O futebol vegano do Laguna

O futebol vegano do Laguna

Clube do Rio Grande do Norte adota o veganismo como filosofia e propõe encarar o futebol para além da busca por resultados

Apesar da filosofia do clube incentivar a adoção do veganismo, os atletas do Laguna não precisam necessariamente seguir o cardápio sugerido e oferecido pelo time. Em termos esportivos, a meta é alcançar a primeira divisão do Campeonato Potiguar no ano que vem

Por
MARIA CLARA CENTENO*

Um time de futebol profissional em que tudo é vegano: alimentação dos jogadores, uniformes, produtos de limpeza, suplementação e lanches vendidos para a torcida no estádio. Esse é o Clube Laguna SAF, de Tibau do Sul, no Rio Grande do Norte, o primeiro time do Brasil adepto ao veganismo. Fundado por Gustavo Nabinger, Deia Nabinger e Rafael Eschiavi em abril de 2022, disputa a segunda divisão do campeonato potiguar e é inspirado no Forest Green, da Inglaterra, que segue os mesmos princípios.

“Os veganos tentam excluir, na medida do possível, todas as formas de exploração e crueldade contra animais, seja na alimentação, vestuário ou em qualquer outra finalidade”, explica a nutricionista esportiva Marina Branco. Ela complementa que o veganismo é uma filosofia de vida para quem o adota, não estando somente ligado à alimentação.
Gaúcho de Porto Alegre, Gustavo foi jogador e treinador de categorias de base, passando pelo comando de equipes como Figueirense e Guarani. Vegetariano desde 2003 e vegano há três anos, tinha o sonho de ter um clube de futebol que expressasse aquilo que acredita no esporte. “Ser vegano foi uma consequência, já que eu e a Deia somos e o Rafael se tornou vegetariano há um ano. Então, para nós não faria nenhum sentido ter uma empresa que não fizesse aquilo que a gente acredita”, afirma ele. Além do pensamento contra a exploração animal, o Laguna se propõe a valorizar o entretenimento como valor fundamental do esporte, envolvendo a comunidade e fazendo de cada jogo um espetáculo, com inspiração no que é feito nos EUA.

Duas chefs especialistas em cozinha vegana, Mirna Ribeiro e Ca Botelho, foram contratadas para treinar as cozinheiras que preparam as refeições dos jogadores e montam o cardápio. Uma equipe de nutricionistas, oferecida em parceria com a Sociedade Vegetariana Brasileira, também presta suporte ao Laguna. Gustavo explica que há uma dificuldade de fornecimento de alguns produtos, tanto por questões logísticas de entrega em Tibau do Sul, localizada a 77 quilômetros de Natal, quanto por não estarem disponíveis nem na capital potiguar.

Os jogadores não precisam necessariamente ser adeptos ao veganismo para serem contratados, nem são obrigados a seguir o cardápio fora do clube. “Infelizmente, temos poucos atletas veganos no Brasil, especialmente no futebol”, diz Gustavo. No entanto, ele ressalta que isso não é um problema para as contratações. O mesmo pensamento ocorre em relação aos produtos que ainda não estão amplamente disponíveis em Tibau do Sul: “É uma oportunidade de levar para um lugar em que ele tem muita possibilidade de crescimento”.

Em 2022, o Laguna foi vice-campeão da segunda divisão potiguar. Para o ano que vem, o clube espera conseguir o acesso à elite estadual. Para tanto, precisa ser campeão. De quebra, quer aumentar a participação em projetos sociais e ambientais.

Dieta vegana pode trazer benefícios

O Laguna segue o veganismo por princípios, mas o fundador, Gustavo Nabinger, diz que existem benefícios no rendimento dos atletas, que são um “efeito colateral positivo”. A nutricionista Marina Branco explica que uma dieta vegana saudável apresenta mais pontos benéficos em relação a uma onívora desequilibrada, na qual todos os grupos de alimentos são consumidos. Ela completa que, quando bem planejado, um cardápio sem alimentos de origem animal estimula o alto consumo de vegetais e frutas, garantindo uma variedade de vitaminas, minerais, antioxidantes e fibras.

Ao montar uma dieta vegana para atletas, Marina diz observar preocupações semelhantes aos onívoros. Por exemplo, o cálcio, mineral envolvido nas contrações musculares, e comumente obtido do leite animal, pode ser inserido em cardápios que seguem o veganismo através de alimentos como gergelim, aveia e nuts. O ferro, mineral importante para a performance, imunidade, transporte de oxigênio e defesa antioxidante, também possui boas fontes de origem não animal: alguns grãos, vegetais verdes escuros e beterraba.

Os atletas precisam estar atentos ao consumo de proteínas, diante do esforço muscular intenso, pois elas são importantes para uma recuperação muscular rápida e eficiente, diz a nutricionista. Por isso, em dietas veganas se destacam alimentos que possuem bons índices proteicos, como feijão, lentilha, grão de bico, soja, ervilha e amendoim.

A vitamina B12 também é um ponto fundamental para um atleta, já que interfere na imunidade, fornecimento de energia e cognição. Comumente encontrada em carnes, sua produção se dá por bactérias. A nutricionista explica que algumas pesquisas indicam que o consumo de brotos pode auxiliar na manutenção de níveis adequados, porém, é um nutriente que precisa ser suplementado com frequência pelos veganos.

Marina observa que a redução e a exclusão do consumo de alimentos de origem animal tem aparecido cada vez mais nos consultórios. Por isso, ela, que já atendeu diversos atletas nessa situação, destaca que os nutricionistas precisam estar atentos às particularidades desse público.


De acordo com a nutricionista Marina Branco, os atletas precisam estar atentos ao consumo de proteínas, que são importantes para uma rápida recuperação muscular | Foto: MATEUS BARROS / DIVULGAÇÃO / CP

*Sob supervisão de Carlos Corrêa

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895