Um novo ator na guerra

Um novo ator na guerra

Guerra da Rússia contra a Ucrânia apresentou uma surpresa esta semana com a entrada em cena do presidente turco Recep Tayyip Erdogan

Jurandir Soares

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A guerra da Rússia contra a Ucrânia, que se estende desde 24 de fevereiro, apresentou uma surpresa esta semana com a entrada em cena do presidente turco Recep Tayyip Erdogan. O inusitado não é a sua participação, mas o fato de ele ter se colocado ao lado da Ucrânia, se propondo não só a agir para o fim da guerra, como para conseguir recursos para a recuperação do país. Erdogan há muito que vinha mantendo uma relação muito próxima com o presidente russo Vladimir Putin, algo que, inclusive, vinha desgostando o Ocidente, tendo em vista que a Turquia é membro da Otan. E a chamada Aliança Atlântica tem importantes bases militares em território turco. Este “namoro” de Erdogan com Putin começou depois de o governo de Ancara ter visto frustradas suas múltiplas tentativas de passar a fazer parte da União Europeia. E foi justamente após esta frustração que Erdogan assumiu posições mais radicais dentro de seu país, promovendo, inclusive, uma reaproximação do Estado com o Islã, algo que predominou durante o período do império Turco Otomano e que fora posto de lado desde a década de 1920, quando Mustafa Kemal Atatürk fundou a moderna Turquia. Ao mesmo tempo, Erdogan se afastou do Ocidente e passou a ter uma relação muito próxima com a Rússia.

Inquestionavelmente, diante do quadro que se apresenta, Erdogan surge como um importante ator para conseguir ao menos um cessar fogo no conflito. E ele tem a mesma preocupação que os demais europeus, que é com a questão nuclear. Já tivemos por diversas vezes manifestações de autoridades russas ameaçando o uso de dispositivos nucleares, em caso de uma participação mais direta do Ocidente no conflito. Esta, sem dúvida, é uma hipótese mais remota, porém, o perigo mais imediato está nas usinas nucleares instaladas em território ucraniano, como a de Zaporizhzhia, considerada o maior complexo nuclear da Europa e que foi tomada pela Rússia desde março. Todos têm lembrança do ocorrido com Chernobyl, em 1985, quando, por total descaso e incompetência dos soviéticos, houve um vazamento que atingiu toda a Europa. No início de junho, o chefe da Agência Internacional de Energia Atômica, órgão da ONU, Rafael Mariano Grossi, disse que há um “risco claro e presente para a segurança e salvaguardas na usina nuclear de Zaporizhzhia, na Ucrânia”.

E que “pelo menos cinco dos sete pilares indispensáveis da segurança e proteção nuclear foram comprometidos no local”. Daí a preocupação, não só de Erdogan, mas de todos os países no entorno da Ucrânia. Quanto à guerra propriamente, apesar da boa vontade de Erdogan, não se vislumbra no momento uma possibilidade clara de término. Até porque a Rússia está fazendo avanços na região do Donbas, onde tem um contingente significativo de população de origem russa e que defende a separação daquela área. Assim como está também causando grandes estragos na parte sul ucraniana, onde situa-se Odessa, com o mais importante porto do país, por onde a Ucrânia exporta sua produção através do Mar Negro. É certo que a Ucrânia tem dado algumas respostas significativas, como a destruição em terra de nove aviões caças russos na Crimeia. E há toda a questão das sanções que, por mais que Putin tente relativizar, estão pesando muito sobre a Rússia. Quem sabe sejam argumentos para Erdogan usar numa negociação. O fato é que ele demonstra tanta confiança em sua ação que já está providenciando até nos investidores para a recuperação da Ucrânia pós-guerra.


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