Proteína animal na mesa natalina

Proteína animal na mesa natalina

Os encontros familiares de Natal e Ano novo trazem respiro para a indústria de processamento de carnes, que neste encerramento de 2023 pretende vender cerca de R$1,2 bilhão apenas em aves

Por
Itamar Pelizzaro

Depois de um ano em que a busca por competitividade não saiu da pauta do setor produtivo de proteína animal, a proximidade das festas de fim de ano abre uma janela de vendas e lançamento de cortes de carnes de aves, bovinos e suínos. A união de famílias nas celebrações religiosas e gastronômicas deve alavancar o consumo no período, também temperado pela injeção do 13º salário na economia. Carro-chefe de parte das ceias de Natal, o peru e outras aves natalinas tiveram reforço na produção no Rio Grande do Sul, o que deve resultar em incremento de 3% na oferta em relação ao ano passado, com volume de 60,4 mil toneladas. As projeções do segmento avícola indicam faturamento de cerca de R$ 1,2 bilhão com aves natalinas, o que deve garantir alta de aproximadamente 13% em relação ao mesmo período do ano passado.

Afetada por condições de mercado que reduziram o preço das carnes em escala global, com deflação ao redor de 11% até setembro, no acumulado de 12 meses do IPCA, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a indústria já colocou seus lançamentos nas gôndolas dos supermercados. Cada vez mais, o foco é oferecer praticidade e variedade, buscando reposição parcial dos preços.

A Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav), entidade que integra a Organização Avícola do Rio Grande do Sul, estima que a maior produção de perus e aves natalinas deve ser alcançada mesmo com reajuste de preços feitos pelas indústrias, que variam de 9,5% a 13%, em média. Tradicional no cardápio natalino, o peru deve ser comercializado por cerca de R$ 25 o quilo, enquanto outras aves ficarão ao redor de R$ 13,50 o quilo.

Conforme o presidente executivo da Asgav, José Eduardo dos Santos, o aumento de produção e de preços segue a dinâmica econômica do Estado e do país, com parcial adequação de preços, considerando o impacto dos custos e outras dificuldades.  

Este ano, o segmento precisou ser vigilante para garantir biosseguridade e evitar a entrada da Influenza Aviária de Alta Patogenicidade (IAAP) em granjas comerciais do país, único entre os grandes produtores a não ter registro na produção industrial e reconhecido como livre da enfermidade pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).  
As aves natalinas têm custo de produção mais alto, pois precisam de manejo produtivo diferenciado, têm maior consumo de rações e são oferecidas ao consumidor com embalagens especiais e adição de temperos.

Entre as gigantes do setor de proteína animal, a BRF anunciou 31 produtos em seu portfólio de comemorativos. Dona das marcas Sadia e Perdigão e uma das líderes de mercado, a companhia propaga uma visão otimista para o cenário econômico e de vendas no período festivo. A empresa afirma ter a maior operação de kits de congelados de Natal do mundo e incluiu cinco novos itens na sua estratégia comercial.  

Como novidades, a empresa apresenta pernil recheado com linguiça defumada, em versão para preparar na airfryer, para servir até cinco porções. A receita de costela suína com molho barbecue é indicada para assar na churrasqueira e servir três três porções. Para ceias menores, a torta tender com cream cheese e alho poró fica pronta em 45 minutos. Outra novidade é o cupim cozido, que conta com a especialidade da Marfrig e insere a carne bovina no portfólio da BRF. A marca Perdigão terá o Chester, que domina 53% do mercado de aves especiais e 47% do volume de comemorativos da companhia.

Pesquisa da BRF indica que 62% dos brasileiros consideram testar novidades para as confraternizações. “Até mesmo os consumidores mais tradicionais têm mesclado itens comemorativos com outros pratos, a exemplo de massas e linguiças”, afirma o vice-presidente de marketing e novos negócios da BRF, Marcel Sacco. A empresa acredita que as vendas de fim de ano serão positivas. Considerando tendência de inflação menor para o ano, a multinacional projeta alta de 9% do consumo no segundo semestre em relação ao mesmo período do ano passado. Também entram na avaliação a perspectiva de aumento de 3,5% na renda per capita em comparação ao último trimestre de 2022 e a menor taxa de desemprego em oito anos.


Além da produção que já está nas gôndolas e freezers dos supermercados, a BRF aposta na venda de kits natalinos para pequenas, médias e grandes empresas para ganhar mercado com rentabilidade. Somente essa operação envolve fábricas e 20 centros de distribuição próprios para levar esses kits a 5,3 mil municípios brasileiros em um sistema logístico multimodal que deve chegar ao final do ano com 2,9 milhões de quilômetros percorridos.

Cortes bovinos podem ter preços mais aquecidos

Embora não seja a queridinha nas festas de Natal e Réveillon, a carne bovina tambem tem espaço garantido nas festas. Este ano, a proteína é vitaminada com o apelo irresistível da queda de preços em escala global, provocada pela oferta abundante do setor produtivo. “O consumidor vai encontrar produtos de imensa qualidade nutricional, constitucional e de segurança alimentar que têm espaço crescente nas exportações para mercados de quase 200 países com rigor sanitário, com a garantia de órgãos de controle”, recomenda o coordenador da Comissão de Pecuária de Corte da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), José Fernando Piva Lobato.
Para o diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Carne do Estado (Sicadergs), Zilmar Moussalle, o ano de 2023 foi melhor do que 2022 para o setor de carne bovina. Ele enumera que houve fartura na produção e uma trajetória descendente nos preços ao longo do ano, com deflação que deve ficar em dois dígitos, conforme projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


“O varejo não repassou tanto quanto as indústrias pelas indústrias”, analisa o diretor. O aquecimento da demanda para as celebrações de fim de ano deve gerar algum incremento nos preços, tendo à frente uma incógnita em relação ao próximo ano, quando se espera maior valorização da matéria-prima.
Professor titular na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Lobato diz que os pecuaristas continuam buscando novos mercados para dar vazão à produção. “O Brasil está se tornando a despensa do mundo, com tecnologia e pesquisa aplicados a campo para contínuo aumento de produção, produtividade, qualidade e segurança alimentar”, afirma ele. A prova da qualidade das carnes bovinas produzidas no Brasil é a presença da proteína em mercados exigentes, o que não arrefece os ânimos do setor para aperfeiçoar sua performance.


Lobato entende que a produção e a produtividade pecuária têm potencial de evolução, reduzindo idade de abate dos animais jovens e agilizando a taxa de desfrute - indicador zootécnico que mede a capacidade do rebanho em gerar excedente. A melhoria contínua depende de atitudes a serem tomadas no contexto de cada produtor para a evolução dos sistemas de produção. “A produção de grãos deve ser feita em solos agricultáveis, a pecuária bovina ou ovina se manterá nos campos não cultiváveis, com adequada lotação animal, suporte nutricional e manejo em relação ao ambiente, cobertura vegetal equilibrada e genética adequada. É assim no mundo.”
Conforme Lobato, a criação de ruminantes é essencial para a manutenção da fisionomia dos campos sulinos. No Estado, segundo o professor, existem 284 mil pecuaristas, sendo 0,6% de grandes criadores (rebanho superior a 800 cabeças), 85% com até 50 bovinos de leite e de corte e 97% com até 250 bovinos.

Carne suína é tradição nas ceias

Produtores de suínos viveram ano de margens apertadas / Letícia Biesus/ Embrapa/Divulgação CP

Mas hoje a proteína, com preço competitivo em relação a outras carnes, tem participação nas refeições do consumidor brasileiro ao longo de todo o ano e não apenas nas festas de dezembro

A carne suína tradicionalmente ganha mais espaço nas celebrações de Ano-Novo, com o simbolismo de que a proteína trará sorte, afinal o suíno “fuça para frente”. Para além da superstição, o custo mais baixo em relação a outras vem consolidando a opção no cardápio dos brasileiros. “Alguns anos atrás havia comercialização e demanda mais intensas nas festas de fim de ano, mas hoje em dia a carne suína entrou comumente na culinária na dieta e no consumo das pessoas”, diz o presidente da Associação de Criadores de Suínos do RS (Acsurs), Valdecir Folador. Para impulsionar a comercialização, a indústria busca conquistar mais consumidores com embalagens e produtos diferenciados.

A expectativa é de que o consumo seja alavancado, não apenas pelo apelo da preparação de pratos especiais, mas pela circulação de mais dinheiro na economia das famílias pela entrada do 13° salário. “A demanda do produtor continua linear, não tem grandes mudanças pela questão da época do ano”, afirma Folador. Para os suinocultores, o ano de 2023 foi desafiador, com dois semestres diferentes. No primeiro, os produtores precisaram encarar custos de produção mais altos para a manutenção do rebanho, tendo o milho em alta (acima de R$ 80 a saca, chegando a R$ 95) e o farelo de soja na casa dos R$ 2,5 mil a tonelada. “O preço de venda dos suínos não teve força para reagir, o que deixou o produtor com a conta econômica no negativo”, destaca o presidente da Acsurs.

No segundo semestre, a pressão de custos foi menor e permitiu suave elevação no preço do suíno. A demanda do mercado interno e o enxugamento por conta das exportações melhorou a situação para o suinocultor em relação a 2022. “Mas não recuperou nada do que deixou de fechar até o início do segundo semestre”, ressalta. Apesar de cenário mais favorável, a Acsurs percebe que o produtor independente, que comercializa suínos fora do sistema de integração com cooperativas ou agroindústrias, apenas empatou as contas. “Ganhou alguma coisa aquele produtor classe A com a eficiência da produção. O produtor que não tem toda essa eficiência está em zero a zero”, analisa.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895