Constituição completa 35 anos com o texto que consagrou a cidadania no país

Constituição completa 35 anos com o texto que consagrou a cidadania no país

Carta magna brasileira de 1988 definiu novos princípios para a construção do futuro do Brasil

Por
Mauren Xavier, Flávia Simões* e Carlos Corrêa

O Brasil começou a escrever uma nova história naquele 5 de outubro de 1988. Até então, a promulgação de um documento nunca tinha sido tão celebrada não só em Brasília, mas em todos os cantos do país. Aguardada, ansiada, almejada, lutada. Afinal, era a partir dessa carta que, por meio das decisões de seus 559 constituintes, ao longo de 19 meses, estabelecia os novos princípios que iriam nortear a sociedade brasileira. Representava em cada uma das suas linhas o pacto civilizatório. Uma carta sem referência, ao contrário das anteriores.

Em um país ainda marcado pelo regime autoritário, a Constituição projetava o futuro, como bem está representado nos artigos que se referem à defesa dos direitos de cada um dos cidadãos de manifestar a sua vontade política, mas também de escolher os seus governantes por meio do voto direto e secreto. Ou ainda pela garantia do acesso à saúde pública, até então tão limitada, e às condições de prevenção às doenças, e à educação. Mas não parou por aí. Estando à frente do seu tempo, ela foi a terceira Constituição do mundo a reservar um capítulo específico para o meio ambiente. Os olhos, neste caso, estavam virados para as futuras gerações. “Era o espírito de um novo tempo. O país passava a escutar uma população que estava emudecida, ou melhor, invisibilizada”, recorda a diretora da Ufrgs, Claudia Lima Marques.

'Não é a Constituição perfeita, mas será útil, pioneira, desbravadora. Será luz, ainda que de lamparina, na noite dos desgraçados'

Perfeita? Com certeza não. Inclusive o próprio presidente da Assembleia Nacional Constituinte (ANC), Ulysses Guimarães, enfatizou durante o seu discurso da promulgação. “Não é a Constituição perfeita, mas será útil, pioneira, desbravadora. Será luz, ainda que de lamparina, na noite dos desgraçados. É caminhando que se abrem os caminhos. Ela vai caminhar e abri-los. Será redentor o caminho que penetrar nos bolsões sujos, escuros e ignorados da miséria”, disse ele, que viria a falecer quatro anos depois.

Apesar dos avanços, desafios se fazem presentes, especialmente quando se trata dos direitos previstos. Por exemplo, nela está previsto que o salário mínimo deveria atender às necessidades das pessoas. Na prática, está longe disso. Assim, aponta o professor de Direito Constitucional Darci Guimarães Ribeiro, não adianta ter uma carta que garante direitos e que na prática não são cumpridos pelo Estado. Para tal, reforça a necessidade do fortalecimento das instituições para fazer frente aos desafios.

Promulgação da nova Constituição foi o ápice dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte / Crédito: CP Memória

É verdade que a Constituição não passou imune às transformações da sociedade, que não foram poucas, ao longo desses 35 anos. Um exemplo é o número de emendas constitucionais que foram aprovadas e acrescidas ao texto. Desde a promulgação, a Constituição recebeu 131 emendas regulares, além das seis emendas aprovadas durante a revisão de 1994 e seis tratados internacionais sobre direitos humanos. O número é considerado elevado na comparação com os textos de outros países.

As propostas para promover alteração ao texto, apesar de ter um processo mais rígido no Congresso Nacional, dependendo de quórum ampliado e votações em dois turnos nas duas Casas, dividem opinião. Enquanto um grupo defende a atualização da carta para seguir as transformações sociais; outros consideram excessiva e até alertam para o risco de distorções. “Na minha opinião, as mudanças da Constituição podem ser perigosas no momento em que não há diálogo entre os parlamentares”, ressalta Claudia.

 

* Sob supervisão de Mauren Xavier e Carlos Corrêa

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895