Cada vez mais no gosto do público

Cada vez mais no gosto do público

Sucesso da etapa de Porto Alegre do STU National, na semana passada, indica que a curva ascendente do skate só aumenta

Aos 15 anos, dona de uma medalha de prata nos Jogos de Tóquio-2020, Rayssa Leal é o principal nome do skate brasileiro na atualidade

Por
Maria Clara Centeno* e Carlos Corrêa

Os termômetros nas proximidades chegavam a marcar 38ºC, mas a sensação térmica no sol escaldante era ainda maior. Mesmo assim, nada afastou o público que foi ao trecho 3 da Orla do Guaíba no fim de semana passado para assistir à segunda etapa do Skate Total Urbe (STU) National, circuito brasileiro de skate. Diante de novos ídolos do esporte olímpico no país, como os medalhistas de Tóquio-2020 Rayssa Leal e Pedro Barros, as arquibancadas lotadas comprovam que a modalidade definitivamente caiu no gosto do público brasileiro.

Logo na estreia do skate no principal evento esportivo do mundo, o Brasil conquistou três medalhas e revelou um carisma que, mesmo dois anos após o fim dos Jogos Olímpicos, continua contagiando o país. Yndiara Asp, skatista que competiu em Tóquio na categoria park, credita isso à magia da modalidade: “O skate ensina tanto para gente sobre a vida, sobre se relacionar, sobre não desistir e a gente conseguiu mostrar isso na Olimpíada”.

Pâmela Rosa, dona de dois títulos mundiais no street, destaca que Tóquio foi uma oportunidade de evidenciar a “vibe” da modalidade ao público. “Mostramos que o esporte é leve, estávamos ali para nos divertirmos acima de tudo, então acho que foi isso que fez as pessoas abraçarem e teve uma visibilidade muito grande”, comenta.

Além do carisma da modalidade, a febre do skate brasileiro tem nome e sobrenome: Rayssa Leal. Com 15 anos e um currículo repleto de títulos e medalhas, a vice-campeã olímpica possui mais de seis milhões de seguidores no Instagram e é uma verdadeira celebridade. Na etapa do STU em Porto Alegre, o público vibrava com as suas manobras. Crianças de projetos sociais que acompanhavam o campeonato gritavam o seu nome e tiravam fotos com ela. Gui Khury, 14 anos, mais jovem medalhista de ouro do X Games e participante do torneio na Orla, diz que a Fadinha inspira muitas pessoas a irem para as pistas e, inclusive, o motiva a competir melhor.

Esse “efeito Rayssa” aparece também quando se vê um maior número de meninas andando de skate e a modalidade crescendo exponencialmente pelo país. Além dela, profissionais como Gabi Mazetto, campeã do STU Porto Alegre no street, e as olímpicas Pâmela Rosa, Letícia Bufoni, Dora Varella e Yndiara Asp levam o skate feminino brasileiro pelo mundo. Para Yndiara, a modalidade feminina foi a verdadeira protagonista da última Olimpíada. “É muito legal de ver, porque era algo que precisava de uma atenção maior, já que o feminino começou um pouco depois do masculino e, muitas vezes, não era incentivado ou até proibido”, completa a atleta, que também esteve nos Jogos de Tóquio-2020.
*Sob supervisão de Carlos Corrêa

Espírito de amizade impera nas disputas

A cena foi recorrente ao longo de todo o final de semana. Enquanto cada atleta apresentava suas manobras ao público e aos juízes no STU, os demais skatistas disputavam uma nesga de sombra perto das grades. Nesses poucos metros, também aplaudiam com um sincero entusiasmo cada acerto feito na pista. Pode parecer algo trivial, mas está longe de ser. Você consegue imaginar, por exemplo, um jogador de futebol aplaudir e cumprimentar um rival por um drible ou um gol? Ou uma ginasta comemorar o desempenho do adversário? Mesmo em modalidades do atletismo em que os competidores se conhecem e não há um clima de rivalidade, ainda assim, é possível se ver apoio, não torcida. No skate é diferente. Os skatistas, na sua imensa maioria, realmente torcem uns pelos outros. E talvez isso seja um dos fatores pelos quais o esporte tem amealhado tantos novos fãs.

“O skate veio da rua e na rua é sempre assim. Quando você está no pico e têm outras pessoas também, está todo mundo torcendo para você acertar. O skate é uma família muito grande, uma comunidade muito grande. Todo mundo quer o pódio sempre, claro, mas também todo mundo torce uns pelos outros”, afirma Rayssa Leal. A própria Fadinha é um bom exemplo. Nos Jogos de Tóquio, a cada apresentação, ia direto abraçar Letícia Bufoni, outra estrela do skate nacional, e que ali também não deixava de ser concorrente por uma medalha.

Aos 22 anos, Augusto Akio foi campeão do mundo em fevereiro, na categoria park. Na Capital, ele lembrou que a modalidade transcende o lado competitivo. “Rola muito um encontro de pessoas que compartilham as mesmas ideias. Existe muita empatia de um com o outro. E isso acaba fazendo o cenário nacional muito forte”, afirma o Japinha, como também é conhecido. Ele lembra ainda como na modalidade as disputas em si ficam em segundo plano. “A grande parte dos praticantes de skate se encontram no skate. Eu estou despontando nas categorias de base desde os 11 anos. Era de fato o que eu gostava de fazer, me ajudou muito a interagir com as outras pessoas. Eu era muito introvertido antes e a minha comunicação melhorou muito”, revela ele, que na etapa de Porto Alegre do STU National ficou em segundo lugar. E comemorou.


Clima de companheirismo e torcida mútua permeia não apenas as entrevistas dos atletas, como também o comportamento deles durante as competições, como o STU National | Foto: Alina Souza

Estilo com praticidade

Além das manobras que impressionam, o estilo dos skatistas também chama a atenção de quem observa a competição. Os atletas tentam conciliar roupas que facilitem – ou ao menos não dificultem –, os movimentos e, ao mesmo tempo, sejam expressivas e mostrem a identidade da modalidade. Muitos inclusive são patrocinados por marcas, sejam as tradicionais fornecedoras esportivas, que estão em outras modalidades como o futebol, ou empresas específicas do segmento.

Camisas, bermudas e calças largas e bonés, além de tênis apropriados para a prática são quase um padrão para os homens nas pistas e, com algumas variações, também são utilizados pelas mulheres. “Eu gosto de estar o mais bem possível. Até é engraçado, gosto de estar sempre maquiada e arrumada, é o meu estilo desde criança. Gosto de mostrar que também ali no momento da competição eu posso ter a minha vibe”, conta Pâmela Rosa.

Mesmo com o calor de mais de 38ºC em Porto Alegre, muitos atletas usavam calças, manga comprida e até gorros para disputar o STU. Yndiara Asp diz que, além da questão estética, algumas peças servem enquanto proteção. “Eu gosto de andar de calça, porque eu me sinto mais protegida, se eu for cair não vou ralar minha perna e o skate não vai bater na minha canela, mas varia muito de pessoa para pessoa, cada um usa o que preferir”, explica a atleta.


‘Eu gosto de andar de calça, porque eu me sinto mais protegida. Se eu for cair não vou ralar minha perna’, diz Yndiara Asp | Foto: Alina Souza

Correio do Povo
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