Rachadura na Ucrânia: prefeito de Kiev acusa Zelensky de levar país para o autoritarismo

Rachadura na Ucrânia: prefeito de Kiev acusa Zelensky de levar país para o autoritarismo

Prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, acusou Zelensky de concentrar demasiado poder e de levar o país para o autoritarismo

Jurandir Soares

Disputas estão concentradas na pequena cidade de Avdiivka, que tinha 30 mil habitantes antes da guerra e que hoje tem cerca de 1.500

publicidade

Os últimos seis meses não têm sido de boas notícias para o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky. Senão, vejamos: em julho as tropas ucranianas iniciaram a esperada contra ofensiva, visando fazer as forças russas recuarem para o seu território. Transcorrido todo este tempo e tudo está no mesmo lugar. As disputas estão concentradas na pequena cidade de Avdiivka, que tinha 30 mil habitantes antes da guerra e que hoje tem cerca de 1.500, e que é situada na região do Donbas. Trata-se de uma longa e indefinida batalha, pois nenhuma das forças consegue tomar a pequena cidade. Ou seja, a guerra entrou num impasse e só continua gerando gastos militares e perdas de vidas. Com isto, a União Europeia começa a questionar todos os gastos que está tendo com a guerra, buscando dar sustentação para a Ucrânia. No início de outubro surgiu o conflito entre Israel e Hamas, o que não só deixou da guerra da Ucrânia num segundo plano, como passou a exigir uma atenção maior dos Estados Unidos e da Europa para aquele conflito.

E como se não bastassem todas estas adversidades, o presidente Zelensky acaba de receber uma forte contestação por parte do prefeito de Kiev, Vitali Klitschko. Este acusou Zelensky de concentrar demasiado poder e de levar o país para o autoritarismo. Em entrevista ao jornal alemão Der Spiegel, publicada na última sexta-feira, Klitschko afirmou que “já não nos diferenciamos da Rússia, onde tudo depende do estado de ânimo de uma pessoa”. Numa evidente alusão ao presidente Vladimir Putin. Segundo a publicação alemã, a manifestação do prefeito reflete um crescente mal-estar que está tomando conta da sociedade ucraniana. O prefeito criticou Zelensky por não ter preparado a população ucraniana para a invasão russa. “As pessoas perguntam por que não estávamos preparados para a guerra, por que Zelensky negou até o último minuto que a mesma era possível ocorrer. Por que os russos conseguiram chegar tão rapidamente a Kiev”, disse Klitschko e acrescentou que “há muita informação que não é verdade”.

Klitschko, que é prefeito de Kiev há nove anos, lembrou uma entrevista que dera ao jornal espanhol El País, em setembro de 2022, quando ressaltou que o presidente havia descartado a possibilidade de invasão russa, até poucas horas antes de que acontecesse. E agora, segundo o prefeito de Kiev, Zelensky deixou de lado a Rada, o Parlamento ucraniano, onde o seu partido tem maioria absoluta. O Der Spiegel também ouviu o deputado Oleksii Goncharenko, a voz mais conhecida do Solidariedade Europeia, o principal partido de oposição. Suas críticas foram no mesmo rumo das feitas pelo prefeito de Kiev, ou seja, Zelensky, com o apoio de sua mão direita, Andriy Yermak, toma as decisões de forma autoritária. Inclusive com relação às informações para a imprensa.

Com estas manifestações, voltam as discussões sobre a realização de eleições no país. Neste outono europeu deveria ser realizada a eleição para o Parlamento. Não o foi tendo em vista a legislação eleitoral que impede a realização de eleição se o país estiver sob lei marcial. Para 2024 estavam previstas eleições presidenciais, as quais também estavam descartadas em função da mesma lei marcial. No entanto, com as contestações que despontam contra Zelensky, aumenta também a mobilização pelas eleições. Porém, quanto a isto, há contestação por parte de setores da sociedade civil, que, com o envolvimento com a guerra, não vêm condições para a realização de um processo eleitoral. Com dificuldade maior para isto nos territórios que estão ocupados pelos russos. Zelensky, cujo mandato termina a 31 de março de 2024, descarta a possibilidade de realização de eleição neste momento.

A questão referente ao impasse na guerra, que Zelensky não quer admitir, foi ressaltada pelo comandante das forças armadas ucranianas, Valery Zaluzhny, durante uma entrevista ao The Economist, A declaração foi mal recebida no âmbito do governo. Zelensky negou que a guerra tivesse chegado a um impasse, enquanto o seu principal conselheiro diplomático, Igor Zhovka, chegou a questionar a sensatez de Zaluzhny em participar da entrevista. No entanto, é plenamente constatável por qualquer leigo que a guerra chegou a um impasse. Baste ver que há seis meses os combates se dão no mesmo local, uma pequena cidade que não é tomada por nenhuma das partes. E a consequência, como se observa, é um desgaste cada vez maior do presidente.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895