revolta interna contra seu governo. Aliás, ele teme que aconteça em seu país o que ocorreu na Ucrânia, a “Revolução Laranja”, que em 2004 desbancou o governante pró-Rússia que havia assumido em eleição manipulada. Este, inclusive, foi mais um dos motivos para ele invadir a Ucrânia.

Já Prigozhin divulgou um áudio nesta segunda-feira alegando que dois fatores influenciaram sua decisão de reverter sua marcha sobre Moscou. Queria evitar derramamento de sangue e a marcha era uma demonstração de protesto e não pretendia derrubar o poder no país. Disse ele: “Fiz um reconhecimento da área e era óbvio que naquele momento muito sangue seria derramado. Sentimos que demonstrar o que íamos fazer era o suficiente”.

Outra consideração precisa ainda ser feita a respeito da revolta do Wagner. Não se pode esquecer que se trata de um grupo de mercenários. E mercenários lutam por quê? Por dinheiro. E, neste caso, é possível que Putin, que está sofrendo sanções por parte do Ocidente, não estivesse pagando pontualmente os mercenários. Ou, quem sabe, estes quisessem um aumento para continuar a luta. Ou ainda, quem sabe, surgiu uma melhor oferta financeira do outro lado em guerra. A estas alturas, para o Ocidente, se tornaria bem mais barato “comprar” os mercenários do que continuar a fornecer equipamentos militares para a Ucrânia. Em se tratando de guerra, tudo é possível. Seja como for, o fato é que o episódio abalou Putin, que não chegou a se queimar, mais saiu chamuscado.


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