Conversa de Carro: Índia muda estratégia de segurança de trânsito
Gigante populacional asiático busca espaço nas grandes economias mundiais, pensando no carro do futuro
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A Índia aceitou o desafio de pousar no lado obscuro da Lua. A nave Chandrayaan 3 alunissou suavemente num local misterioso, que se acredita ter água, mas provavelmente não tem o charme de Marte para abrigar alienígenas. Afinal em livros e filmes de ficção cientifica jamais um "lunático" perseguiu ou devorou um humano. Mas marcianos eram sempre maus e perseguidores implacáveis. A nave com certeza será preservada e poderá realizar seu trabalho de fotografar e colher a amostras do solo gelado que os terráqueos não enxergam.
Brincadeiras à parte, não há surpresa nesta vitoria espacial da India. O pais com mais de 1,4 bilhão de habitantes excede as expectativas em múltiplos sentidos e direcionamentos do conhecimento humano. É uma reconhecida potência na informática, medicina,, astrofísica e tantas outras áreas do conhecimento. É lógico que o pais tem também muitas mazelas. Como as divisões religiosas, que tantas vezes se tornam letais.
Há outro "calcanhar de Aquiles", o letal sistema de transito da Índia mata mais de 150 mil a cada ano. Os manuais internacionais orientam para que estrangeiros não aluguem carros nem dirijam por la. Podem morrer. É comum nas rodovias do pais, que têm trânsito intenso de animais de grande porte, que motoristas transitem em alta velocidade na contramão.
É uma nação de motorização recente, porque foi somente em 1950 que marcas como a Mahindra, Hindustan Motors, Strandard , Premier e Tata Motors, iniciaram suas redes de revendedores e passaram a produzir veículos. O tempo passa, em 2023 a Índia já é o terceiro maior mercado automobilístico do mundo. Com produção anual de mais de 4 milhões de veículos, que servem para o consumo local e mercados de exportação. É lógico que este crescimento tem relação com a expansão da economia indiana, com alta do Produto Interno Bruto de 2 trilhões de dólares em 2014, para 4 trilhões de dólares em 2023. O crescimento geométrico colocou automóveis nas mãos de muitos milhões de indianos. A classe média indiana representa 33% da população de 1,4 bilhões. Será 40% em 2031 e 65% em 2047. Portanto mais de 300 milhões deverão estar tecnicamente na classe média e poderão comprar carros.
A contrapartida é que o sistema de trânsito imaturo se tornou um inferno. Agora esta Índia que chegou à Lua quer mudar sua imagem diante do mundo, para se tornar mais competitiva também no plano econômico. O governo, com um aporte de US$ 250 milhões do Banco Mundial iniciou um plano de mudança de "corações e mentes" no trânsito indiano. Medidas drásticas foram tomadas: a obtenção da habilitação ficou mais difícil, a legislação de crimes de trânsito contem longas penas de prisão e até mesmo perpétua. E não há piedade em relação a "bandoleiros" do trânsito. A Índia também evolui em sua estrutura viária: retifica trechos mortais de estradas, dando atenção à sinalização e evitando que animais como elefantes se misturem aos veículos motorizados.
O Governo de Narendra Modi decretou o "fim do carro inseguro". Todos os veículos que serão produzidos a partir deste ano terão que passar por testes de impacto mais exigentes. Além do impacto a 64 km/h contra paredão de concreto, impacto lateral por ariete de aço a 58 km/h e choque pela traseira; os veículos serão submetidos a capotamentos para verificação da resistência do teto e colunas laterais. Somente carros aprovados com um mínimo de quatro estrelas poderão trafegar.
Convém lembrar que até marcas famosas como a Renault, sabendo das leis de trânsito frouxas do pais, relaxaram. O Renault Kwid lançado na India em 2015 simplesmente "partiu ao meio" ao ser lançado contra o paredão de concreto. Foi um escândalo indiano e mundial que obrigou a Renault a pedir desculpas e a refazer a segurança do Kwid, que ganhou mais de 120 quilos em reforços estruturais. E o modelo vendido no Brasil se beneficiou com isto. A grande parte da frota indiana tem similaridade com a frota brasileira: é velha e insegura.
Mas o Governo democrático que induziu ao crescimento econômico e fomentou pesados investimentos em educação, pensa o trânsito como uma manifestação sócio cultural. Se esta manifestação contém carros ruins, inseguros e a barbárie de milhões de motoristas, a imagem da Índia chega distorcida e desfocada ao mundo.