A presença do escotismo no Rio Grande do Sul

A presença do escotismo no Rio Grande do Sul

Há mais de 75 anos, crianças, jovens e adultos participam dos movimentos escoteiro e bandeirante no Estado

Por
Taís Teixeira

Movidos por preceitos educativos, culturais e sociais, o movimento escoteiro (ME) e o movimento bandeirante (MB) chegaram ao Estado há mais de 75 anos, consolidando-se como uma filosofia de vida para crianças, jovens e adultos. O ME é o mais antigo, sendo criado em 1907, na Inglaterra, por Robert Baden-Powell. No Brasil, os escoteiros iniciaram as atividades em 1910, no Rio de Janeiro, por meio dos marinheiros e oficiais da Marinha Brasileira. Em 13 de outubro de 1913, o movimento chegou a Porto Alegre com o Grupo Escoteiro Georg Black, que é o mais antigo em funcionamento ininterrupto no país, com 109 anos de história, que funciona na Sociedade de Ginástica de Porto Alegre (Sogipa). Atualmente, o RS tem 8.775 escoteiros, 9,2% do efetivo nacional, que é de 95.003. Já o MB deriva do ME. Começou oficialmente em 1909, também na Inglaterra e por Robert Baden-Powell. Em 1919, chegou ao Rio de Janeiro e ao Estado em 13 de agosto de 1944, contabilizando 78 anos de existência. Atualmente, tem 330 bandeirantes no RS, 9% dos 3 mil do total no país.

As duas organizações são consideradas irmãs. O escotismo é um movimento educacional voluntário de jovens e para jovens, sem vínculo a partidos políticos, que conta com a colaboração de adultos e valoriza a participação de pessoas de todas as origens sociais, etnias e credos, de acordo com seu Propósito, seus Princípios e o Método Escoteiro, concebidos pelo Fundador Baden- Powell e adotados pela União dos Escoteiros do Brasil. 


Segundo a chefe escoteira do Ramo Sênior, Manoela Kanan, o escotismo usa elementos como camaradagem, iniciativa, coragem e autodisciplina no desenvolvimento dos jovens. Foto: Mauro Schaefer

A Federação de Bandeirantes do Brasil é uma organização civil, beneficente, sem fins lucrativos, de educação não formal, que prepara para a cidadania ativa de crianças, adolescentes e jovens dos 5 aos 18 anos, contando com a participação de adultos voluntários na coordenação e direção. A instituição atua no Distrito Federal e em 14 estados brasileiros, sendo que a entidade é, no país, a única representante da Associação Mundial de Bandeirantes (WAGGGS), que é reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) e por outros órgãos internacionais como uma das entidades mais relevantes na educação não formal, com 10 milhões de associados em 152 países de todos os continentes. As estruturas têm características comuns e distintas.

A fundação é um aspecto comum, já que ambos foram criados por Robert Baden-Powell. Segundo a analista de Métodos Educativos do Escritório Regional dos Escoteiros do Brasil do RS e chefe escoteira do Ramo Sênior, Manoela Kanan, Powell usou elementos positivos da sua experiência militar, como camaradagem, iniciativa, coragem e autodisciplina e técnicas que poderiam ser úteis no desenvolvimento dos jovens. “Aos poucos, o Escotismo foi crescendo, alcançando outros países e hoje é o movimento com mais jovens do mundo, com mais de 57 milhões de integrantes”, disse. Ela explica que no início era um movimento apenas para meninos. “As meninas também se interessaram, e, a partir de 1909, começou a se organizar um movimento paralelo, mas com os mesmos princípios e propósitos, a partir da irmã e da esposa de Baden-Powell.”

A participação das meninas

Quando o movimento chegou ao Brasil destinado às meninas, em 1919, foi batizado de Movimento Bandeirante. Por muito tempo, os meninos podiam apenas ser escoteiros e as meninas podiam apenas ser bandeirantes. Hoje, os dois grupos aceitam meninos e meninas. “Os dois movimentos seguem os mesmos princípios e propósitos, mas têm estruturas e programas um pouco diferentes”, afirma Manoela Kanan.

A partir de 1916, mulheres passaram a fazer parte do ME. Entretanto, só eram aceitas mulheres adultas, cuja única função possível era chefiar os lobinhos. O Ramo Pioneiro foi o primeiro a aceitar garotas como jovens dentro do escotismo. Desde 1963, o clã pioneiro do Grupo Escoteiro Georg Black 1/RS já realizava atividades mistas. Em 1968, esse clã tornou-se o 1º Clã Misto do Brasil. A implantação da coeducação no escotismo brasileiro, realizada de 1979 a 1982, foi um processo que tinha como objetivo comportar meninos e meninas dentro do Movimento Escoteiro no Brasil. É a partir dele que foram aceitos oficialmente alcateias, tropas e clãs mistos depois de mais de 70 anos da fundação do Escotismo.

O coordenador técnico estadual no RS do MB, Gabriel Serra, esclarece que em 1909, durante convenção escoteira no Palácio de Cristal, em Londres, um grupo de meninas foi até Powell e pediu a oportunidade de também atuar no ME. Diante dessa demanda, Powell chamou sua irmã Agnes Baden Powell e juntos fundaram as “Girl Guides” (Movimento Bandeirante) somente para meninas.

Terceiro em participantes


Jovens entre 13 e 17 anos de idade que fazem parte do Grupo Escoteiro Guia Lopes 2/RS. Eles se encontram sempre aos sábados à tarde, na sede do Grêmio Náutico União, na Ilha do Pavão, na Capital. Foto: Mauro Schaefer

O Escotismo do RS é a 3ª maior região do Brasil, em quantidade de associados, com 28 grupos espalhados em 117 municípios. Os 8.775 (3,5 mil mulheres, 5275 homens) integrantes estão distribuídos em jovens, lobinhos, escoteiros, seniores e guias, pioneiros e adultos voluntários, somando seis categorias. Para Manoela Kanan, que é do movimento escoteiro desde 1999, quando ingressou com 13 anos, foi membro jovem e atua como voluntária desde 2002, ser escoteiro não se limita a uma atividade extracurricular ou algo para se fazer nos sábados à tarde. “Significa fazer parte de uma fraternidade mundial, com milhões de pessoas que têm os mesmos valores e os mesmos objetivos. Significa voltar sujo e cansado de um acampamento, mas com muitas histórias para contar. Significa ter amigos de todos os tipos, que mais parecem irmãos. Significa ter experiências inesperadas. Significa desenvolver autonomia, responsabilidade, ética, trabalho em equipe. Significa ser um cidadão ativo na sociedade. Significa fazer uma promessa para si mesmo, para seguir valores e princípios”, disse.

Já os bandeirantes têm sua própria classificação, que é formada pelas fases de ramo ciranda, ramo B1, ramo B2, ramo guia e coordenadores e dirigentes voluntários, sendo que cada uma se diferença pela cor do lenço (amarelo, azul claro, verde bandeira, grená e azul escuro). Oito grupos atuam no Estado, cada um em um município diferente. Serra define que o sentimento de pertencer ao movimento bandeirante é único e remete ao tempo em que participou da primeira reunião do grupo, quando tinha 12 anos. “O que mais me marcou foi ouvir no final da atividade, de um alguém que até então eu não conhecia, mas que viria a se tornar um grande amigo ‘te vejo no próximo sábado’. Já são mais de 10 anos de sábados e foram neles que fiz meus melhores amigos”, descreve. Hoje, na posição de coordenador, ele acrescenta que a convivência entre jovens e adultos é “a chave mais importante para aflorar o protagonismo na vida de cada um de nós”.

Os recursos para manter o escotismo são provenientes do Registro Escoteiro, um valor anual que é pago para acessar as atividades externas. Ações como galetos, feijoadas, campanhas financeiras e projetos com entidades também são desenvolvidos pelos grupos. No MB, a situação é semelhante. O aporte vem de doações, patrocínios e campanhas financeiras, além de verba oriunda de programas governamentais.

Pandemia impactou movimento de escoteiros e bandeirantes

Os acampamentos, excursões e atividades externas que marcam as atividades dos dois movimentos foram suspensos para seguir os protocolos sanitários impostos como medidas para conter a propagação do coronavírus, que causou a pandemia mundial da Covid-19, que ainda perdura, mas em um nível mais controlado devido ao avanço das vacinas. Essa realidade marcada pelo distanciamento social exigiu criatividade e reinvenção dos dois movimentos. 

O escotismo segue o Método Educativo Escoteiro, composto por oito pontos: promessa e Lei Escoteira, aprender fazendo, suporte do adulto, marco simbólico, envolvimento comunitário, sistema de equipes, progressão pessoal e natureza. Esse último tópico, da natureza, foi o mais prejudicado com a pandemia. “Com o distanciamento social, foi necessário adaptar nossas atividades, antes totalmente ao ar livre, para o formato digital e a distância. Foi um período difícil, durante o qual nossos adultos voluntários precisaram reinventar suas propostas, com a ajuda do jovem”, afirma a escoteira Manoela.

Outro reflexo foi a redução de participantes. “Em 2019, conseguimos alcançar a marca de 15 mil associados só no estado do Rio Grande do Sul. Durante a pandemia, esse número caiu para 7,5 mil, ou seja, uma queda de 50%. Muitos jovens e adultos tiveram dificuldades para se adaptar ao formato on-line, além de conciliar tantas atividades em frente ao computador”, realça. 

O contexto não foi diferente para os bandeirantes. O coordenador Gabriel Serra ressaltou que a criatividade foi colocada em prática e uma série de programas foi criada para o grupo não perder contato. “Essas atividades variavam entre acampamentos em casa, no quintal ou na sala, concurso de canto e dança, gincanas on-line, oficina de nós e amarras”, enumera. Além disso, foram mantidas as ações de serviço à comunidade, como arrecadação de alimentos e donativos para famílias atingidas pelos reflexos da pandemia. “A Federação de Bandeirantes do Brasil, com todo cuidado e amparo legal, editou o protocolo VISA (Volta Inteligente e Segura às Atividades), que os núcleos do país todo precisariam se adequar para retornar às atividades presenciais”, salienta.

Assim como os escoteiros, os bandeirantes também sentiram a diminuição de pessoas interessadas em ingressar no movimento. “A redução do efetivo jovem é marcante nos últimos dez anos, pois estão descobrindo novos interesses, o que me faz acreditar que cabe aos movimentos se atualizarem e se tornarem atrativos para esse público, desafio que deve estar aliado ao nosso método centenário da educação”, elucida.

Além da pandemia, a Internet, que proporciona ao usuário navegar nas redes sociais, pesquisar produtos, fazer compras, assistir filmes, séries e documentários, consumindo o tempo das pessoas, pode ser mais um fator de afastamento e desinteresse. Manoela Kanan explica que, no escotismo, pelo caráter de campo e contato com a natureza, desde o início, teve como prioridade desenvolver atividades práticas, ao vivo e desconectadas de Internet, altas tecnologias e afins. No entanto, a analista de métodos de educação reitera que os escoteiros acompanham as mudanças da sociedade e exemplifica citando o Jota-Joti (Jamboree On The Air - Jamboree On The Internet), evento que ocorre anualmente em nível mundial. “No Brasil, temos uma organização nacional que propõe a atividade em formato de gincana, com tarefas a serem realizadas durante todo o fim de semana, utilizando muita tecnologia para fotos, vídeos, pesquisas e principalmente conexão, não só com a organização do evento, mas com grupos escoteiros de todo o país por meio de rádio e pela Internet”, enfatiza.

Serra entende que não há como aplicar o método bandeirante sem estar em constante atualização. “Eu não vou conseguir atrair uma criança ou um jovem da sociedade atual, se não os encantar de maneira que eles se sintam entusiasmados a participar do movimento bandeirante, o que fez o MB trazer para si o uso de tecnologias e de maneira saudável”, salienta. Ele menciona eventos virtuais como Surf Smart, projeto que ensina os bandeirantes a navegação segura na Internet, e o Rally Virtual, que reúne bandeirantes do país inteiro para cumprir uma série de atividades nas redes sociais.

Décadas de escotismo


Wilma, de 94 anos, coleciona fotos, medalhas e boas lembranças do escotismo. Foto: Mauro Schaefer

Vestida com seu traje básico de atividades, a ansiedade se manifestava em forma de nervosismo pelo medo de esquecer de detalhes sobre um dos grandes amores da sua vida: o escotismo. A professora de música e piano Wilma Erika Veit Schiefferdecker, de 94 anos, coleciona fotos, medalhas, viagens, cursos e uma família inteira envolvida no escotismo. Apaixonada pela atividade, a qual se dedica há 78 anos, precisou se afastar um pouco da rotina por causa da pandemia e de alguns problemas de saúde, mas nada que tenha afetado as memórias desse tempo. Aliás, a escoteira está ávida para voltar às atividades, que ficaram mais restritas a eventos on-line com a pandemia. 

A professora conta que se tornar escoteira não foi uma decisão, mas um acaso feliz. O cunhado, que era escoteiro e presidia o movimento no RS, a convidou para integrar um grupo de meninas para fundar o movimento Bandeirantes no Estado, já que existia em outras partes do Brasil. Nessa época, o escotismo não aceitava meninas. “Então, em 1944, eu e mais sete meninas, fomos para o Rio de Janeiro em um encontro nacional do movimento”, conta, lembrando que na época tinha 16 anos. Durante dois anos, ela e as outras meninas se reuniram e executaram atividades para implementação dos bandeirantes em território gaúcho. Foi quando conheceu um dos escoteiros mais engajados da época, que viria a ser seu marido. “Para termos uma agenda mais parecida, acabei virando escoteira, já que passaram a aceitar mulheres”, conta. 


Na fotografia, Wilma é a quarta da esquerda para a direita. Foto: Arquivo Pessoal

O marido, Lino Augusto Schiefferdecker, que começou ainda criança como escoteiro, ingressou no grupo de Escoteiros Georg Black, em 1934. Foram casados por 52 anos, até o marido falecer em 2004. O amor pelo escotismo compartilhado pelo casal se estendeu aos três filhos, Sérgio Antônio, Sônia Maria e Suzana. Suzana e o esposo Rudi seguem ativos nas atividades, no mesmo grupo dos pais. A dedicação pelo movimento avançou mais uma geração e chegou aos cinco netos. Dois ainda seguem envolvidos com o movimento. 

Quando fala sobre o assunto, os olhos azuis de dona Wilma ganham mais brilho, especialmente quando destaca tudo o que aprendeu nesses quase 80 anos de história vivida no escotismo gaúcho. “A educação, o convívio, as atividades, o contato pessoal renova a gente”, disse. A mulher de 94 anos que dividiu a vida ensinando música para os alunos e valores para os escoteiros conta que passou por muitos cursos de capacitação para entender a metodologia e estar apta aos grupos, especialmente os lobinhos, crianças de entre 6 e 6,5 anos de idade, grupo com o qual mais trabalhou. “É um contato com elementos mais lúdicos e gosto de crianças”, enfatiza. 

Ao conviver com os lobinhos, ela menciona que o fato de proporcionar às crianças programas que os pais, algumas vezes, não oferecem é uma das possibilidades que considera mais gratificante. “Nós desenvolvemos muitas atividades ligadas à arte, como ir a museus, atividades turísticas, coisas que muitas famílias não fazem”, relata.

Aos jovens, ela ressalta que “para quem só estuda ou fica na Internet, que conheça o movimento, um lugar onde se aprende sobre honra, respeito e valores”, aconselha a, com muito orgulho, escoteira.

Crise econômica pode ter impactado crescimento

Depois de 16 anos de escotismo (1997 a 2013), no Grupo Escoteiro Taquató 97/RS, de São Sebastião do Caí, e historiador, mestre em Antropologia Social, doutorando em História e docente da Unisinos e do Colégio Sinodal, Caio Flores Coelho decidiu fazer uma dissertação sobre o tema. De 2011 a 2013, quando defendeu trabalho acadêmico, acompanhou uma série de escoteiros em atividades no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina e na Europa (Suécia e Reino Unido). Na época, atuou como escoteiro e “antropólogo ativo”, como denominou. 

Com o título “A Dádiva de Si: estudo etnográfico sobre movimento escoteiro”, a análise se centrou na questão do voluntariado entre escoteiros que estavam chegando à idade adulta. “Essa doação de si como ritual de passagem, deixando a adolescência e chegando ao mundo adulto e a construção de identidades no movimento escoteiro a partir da abnegação e do altruísmo”, explica. 

O historiador considera que o período no qual acompanhou o movimento tenha alcançado o auge no Estado. “Acredito que atingimos um ápice de pessoas envolvidas no movimento escoteiro ao redor do ano de 2011, uma vez que as condições econômicas daquele período possibilitaram a procura por atividades extracurriculares para jovens e adultos”, avalia.

Coelho enfatiza que a crise econômica que atingiu o país a partir de 2016 causou impacto no envolvimento de pessoas no escotismo, especialmente pelo fato de que a renda média das famílias decaiu e seus membros tiveram que se dedicar a atividades que pudessem gerar algum retorno financeiro, além do fato de que menos pais podiam despender recursos com uniformes, acampamentos e demais atividades do movimento.

Coelho diz não acreditar que a Internet tenha prejudicado o envolvimento de jovens no movimento escoteiro, uma vez que este sempre soube se utilizar de ferramentas digitais para ampliar seu público. “Não há uma dicotomia entre jovens que gostem de atividade ao ar livre e outros que gostem de ficar sedentários assistindo telas. Os jovens podem querer fazer os dois e conseguem equilibrar essas atividades sem grandes percalços. Na minha visão, a possível diminuição de membros do movimento no país se deve puramente a uma questão macroeconômica”, enfatiza. 

Na avaliação do historiador, os escoteiros oferecem um programa educacional extremamente necessário. “Todas as pessoas que se envolveram com o movimento em sua juventude podem atestar que desenvolveram conhecimentos ali que não seriam possíveis em outro lugar. Isso vai desde competências emocionais até técnicas de sobrevivência e primeiros socorros. Não são todas atividades ‘acadêmicas’, mas envolvem um tipo de conhecimento prático que é muito prezado pelo movimento."

Pelo mundo

Os países com maior número de escoteiros são Indonésia, Índia, Estados Unidos, Filipinas, Bangladesh, Tailândia, Paquistão, Tanzânia, Reino Unidos e Quênia. A sede da Organização Mundial do Movimento Escoteiro fica em Genebra, na Suíça. A WAGGGS (World Association of Girl Guides and Girls Scouts), que é a Associação Mundial de Bandeirantes, está presente em Suíça, México, Índia, Inglaterra e em países da África.

Uma segunda família

Desde os 9 anos, a estudante Bárbara de Moura Braga faz parte dos escoteiros. Hoje, prestes a completar 15 anos, vai entrar na categoria Sênior. Integrante do Grupo Guia Lopes, em Porto Alegre, o segundo a surgir no Estado, ela conta que o interesse nasceu a partir de relatos de amigos que já faziam parte do movimento. Comunicativa, Bárbara disse que sempre gostou de se expressar. “Encontrei no movimento uma forma de fazer isso”, disse. Com as redes sociais, ela reúne duas paixões, a vida de escoteira e o mundo digital. Mas a relação vai além disso. “Para mim, é uma segunda família”,  destacou, reforçando que pretende continuar nos escoteiros.

Mais de quatro décadas de dedicação

“Eu tinha 12 anos e entrei na tropa do grupo escoteiro Isaac Bauler, que tinha sede ao lado da Igreja Santa Cecília, em Porto Alegre. Fui levado junto com meu irmão pela minha mãe, pois meu avô materno, que na época havia falecido há dois anos, tinha sido escoteiro e acabamos indo ver como era”, conta o servidor público municipal, Paulo Roberto Siebiger, Funcionário Público Municipal, 55 anos. Com 43 anos de dedicação ao escotismo, Siebiger passou por todas as categorias e ainda fez cursos para se aperfeiçoar no movimento. 

Apaixonado e comprometido, ele  define que ser escoteiro é uma filosofia de vida e um aprendizado para ser uma pessoa melhor. “É estar preparado para o mundo lá fora, evoluir com as mudanças tecnológicas sem deixar a essência de lado”, resume. Há cinco anos, ele se divide entre Porto Alegre, onde mora e trabalha, e sobe a serra todos os fins de semana para chegar em Flores da Cunha para acompanhar as atividades como Mestre Pioneiro (trabalho com jovens de 18 a 21 anos incompletos) do grupo escoteiro Alberto Mattioni, que fica na cidade serrana. 

Desafio de “concorrer” com a tecnologia:

Ao longo dessas mais de quatro décadas, acompanhou muitos jovens e percebeu a mudança de comportamento e de perfil dos jovens, que hoje estão mais conectados e desfrutam de tecnologias inovadoras que não existiam há anos. O desafio de manter a atividade interessante e atrativa é um desafio diário. “A tecnologia de certa forma auxilia, pois nos propicia conversar com pessoas distantes, de outras cidades, estados e países. Nos permitiu realizar atividades on-line durante a pandemia, e hoje facilita muito para consultas, para pesquisas e seguirmos fazendo um Escotismo de qualidade”, afirma. Em contrapartida, entende que a tecnologia é   prejudicial quando os “jovens hoje estão muito presos às redes sociais, aos games, ao postar seus status e exporem suas vidas”, mas reitera que cabe aos adultos  conciliar o moderno,o tecnológico, com o antigo, com um acampamento de técnicas mateiras, com atividades atraentes para os jovens.

Sem medo de falar em público

A presidente do Movimento Bandeirante do RS, Ana Lúcia Caetano Christofoli, 61 anos, é a prova de que não existe idade para começar algo novo. Ela, quando atuava como pedagoga, conheceu  o MB  em 1996, durante uma parceria do movimento com a instituição na qual  trabalhava na época. A vontade de permanecer vem na crença de que pode mudar a vida das crianças e jovens. “Como eu trabalhava com crianças e jovens da comunidade para eles ser Bandeirante era um sonho de algo melhor. Era vivenciar a prática da aventura, da vida em equipe,  de proporcionar a eles viagens,  acampamentos e o conhecimento de outras realidades e culturas”, relatou.

Todavia, antes de destacar as possíveis mudanças nos outros, ressalta que modificaram a própria vida, proporcionando um crescimento como pessoa e como profissional. “A menina de 20 anos atrás era diferente,  não era empoderada como a de hoje”, afirma. Ela realça que não gostava de falar em público e por meio dos treinamentos e convites para compor equipes, venceu o medo e evoluiu dentro do movimento, passando de coordenadora técnica estadual, da equipe de expansão do MB no RS até  presidente.

Hoje ela destaca que as mudanças de tempo respingaram até no método de ensinamento, especialmente em relação à entrada da mulher. “Antes, nosso primeiro passo era fazer as meninas compreenderem o espaço que poderiam ocupar;hoje, iniciamos mostrando como devem ocupar os espaços delas”, ressalta, assinalando que o MB  é aberto para todos.

Desafio de “concorrer” com a tecnologia:

Sobre a tecnologia,  a dirigente  destaca que é importante que ela seja aliada, não uma concorrente. “Para podermos trazer as crianças e jovens para o MB e tirá-los do celular, precisamos ter um método educativo interessante e atualizado,  por isso, precisamos nos unir com os recursos tecnológicos, só  que  utilizando de maneira saudável”, especifica.

Conexão com a natureza e com as pessoas

A divulgação na mídia local do município de Carlos Barbosa  despertou na estudante  Helena Henzel Tomasel, 13 anos,a vontade de conhecer o Movimento Bandeirante. “Até então, não tínhamos um núcleo na cidade e hoje permaneço porque criei um vínculo enorme e incrível com o grupo e com a coordenação  pelas atividades elaboradas, que nos fazem sair da rotina e receber ensinamentos que levamos para a vida”, afirma. 

A trajetória de Helena começou em 2019, quando tinha 10 anos. Nestes três anos, destaca que a conexão com  a natureza, seja em acampamentos ou em atividades, faz com que crianças e adolescentes “se sintam felizes e até especiais”. Apesar do espaço que a internet e as redes sociais ocupam na vida dos jovens, a estudante comenta que a  sociedade, hoje em dia, é muito dependente dos aparelhos eletrônicos, seja para lazer, trabalho ou até mesmo para estudar. “Há muitos adolescentes que são totalmente dependentes, que ficam conectados 24 horas por dia”, entende.  

Justamente para mudar esse comportamento, que o grupo pode ajudar. “Ficar três horas ou mais, longe das redes sociais, com jogos on-line e perto de pessoas que você ama e se sente bem, aprendendo a trabalhar em equipe (fazer fogueiras e mesa com taquara e sisal, aprender sobre a história dos bandeirantes e conversar sobre diversos assuntos e atividades físicas). É uma sensação inexplicável. É maravilhoso e você nem vê a hora passar”, descreve.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895