Sudão e o Grupo Wagner

Sudão e o Grupo Wagner

O Sudão vive desde 2021 sob um governo militar, quando foi derrubado o governo civil democrático.

Jurandir Soares

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As notícias procedentes do Sudão indicam que as lutas naquele país continuam, apesar de terem anunciado um cessar-fogo no fim de semana. O que surge de novidade é a presença naquele país dos mercenários do grupo Wagner, do empresário russo Yevgeny Prigozhin, que tem se destacado por sua presença na guerra da Ucrânia. Eles estão no país para fazer o mesmo que vêm fazendo em outros países da África: dar proteção ao ditador e à exploração das minas de ouro.

O Sudão vive desde 2021 sob um governo militar, quando foi derrubado o governo civil democrático. No centro estão dois generais: Abdel Fattah al-Burhan, líder das Forças Armadas Sudanesas (SAF), e Mohamed Hamdan Dagalo, mais conhecido como Hemedti, chefe das Forças de Apoio Rápido (RSF), grupo de paramilitares. Os dois trabalharam juntos e realizaram um golpe de Estado em 2021. Agora, lutam entre si pela supremacia, o que está destruindo o Sudão. Segundo as informações, já são mais de 420 mortos, mais da metade de civis, e cerca de 3.500 feridos. Segundo a BBC, Hemedti era simplesmente um líder de milícia “desempenhando um papel de contra-insurgência, ajudando os militares”, enquanto Burhan era um militar de carreira, embora “com todas as ambições do corpo de oficiais sudaneses. O que significaria que para ele tudo é possível”. Os mercenários do Wagner teriam entrado no país para dar proteção ao regime em nome de um interesse maior da Rússia, que é ter à sua disposição um porto no Mar Vermelho. O objetivo do Kremlin é não só ter mais um país aliado na região, como ter um porto para os seus navios atracar. Este objetivo agora depende de negociação com quem sair vencedor na disputa. Por via das dúvidas, o Grupo Wagner já aumentou sua presença no país e conseguiu a concessão para a exploração de uma das minas de ouro.

Enquanto isto, os países do Ocidente tratam de tirar seus diplomatas e cidadãos do país conflagrado, que se tornou um importante ator nas disputas entre a Rússia e o Ocidente.

Conflagração faz parte da história do Sudão, um país que chegou ao ponto, recentemente, de se dividir, com a criação do Sudão do Sul. Este fato, ocorrido em 2011, fez com que o Sudão perdesse sua condição de maior país da África. Com seus 48 milhões de habitantes e 1,866 milhão de quilômetros quadrados, passou a ser o terceiro, sendo superado pela Argélia e República Democrática do Congo. Já no índice de corrupção ocupa a quarta posição no mundo. Suas línguas oficiais são o árabe e o inglês. Sua história é repleta de conflitos étnicos e guerras civis. De acordo com o Índice Global de Fome, o país tem uma situação alarmante nesse setor, sendo a quinta nação mais faminta do mundo. Seu IDH é de 510, o que o classifica com um dos mais baixos índices de desenvolvimento humano do mundo. Tudo isto mesmo tendo ouro e petróleo em seu território.

A razão da separação do país remonta ao século VII, quando o território foi tomado pelos árabes, que levaram para lá o Islamismo. Porém, o Sul escapou ao controle muçulmano e foi dominado por caçadores de escravos, sendo mais tarde levado para lá o Cristianismo. Assim é que o início deste século foi marcado por mais uma grande guerra civil no Sudão, que resultou na separação da parte Sul, que, embora minoritário territorialmente, ficou com 75% das reservas petrolíferas. Mesmo assim, apenas metade da população tem água tratada, enquanto a rede sanitária é para 20%. O mais relevante é a eletricidade, que atinge apenas 5% da população.

O perigo do conflito no Sudão é sua extensão envolvendo outros países. Já foi constatada a presença de soldados e aviões do Egito, que estariam dando apoio ao general Burhan. Tanto os soldados quanto os aparelhos teriam sido tomados pelos paramilitares na base aérea de Merowe, 300 quilômetros ao Norte da capital Cartum. Os aviões foram destroçados e os soldados foram libertados depois de um ultimato do governo do Egito. Os Emirados Árabes Unidos, segundo o pesquisador Andreas Krieg, do King’s College, de Londres, citado pelo The Guardian, estariam coligados com Hemedti e o Grupo Wagner. Há ainda a possibilidade de intervenção de mercenários da Líbia.

Porém, o grupo externo que realmente marca sua presença no país é o Wagner, que já atua também na Líbia e na República Centro Africana. E que, segundo consta, já estaria negociando com Hemedti, para, no caso de uma vitória dele, lhe dar proteção. Afinal, neste caso tratar-se-ia de um acordo entre “grupos respeitáveis” de mercenários e paramilitares.


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