Pêssego ganha fôlego

Pêssego ganha fôlego

Depois de três anos de frustrações, produtores consideram que safra estabiliza a atividade até 2022

Por
Cíntia Marchi

Depois de lamentarem a frustração das últimas três safras de pêssego tipo indústria, destinado à fabricação de enlatados, os produtores da Zona Sul do Estado comemoraram a recuperação da cultura no ciclo 2020/2021. Com a colheita já encerrada, a produção total deste tipo de pêssego alcançou 42 mil toneladas, 25% acima dos resultados do ciclo anterior, segundo a Emater/RS-Ascar. Embora o volume tenha ficado abaixo da média produzida em ciclos tidos como normais (de 50 mil a 60 mil toneladas), superou as expectativas iniciais dos fruticultores e da indústria, já que a largada da safra foi prejudicada por geadas tardias.

De acordo com o responsável pela área de sistema de produção vegetal na Emater Regional de Pelotas, agrônomo Evair Ehlert, além de produtividade, a sanidade e a qualidade da matéria-prima se destacaram, com uma grande quantidade de pêssegos classificados como tipo 1, de maior tamanho, o mais valorizado. O preço mínimo recebido pelos produtores foi de R$ 1,50 pelo quilo (tipo 1) e de R$ 1,30 (tipo 2). Embora reivindicassem um valor maior, de R$ 1,80 (tipo 1), os fruticultores conseguiram alguma compensação no volume, superior ao inicialmente projetado. “Este preço ajuda a manter o produtor na atividade, mas não permite que ele faça grandes investimentos”, comenta o agrônomo.

Segundo Ehlert, a maioria dos agricultores tem evitado as ampliações e optado apenas pela renovação dos pomares já existentes, dentro do necessário, recorrendo às boas cultivares desenvolvidas pela Embrapa Clima Temperado, de Pelotas.

O presidente da Associação dos Produtores de Pêssego da Região de Pelotas (APPRP), Mauro Rogério Scheunemann, diz que a área de cultivo sofreu reduções nos últimos três anos e está concentrada em pequenas propriedades. “Os grandes pomares, principalmente dentro de fazendas, praticamente não existem mais, foram ocupados pela soja”, observa. Segundo Scheunemann, embora os produtores esperassem receber mais pelo quilo da fruta, a venda da atual safra deu um novo “fôlego” à atividade e ajudará a manter estável a cultura no próximo ciclo. “O produtor conseguiu dar uma ‘respirada’, depois de três anos muito ruins”, comenta o dirigente.

Vendas estão adiantadas neste ano

Linhas industriais se modernizaram para tornar a produção mais eficiente. | Foto: Emater/Divulgação /CP

Em função dos baixos estoques do produto enlatado, consequência de safras pequenas nos anos anteriores e das boas vendas do pêssego em calda no final do ano passado, calcula-se que cerca de 30% dos pêssegos da safra 2020/2021 já tenham sido comercializados pelas fábricas processadoras.

A estimativa, feita pelo presidente do Sindicato das Indústrias de Doces e Conservas Alimentícias de Pelotas, Paulo Afonso Crochemore, é atípica. “Geralmente, nesta época, a indústria vendia muito produto das safras passadas e, neste ano, já comercializamos bastante da safra atual”, compara.

Este desempenho, destaca Crochemore, foi puxado pelo pagamento do auxílio emergencial dado pelo governo federal às famílias de menor renda, o que influenciou o consumo. A partir de agora, o fim do repasse e as incertezas quanto à retomada plena de setores como os de restaurantes e hotéis, que costumam absorver parte importante deste tipo de produto, tornam difícil a previsibilidade do mercado em 2021.

De qualquer forma, Crochemore acredita que o pêssego gaúcho continuará competitivo no mercado nacional frente aos produtos estrangeiros que, em épocas passadas, já atrapalharam bastante a cadeia produtiva do Rio Grande do Sul. O dirigente destaca que o câmbio valorizado nos últimos anos tem retraído a importação do pêssego em calda da Argentina, o maior concorrente, bem como inibido a entrada dos frutos gregos e chilenos, com menor expressão no mercado brasileiro.

Atualmente, mais de 90% da produção de pêssego em calda gaúcha é destinada para outros estados brasileiros, sobretudo São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Um volume pouco expressivo é exportado.

“Sentimos orgulho de manter a tradição do pêssego na região”

Variedade colhida na Zona Sul do Estado é vendida em latas. | Foto: Emater/Divulgação /CP

Os municípios que mais produzem pêssego tipo indústria no Estado são Pelotas, Canguçu, Morro Redondo, Piratini, Cerrito, Jaguarão, Arroio do Padre e Capão do Leão, nesta ordem. Juntos, plantam 4,9 mil hectares. Atualmente, 953 produtores se envolvem com a atividade na região. Segundo o agrônomo  Evair Ehlert, da Emater, a colheita de 76,9 mil toneladas em 2016/2017 foi a maior dos últimos anos. Atualmente, estão instaladas na região 11 agroindústrias, que, nos últimos tempos, se modernizaram para se tornarem mais eficientes. O presidente do Sindicato das Indústrias de Doces e Conservas Alimentícias de Pelotas, Paulo Afonso Crochemore, afirma que esta guinada teve que ocorrer, bem como o aumento da produtividade nos pomares, para fazer frente à concorrência dos produtos estrangeiros. Ele lembra que, nos anos 1990, o pêssego da Grécia, que era mais competitivo que o  nacional, forçou o fechamento de várias empresas na região. Entre os anos 2009 e 2012, outra crise afetou o setor, esta provocada pelas importações da Argentina. Depois disso, a cadeia local se reestruturou para sobreviver e crescer. “Sentimos orgulho de manter a tradição do pêssego na região”, acrescenta Crochemore.

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