Dois a três anos para voltar ao normal

Dois a três anos para voltar ao normal

A Lagoa do Peixe, entre Mostardas e Tavares, no litoral gaúcho, viveu uma seca histórica em fevereiro deste ano e a segunda estiagem em dois anos.

Por
Rodrigo Thiel

Cerca de oito meses depois de uma seca histórica – a segunda em dois verões –, a retomada do nível na Lagoa do Peixe, entre Mostardas e Tavares, permite que pescadores voltem a tentar tirar seu sustento do local. De acordo com o chefe do Parque Nacional da Lagoa do Peixe, Riti Soares, a chuva dos últimos meses tem contribuído. “O nível da lagoa está normalizado. Os pescadores estão exercendo suas atividades normais.”

Esta situação de volta da normalidade na Lagoa do Peixe, um dos símbolos do litoral gaúcho, contrasta com a realidade vivida entre fevereiro e março deste ano. À época, a seca foi tanta que cerca de 90% da água evaporou, justamente no período da safra do camarão rosa, um dos principais sustentos das famílias de pescadores da região. Dos 201 profissionais cadastrados na Colônia de Pescadores Z11, que atua na lagoa, são 154 de Tavares e outros 47 de Mostardas.

Entretanto, o presidente da colônia, Jair Joaquim Lucrécio, diz que, apesar do retorno do nível normal da água, as condições da Lagoa do Peixe ainda vão demorar para se tornarem ideais para a pesca e, consequentemente, para o sustento destas centenas de famílias. “A lagoa quando seca mata tudo. Isso afeta muito. Para recuperar peixes, siri e tudo mais, vai levar, no mínimo, uns dois ou três anos para volta ao normal”, destacou.

Lucrécio comentou também a situação dos pescadores da colônia durante o período da seca e os impactos da catástrofe climática. “O pessoal que vive da pesca precisou se virar de outra forma. As coisas ficaram muito difíceis, mas o pessoal é obrigado a sobreviver. Tem gente que teve dívidas, outros foram se apertando. Houve alguns até que venderam a rede que usam para sobreviver. Isso é um impacto muito grande. Agora esperamos que dê uma melhora. A experiência da gente diz que vai dar uma safra boa de camarão e esperamos que isso ajude.”

O pescador Gilmar Copelo Brum, de 64 anos, faz quase que diariamente 34 km de ida e volta de sua casa até o ponto da Lagoa do Peixe onde costuma pescar. Também conhecido como “Alemão”, ele começou na atividade aos 12 anos e lamentou as perdas do último verão. “Este último ano era para ser uma das melhores safras de pesca de camarão da história se não fosse a seca. Tinha muito camarão, de todos os tipos. E morreram toneladas de camarão, linguado, tainha e muito mais.”

Alemão conta que possui oito redes de pesca e que 70% da sobrevivência de sua família é derivada deste setor. Apesar das perdas, o pescador está na espera de ótimos resultados nos próximos meses. “Teremos um verão bom, sem seca e com safra boa. Já tem alguns camarões na lagoa. Acredito que a partir de dezembro já começaremos a pescar.”

Ele conta que atualmente está trabalhando na pesca de peixe-rei. Apesar de a chuva ter ajudado a elevar o nível das águas, os dias com fortes ventos impedem que os pescadores possam ter melhores resultados com suas redes. “Alguns dias atrás pesquei 23 kg de peixe-rei. Mas não faz dois meses, eu pescava quase 70 kg todos os dias.”
Apesar da seca, o Instituto Chico Mendes de Conservação de Biodiversidade (ICMBio), que administra o Parque da Lagoa do Peixe, afirma que não houve queda de visitantes. Em nota, a ICMBio ressalta que há um esforço conjunto para “buscar soluções para minimizar os danos da seca”. O Parque conta com apoio de universidades e dos Centros de Pesquisa do próprio ICMBio para desenvolver ações voltadas a emergências ambientais. 

Recuperação já começou

Aos olhos dos visitantes, a Lagoa do Peixe já voltou a proporcionar paisagens de tirar o fôlego. Na imensidão das águas doces, aves de inúmeras espécies passeiam tranquilas, em um cenário composto pelo azul do céu e o branco das areias das dunas, ao som do vento forte e o canto dos pássaros. Um cenário de contraste absoluto à devastação registrada poucos meses antes. O Parque Nacional da Lagoa do Peixe foi criado em 1986 com o objetivo de proteger as espécies de aves migratórias e as amostras dos ecossistemas litorâneos do Rio Grande do Sul. A visitação é gratuita e oferece uma experiência única. Localizada em Mostardas, o acesso partindo de Porto Alegre ocorre pela ERS 040 e, após, pela BR 101. É possível contratar passeios particulares para visita guiada, mas aos que possuem perfil aventureiro, a ida com carro particular é uma alternativa igualmente segura. Também é possível cavalgar pelas áreas, agora novamente, alagadiças. 

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895