Dengue se espalha pelo Rio Grande do Sul

Dengue se espalha pelo Rio Grande do Sul

Casos da doença, disseminada pelo Aedes Aegypti, se espalham também pelo Brasil e preocupam diversas regiões. No Estado, o município de Encantado detém mais de um terço de todas as ocorrências confirmadas

Por
Fernanda Bassôa

Dos 454 municípios do Rio Grande do Sul que possuem notificações ou casos confirmados de dengue, a cidade de Encantado, no Vale do Taquari, é a campeã de maior incidência da doença no Estado. Com 790 confirmações para a doença, 978 notificações e 12 casos em investigação, a soma de pessoas positivadas para a dengue na cidade de um pouco mais de 22 mil habitantes equivale a quase um terço (30,8%) do número total de todo o Estado, que atualmente registra 2.560 confirmações, fato que tem gerado preocupação e colocado as autoridades de saúde em situação de crescente alerta. Das 48 pessoas internadas por dengue em todo o Rio Grande do Sul, nove estão internadas em Encantado. O Estado gaúcho ainda contabiliza 7.979 notificações e outros 2.451 casos em investigação, segundo levantamento da Secretaria Estadual da Saúde até essa sexta-feira. 

O primeiro caso foi confirmado no Município em 23 de janeiro e a partir daí os números não pararam de crescer. A secretária de Saúde, Meio Ambiente e Assistência Social, Clarissa da Rosa Pretto Scatolla, conta que inicialmente os primeiros registros surgiram no bairro Lago Azul, localidade que hoje soma mais de 200 positivados. “É um bairro onde tem muitas empresas, com entrada e saída de caminhões. O primeiro registro veio de fora, como sempre acontece. E partir dele, começou a contaminação. Nunca perdemos o controle da situação. Ao contrário, o município optou por testar as pessoas para que pudéssemos ter um diagnóstico e, confirmado o diagnóstico, agir de imediato naquela situação. A partir da notificação, com a testagem rápida, sabemos exatamente onde tem os casos e de que forma agir. Isso é transparência”, disse a secretária, garantindo que o município está fazendo um controle efetivo, mantendo o comando real da situação e atuando em pontos estratégicos.

Características da doença

  • O QUE É

Doença febril causada por vírus, caracterizada principalmente por febre alta de início rápido. Dengue é uma palavra espanhola que significa “manha” ou “melindre”, características que o doente costuma apresentar devido ao mal-estar. 

  • CAUSA

A dengue é causada por vírus (DENV) do gênero Flavivirus, família Flaviviridae, e possui quatro sorotipos: DENV1, DENV2, DENV3 e DENV4. 

  • TRANSMISSÃO

A principal forma de transmissão é pela picada da fêmea infectada do mosquito Aedes aegypti. Outras formas menos comuns são por meio de transfusão de sangue ou da gestante para o bebê. Não há transmissão por contato direto com um doente. 

  • TEMPO DESDE A PICADA ATÉ TER OS SINTOMAS 

Leva de 3 a 15 dias para começar a ter sintomas, com média de 6 dias. A pessoa fica com o vírus no corpo, em fase chamada de viremia, e este período começa um dia antes do aparecimento da febre e vai até o quinto dia da doença. Nessa fase, se uma fêmea do Aedes aegypti picar uma pessoa doente, ela vai ingerir o vírus juntamente com sangue, e vai demorar de 8 a 12 dias para que consiga transmiti-lo. Depois disso, o mosquito transmite até o fim da vida, que pode chegar a 45 dias. 

  • SINTOMAS 

Febre alta (39°C a 40°C) com duração de dois a sete dias, dor atrás dos olhos, de cabeça, no corpo, nas articulações, mal-estar geral, náusea, vômito, diarreia, manchas vermelhas na pele com ou sem coceira. Os sinais podem agravar, ocasionando o extravasamento de plasma e/ou hemorragias que podem levar a pessoa ao choque grave e morte. Todos os indivíduos estão expostos à dengue, mas alguns fatores de risco, como idade, etnicidade e comorbidades podem determinar a gravidade da doença. Também, se a pessoa já teve dengue, ao ter a doença novamente, as chances de gravidade aumentam. As defesas do organismo reagem ao sorotipo do vírus da dengue com o qual foram infectados e não protegem para os demais, ou seja, a imunidade é permanente somente para um mesmo sorotipo viral. 

  • O QUE FAZER 

A pessoa deve procurar um serviço de saúde, ingerir muita água e evitar uso de medicamentos por conta própria. O serviço médico fornecerá as orientações necessárias para cada caso. É importante: repouso, passar repelente corporal (para evitar que o mosquito se infecte), usar roupas que cubram braços, pernas e pés (diminuindo áreas disponíveis para o mosquito) e utilizar mosquiteiro. 

  • DIAGNÓSTICO 

O diagnóstico deve levar em consideração as questões clínicas e epidemiológicas, como, por exemplo, se o local de moradia ou trabalho é infestado pelo mosquito e/ou se existem outras pessoas com dengue na região. Os exames laboratoriais são auxiliares na investigação e não é necessário saber o resultado para iniciar tratamento. 

  • TRATAMENTO 

Não existe tratamento específico para dengue, o manejo das pessoas doentes é realizado de forma a reduzir dores, febre e auxiliar na reposição de líquidos. Em muitos casos, é necessário aplicar soro na veia para reidratação. A dengue pode levar à morte. 

  • PREVENÇÃO 

A principal forma de evitar a dengue continua sendo evitar a picada do mosquito e eliminar potenciais criadouros. O inseto se reproduz em locais com água parada, por isso, algumas das recomendações são eliminar água parada dos pratinhos e vasos de plantas, manter caixas d’água com tampas, colocar tela nos ralos de água da chuva, secar pneus e protegê-los da chuva, limpar calhas das residências, escovar os pratos e trocar a água dos pets (uma vez por semana) e manter piscinas limpas e com água tratada.

Aumento de casos preocupa moradores de Encantado

O casal Pedro Alves de Lima e Nelci da Cruz de Lima, moradores do Lago Azul, ainda seguem bastante preocupados com o crescimento dos casos não apenas no bairro, mas em todo município de Encantado. A neta de apenas 10 anos de idade pegou dengue e faltou aula por mais de três dias. “Ela teve febre e moleza nas pernas. Precisava de ajuda até para tomar banho. Fizemos o teste e deu positivo. Se todos se preocupassem em limpar e cuidar o seu pátio, evitaria que o mosquito se espalhasse e a doença também”, disse Pedro. 

Segundo a secretária de Saúde, as equipes trabalham incansavelmente todos os dias. São 26 agentes de saúde e quatro agentes de endemias que, juntos, se dividem em sete ou oito grupos, de acordo com a demanda, realizando mutirões domiciliares. “Chamamos varreduras, que acontecem pela manhã e à tarde, em dois blocos. O pessoal vai para a rua bem cedo, faz a varredura em um raio de 150 metros do caso confirmado e busca eliminar o maior número de criadouros. Os agentes entram nos pátios, com o consentimento dos moradores, verificam vasos, tonéis, piscinas e todo tipo de recipiente que pode ser usado pelo mosquito. Passam orientações. Depois disso, no horário da inversão térmica, se faz a aplicação do produto para matar o mosquito adulto, voando.” 

Proprietário de uma mecânica que recebeu a visita das agentes de saúde, Rogério Luiz Buffet disse que é interessante o trabalho desenvolvido pelas equipes de campo. “Cada um tem a sua responsabilidade em evitar a doença. É importante a visita das agentes na medida em que cobram e fiscalizam uma ação mais eficaz da população. Elas estão fazendo seu trabalho, cabe a nós fazermos a nossa parte.” 

Clarissa ressalta que hoje o melhor método para erradicar a doença e o mosquito é, sem dúvida, a eliminação dos criadouros. “Quando são identificados criadouros nos imóveis, os moradores são notificados. Eles têm um prazo de 24 horas para sanar o problema. Caso contrário, ele é multado.” Segundo ela, ainda não houve situações de multas, mas a secretária contabiliza uma média de 10 notificações por dia. “As pessoas têm que se conscientizar que devem eliminar a água parada, onde o mosquito deposita seus ovos.

Precisam entender que qualquer local pode ser um recipiente de criadouro. Saquinho plástico, sacola de mercado, potes. É preciso estar atento e cada um fazer a sua parte. O uso de repelente, neste momento, também é fundamental para evitar a propagação da doença.” O sistema de ouvidoria da prefeitura, só no mês de março registrou 100 demandas de dengue. A secretária comenta que existem denúncias infundadas, mas garante que todas exigem atenção e fiscalização das equipes. 

Clarissa lembra que a descrição de todo este cenário causa reflexos nos postos de saúde e no hospital, com muita procura por atendimento. “Nossa orientação é sim procurar atendimento médico. De acordo com o protocolo, a pessoa é diagnosticada com dengue através do teste e a partir daí é monitorada pelas equipes de Vigilância Endêmica, através de ligações telefônicas e WhatsApp.” A entrada e a saída de pessoas na rede de saúde do Município com visíveis sintomas de dengue têm sido corriqueira. 

Na Unidade de Saúde do Centro, Gabriel André Chanan, 39 anos, morador da área central, aguardava a sua vez na fila para fazer o exame. “Estou há dois dias ruim. Me sentindo fraco, com dores no corpo, na cabeça e com pouca fome. Sinto um cansaço e tenho manchas na pele.” Junto dele, na mesma fila, o morador do bairro Porto Quinze, Leandro Herrera, 28 anos, apresentava sintomas semelhantes. “Tenho febre, entre 37 e 38 graus, dores no corpo e pouca fome. Vim fazer o teste porque estou passando muito mal. Tenho dores horríveis atrás dos olhos.” Infelizmente para nenhuma surpresa da equipe médica, os dois testes positivaram para a dengue.

Há falta de inseticidas no país 

Foi enviado aos Estados, até 2 de janeiro de 2023, 96.020.000 pastilhas de larvicida para o tratamento de recipiente e depósitos de água. Neste período, foram distribuídos 7.485 quilos do inseticida para o tratamento residual em pontos estratégicos (como borracharias, ferros-velhos, etc.). E para aplicação espacial foram direcionados 225.150 litros do produto específico. 

Porém, há falta de estoque para a atual demanda. Assim, o Ministério da Saúde tem atrasado o envio de inseticidas contra o Aedes Aegypti, mosquito transmissor da dengue, da chikungunya e da zika. A escassez do insumo, o atraso no repasse desde o ano passado e a alta de casos em vários pontos do país preocupa. Contratos foram refeitos na atual gestão, mas a previsão de entrega é demorada, por se tratar de compras internacionais. A situação de quatro Estados, onde há condições climáticas mais favoráveis à reprodução do mosquito, preocupa mais: Espírito Santo, Minas, Tocantins e Santa Catarina. Até o fim de fevereiro, segundo o Ministério da Saúde, o Brasil teve alta de 46% nos casos de dengue e de 142% nas infecções por chikungunya na comparação com o mesmo período do ano passado. Em nota técnica da Coordenação-Geral de Vigilância de Arboviroses de 3 de março, o ministério informou aos municípios e estados que o processo de aquisição de um dos fumacês, o Cielo-UVL (Praletina + Imidacloprida), estava na fase final de contratação, com expectativa de recebimento do insumo nos próximos 45 dias. O atraso nos cronogramas, enfrentado desde 2022, é reflexo de dificuldade global de aquisição do produto. A nota explica ainda que, diante dos percalços, optou-se por incluir um novo adulticida para uso em UBV (equipamento que nebuliza o inseticida), o Fludora Co-Max (Flupiradifurone + Transflutrina), para evitar a dependência de um fornecedor único. 

Esforço no combate à dengue

A previsão, de acordo com a secretária Clarissa da Rosa Pretto Scatolla, é que em abril o ambulatório da Unidade de Saúde do Centro se transforme em ala exclusiva para pacientes com dengue. “Queremos montar uma sala de soroterapia, com três camas e três poltronas para aplicação de soro. Nossa intenção é agilizar o processo de hidratação e desafogar o hospital. Vamos trazer os pacientes aqui para a atenção básica. Se o paciente não melhorar, será feito o encaminhamento para o hospital porque aí é caso de internação.” A dica de hidratação é dois litros de água, sais minerais e isotônico. “Soro caseiro. A ingestão de líquido é fundamental para que o quadro do paciente não piore.” 

Diante do agravo da situação e do crescente número de contaminações e notificações, o Comitê de Crise – criado na época da pandemia – foi remanejado para focar as ações no enfrentamento à dengue. Dentro da prefeitura, foi montada a Sala de Crise, onde se planeja e se criam estratégias de ação de campo. “A gestão de Encantado está fazendo tudo que está dentro do protocolo do Ministério da Saúde, todas as ações que o Estado solicita são realizadas. Muitas pessoas estão se dando conta do problema, outras não. Precisamos reduzir o número de mosquitos contaminados para que a gente consiga diminuir a infestação da doença na cidade.” O biólogo da 16ª Coordenadoria Regional da Saúde, Bruno Cappelari, que tem acompanhado de perto o trabalho em Encantado, diz que desde que foram identificados os primeiros casos, as equipes têm intensificado as ações de campo. “Os mutirões têm visitado o maior número de imóveis possíveis e têm atuado com duas fretes. Na eliminação do criadouro, para acabar com as larvas e ovos, e na tentativa de matar o mosquito adulto. A rotina é eliminar as larvas, porque se não há larvas, não há mosquito adulto.” 

O prefeito Jonas Calvi garante que a situação está sendo enfrentada com muita responsabilidade. “Notificamos todos os casos, trabalhamos com informação para conscientização da população, reforçamos mídia tradicional e redes sociais, distribuímos repelentes, cloro, realizamos varredura com a equipe das agentes de saúde e endemias, as equipes do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS) estão conosco também. Temos o apoio e a confiança da Secretaria Estadual da Saúde, que tem validado as nossas ações. E os casos tem diminuído em relação ao mês anterior. Temos confiança na reversão da situação. Para tanto, aprovamos lei municipal que amplia o número de agentes de saúde e endemias.” 

O projeto de lei que cria empregos de agentes comunitários de saúde e empregos de agentes de combate às endemias foi encaminhado em 9 de março à Câmara de Vereadores e aprovado no dia 20. O prefeito sancionou a Lei 4.953/2023, no dia 21. Com a alteração proposta e aprovada, a Lei 4.953, que alterou a Lei 3.280, contempla, agora, 40 agentes comunitários de saúde e 10 agentes de combate às endemias como forma de reforçar as ações de enfrentamento à dengue.

Prevenção e eliminação de criadouros 

A secretária Estadual de Saúde, Arita Bergmann, reconhece que o município do Vale do Taquari teve aumento expressivo de casos de dengue em 2023, mas garante que a administração de Encantado está bem orientada e assessorada pelas equipes do Estado, que têm prestado todo suporte necessário quanto às ações de prevenção da doença e eliminação dos criadouros do mosquito. “A população precisa se comprometer em eliminar os potenciais criadouros do mosquito. É preciso cuidar do seu pátio, do seu entorno para que o mosquito não se procrie, para que não encontre ambiente favorável para se proliferar. Antes de eliminar o mosquito, é preciso evitar que a fêmea coloque seus ovos e que as larvas se espalhem. Os moradores não podem descuidar mantendo potes com água parada, caixas d’água sem tampa, ralos sem tela e acúmulo de lixo. É preciso a união da comunidade para que haja preservação do ambiente em que se vive. Só assim vamos enfrentar a doença.” 

Arita diz que foi feita toda orientação técnica e logística, não apenas no município de Encantando, mas em todas as cidades do Estado no combate e enfrentamento do mosquito Aedes Aegypti. “Bloqueio dos casos justamente para evitar a multiplicação dos casos. Notificações. Reforço da assistência, da rede básica. É preciso que a população leve em consideração os sintomas e tenha o diagnóstico o mais rápido possível e para isso é preciso uma equipe orientada e qualificada. Exames laboratoriais confirmatórios. Temos realizado campanhas chamando atenção para os sintomas clássicos. Cefaleia, febre, náuseas, vômitos, dor muscular. É preciso que a comunidade procure a rede, faça exames, se hidrate, beba muita água para evitar o agravamento e a hospitalização.” 

O diretor adjunto do Centro Estadual de Vigilância em Saúde da SES, Marcelo Vallandro, explica que a dengue é uma doença complexa e que as equipes têm trabalho em vários eixos. “O uso da inseticida vai eliminar o mosquito adulto, mas isso é apenas uma ação pontual, uma ação complementar. Não resolve o problema. Para realmente cortar a circulação do Aedes é preciso evitar os criadouros erradicando os ovos e as larvas, pois é ali que eles se multiplicam, é ali que acontece a proliferação do mosquito. Esta é a ação mais importante. Precisamos trabalhar na prevenção. Precisamos interromper este ciclo.”

No ano passado, 66 mortos

Em 2022, o RS registrou seus maiores índices relacionados à dengue de toda a série histórica, segundo a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann. Foram mais de 57 mil casos autóctones, outros 11 mil importados (contágio fora do Estado) e 66 óbitos. 

Neste ano, o Laboratório Central do Estado (Lacen) confirmou o primeiro óbito por dengue do RS, em 16 de março. Trata-se de uma mulher de 49 anos, residente em Bento Gonçalves. 

O combate à dengue no RS teve este ano investimento extra por parte da Secretaria Estadual da Saúde. Um repasse de R$ 5,5 milhões foi destinado em fevereiro aos municípios para utilização em manutenção e estruturação das ações das equipes de Saúde da Família e das Unidades de Saúde da atenção primária do SUS. 

Em Porto Alegre, que está entre as 10 cidades com maiores índices de casos de dengue no RS, o secretário de Saúde, Mauro Sparta, diz que as equipes têm atuado de forma intensiva, com aplicação do fumacê, especialmente na região leste e norte da cidade. “Temos intensificado as ações de forma mais agressiva nas comunidades do Mario Quintana, Partenon, Lomba do Pinheiro, São José e Rubem Berta.” Segundo ele, as equipes da vigilância têm atuado em conjunto com trabalhadores dos Serviços Urbanos de forma preventiva. 

Anvisa aprova primeira vacina de uso amplo contra a dengue 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou em 2 de março uma nova vacina contra a dengue, desenvolvida pela farmacêutica japonesa Takeda. O produto, batizado de Qdenga, teve eficácia de 80% nos estudos clínicos. É o segundo imunizante contra a doença a receber registro no Brasil, mas o primeiro que poderá mudar o curso das epidemias da doença. Isso porque a primeira vacina, do laboratório Sanofi Pasteur e aprovada no país em 2015, foi descartada pela maioria dos países como estratégia de prevenção por ser recomendada apenas para quem já contraiu algum sorotipo da dengue e para o público de 9 a 45 anos. Já o imunizante da farmacêutica japonesa é indicado para pessoas de 4 a 60 anos, com ou sem histórico prévio de dengue. O produto protege contra os quatro sorotipos do vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. De acordo com a Anvisa, a vacina será administrada via subcutânea em esquema de duas doses, com intervalo de três meses entre as aplicações. De acordo com a Takeda, os estudos clínicos da Qdenga tiveram 28 mil participantes, com acompanhamento de mais de quatro anos dos voluntários da última fase do estudo. Além da eficácia geral de 80,2%, o imunizante alcançou 90,4% de proteção contra hospitalizações pela doença 18 meses após a vacinação. A Qdenga é feita com vírus vivo atenuado do sorotipo 2 do vírus da dengue. 

A Anvisa destacou que o imunizante recebeu recomendação positiva da agência sanitária europeia e teve sua comercialização aprovada no continente em dezembro do ano passado. Ainda de acordo com a Anvisa, a análise técnica que embasou a aprovação da vacina contou com um painel de discussão com especialistas no tema, realizado em janeiro. A Takeda entrou com pedido de registro na Anvisa em 2021. O processo, segundo a agência, foi demorado porque foram solicitados dados complementares. Ainda não há previsão de quando a vacina estará disponível no mercado. Antes, ela precisará passar pelo processo de precificação junto à Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), que costuma durar meses. Também não é possível dizer ainda se o produto será incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) para ser oferecido em campanhas nacionais de vacinação. Para isso, uma avaliação de custo-efetividade é feita pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias, instância vinculada ao Ministério da Saúde. Dessa forma, o produto não deve estar disponível para a atual temporada de alta de casos, que tradicionalmente vai de fevereiro a abril. 

De acordo com dados mais recentes do ministério, houve aumento de 46% no número de casos de dengue neste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. A vacina do Instituto Butantan, única a entrar na fase final de estudos além dos produtos da Sanofi e Takeda, registrou 79,6% de eficácia nos testes de fase 3, conforme dados preliminares, mas só deverá ter sua pesquisa concluída e resultados finais conhecidos em 2024. 

MONITORAMENTO

Para monitorar o aumento de casos de dengue, chikungunya e zika no país, o Ministério da Saúde instalou o Centro de Operações de Emergências (COE) Arboviroses, com o objetivo de elaborar estratégias de controle e redução de casos graves e óbitos. O alerta ocorre pelo aumento dos registros dessas doenças, como os casos de dengue, que cresceram 43,8% até março deste ano, quando comparado ao mesmo período do ano passado. As notificações de chikungunya aumentaram 97%. “Identificamos crescimento em alguns estados. Já estamos enviando equipes de campo para traçar um diagnóstico da situação nessas áreas e vamos reforçar o monitoramento do cenário das arboviroses em todo o país. Nossa prioridade é sensibilizar a população, para que assim possamos controlar o avanço da transmissão dessas doenças”, destacou Alda Maria da Cruz, diretora do Departamento de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde. Com o acionamento do COE, a pasta vai monitorar a situação, com ênfase em dengue e chikungunya. O planejamento das ações será feito em conjunto com estados e municípios. 

Em 2022, entre janeiro e o início de março, foram notificados 209,9 mil casos prováveis de dengue. Em 2023, o número saltou para 301,8 mil, no mesmo intervalo de tempo, uma incidência de 141,5 casos por 100 mil habitantes. Quanto aos casos graves, foram registrados 2,9 mil. Esse número apresentou redução quando comparado ao mesmo período do ano passado, cerca de 3,8 mil registros. Neste ano, até o momento, já foram notificados 73 óbitos pela doença. Outros 64 seguem em investigação. No mesmo período do ano passado, o total de óbitos foi de 172. 

A região com maior incidência de dengue em 2023 é a Centro-oeste, com 254,3 casos por 100 mil habitantes, seguida das regiões Sudeste, com 214,7 casos por 100 mil habitantes, e Sul, com 98,2 casos por 100 mil habitantes. O Espírito Santo foi o estado que mais apresentou aumento nos coeficientes de incidência, com 921,7 casos por 100 mil habitantes, seguido do Mato Grosso do Sul, com 432,5 casos por 100 mil habitantes, e de Minas Gerais, com 392,1 casos por 100 mil habitantes.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895