Urgência para dois estados

Urgência para dois estados

O governo de Israel não pode agir como se os palestinos não existissem

Jurandir Soares

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Estamos diante do maior ataque já feito pelo Hamas a Israel. Foram 22 localidades atacadas. Ao longo do fim de semana só se ouvia aumentar o número de mortos e de feridos de ambos os lados. O fato revelou uma imensa falha do sistema de defesa de Israel, tendo em vista que são conhecidas as intenções do Hamas. Porém, ultimamente o governo de Benjamin Netanyahu está mais preocupado com a ação que desenvolve contra o Judiciário. Só que o Sistema de Inteligência israelense, que não tem nada a ver com isto, falhou redondamente.

Mas, para mergulhar nas razões deste acontecimento, começo citando uma frase dita neste sábado, em entrevista à CNN Internacional, por Ehud Olmert, que foi primeiro-ministro de Israel de 2006 a 2009: “O governo de Israel não pode agir como se os palestinos não existissem”. Sem dúvida, este é o fato real. A protelação da constituição de dois estados só faz perpetuar a violência. E Olmert chamou a atenção para o descaso do governo liderado por Netanyahu para com a questão palestina. Uma questão que, é preciso salientar, divide hoje o próprio povo palestino. A facção Fatah, que controla a Cisjordânia, com cerca de 3,8 milhões de habitantes, e que é a base da Autoridade Nacional Palestina, é a mais moderada, já tendo declarado que aceita a existência do Estado de Israel. O Hamas, que domina a Faixa de Gaza, uma área de cerca de 41 km de comprimento por 12 km de largura e onde se aglomeram 2 milhões de palestinos, não só não aceita como quer a destruição do Estado de Israel. Por isto, é considerado por Israel e por Estados Unidos como uma organização terrorista.

Detalhe marcante é que israelenses e palestinos já assinaram um acordo de paz, com o reconhecimento mútuo de seus respectivos estados. Isto deu-se em 1993, no chamado Acordo de Oslo. Sob a mediação do então presidente dos EUA Bill Clinton, o acordo foi firmado pelo líder palestino Yasser Arafat e pelo então primeiro-ministro de Israel Yitzhak Rabin e pelo chanceler Shimon Peres. Fato que deu aos três signatários o Prêmio Nobel da Paz. Iniciou-se inclusive um processo de gradativa autonomia para os palestinos em seus territórios. Aí foi a vez da ala radical de Israel se manifestar. Um jovem judeu, contrário ao acordo, assassinou Rabin. Na sequência se deu a ascensão de Ariel Sharon ao governo de Israel e, com isto, o radicalismo tomou conta do governo. Um radicalismo que veio ganhando força e que hoje se consagra na aliança extremista liderada por Netanyahu.

Ghaith al-Omari, analista sênior do Washington Institute, diz que “Oslo criou estruturas políticas importantes que ainda sustentam as relações entre israelenses e palestinos e que dão uma voz para os palestinos na esfera internacional”. Para ele, o colapso de Oslo significaria a extinção de um movimento nacional palestino por toda uma geração. Em vez de procurar novas ideias, Omari prefere que as partes trabalhem em cima do que funcionou. Antes de voltarem à mesa para negociar, precisam reconstruir a confiança erodida durante essas três décadas. Isso poderia ser feito, afirma, com pequenas medidas que convençam as pessoas das vantagens de cooperar. Por exemplo, ampliando o território sob controle palestino na Cisjordânia, permitindo que desafogue a população de suas cidades. O custo para Israel seria baixíssimo e teria um alto retorno político. “Precisamos de pequenas vitórias.” Mas justamente a questão da Cisjordânia é emblemática, porque o governo israelense insiste na instalação de colônias judaicas naquelas áreas que, segundo o que foi aprovado pela ONU em 1957, seriam destinadas ao Estado da Palestina.

Diante desta postura do governo israelense e da falta de ação e de representatividade da Autoridade Nacional Palestina, o que se vê é ampliação de poder do Hamas. Insuflado fundamentalmente pelo maior inimigo de Israel, o Irã. A propósito, Israel tem realizado ultimamente diversos acordos de paz com países árabes. Todos tendo o Irã como inimigo em comum. Isto a partir de uma iniciativa do ex-presidente americano Donald Trump, que fomentou os chamados Acordos de Abrahão. A paz foi selada com Emirados Árabes Unidos, Barhein, Sudão e Marrocos. E está por ser assinada com a Arábia Saudita. E em nenhum desses acordos foi mencionada a questão palestina. Assim é que, enquanto não for resolvida a questão do estado para os palestinos, os movimentos radicais, como do Hamas, tendem a ganhar força.


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