RS busca a autossuficiência energética

RS busca a autossuficiência energética

Representantes do setor se reunirão com o governo gaúcho para entregar um conjunto de demandas

Por
Karina Reiff e Thaíse Teixeira

Quase um terço da energia do RS precisa ser importada. Dependendo do momento, a demanda pode variar, mas a média, segundo o Sindienergia-RS, é de 30%, percentual considerado alto, já que o Estado tem recursos e potencial para se tornar autossuficiente e, até mesmo, exportar energia. As demandas do setor foram discutidas e reunidas durante o 3º Fórum de Energias Renováveis e todas serão levadas nesta semana ao governador Eduardo Leite. “Sabemos que o governo está tratando as energias renováveis como um setor estratégico para a transição energética. Então, estamos levando uma agenda propositiva”, disse o presidente da entidade, Guilherme Sari.

A Assembleia Legislativa, por meio da Frente Parlamentar Pró-Energias Renováveis, é parceira ao intermediar as relações entre o segmento e o poder público. O seu presidente, deputado Frederico Antunes, participou do evento, ouvindo os desafios e as sugestões. “A nossa Frente Parlamentar é convergente e busca fazer das nossas ações uma defesa daquilo que nós notamos que o segmento organizado pretende. É isso que nós estamos fazendo junto ao governo federal também.” Ele afirmou que um dos objetivos é fazer com que o potencial do RS seja reconhecido nesta área. A partir do encontro com o governador, previsto para esta semana, o deputado espera que sejam traçadas ações para resolução de gargalos.

Entre as proposições identificadas no fórum, Sari destacou a de tornar o Estado como um fornecedor estratégico de energia. A sugestão ao governo gaúcho é fortalecer o pedido por intensificação do sinal locacional, ou seja, realinhar os custos de transmissão para equilibrar a cobrança pelo uso do Sistema Interligado Nacional (SIN), fazendo com que a tarifa seja proporcional. Dessa forma, o RS e outros estados próximos dos grandes centros consumidores no Sudeste teriam vantagem ao concorrer pelo fornecimento de energia. “Não é necessária uma infraestrutura muito mais robusta, como é em lugares distantes.” 

A ideia, segundo ele, é uniformizar as tarifas em relação à proximidade do consumidor. “Como estamos mais próximos, a tarifa tem que ser menor. Queremos equivalência, ou seja, deixar os estados mais próximos da onde está a carga como estados estratégicos e competitivos para trabalhar.” Outra demanda importante é a questão dos recursos para fortalecer o segmento e a indústria, observou Sari. Tudo isso auxiliará na meta de tornar o Estado autossuficiente energeticamente em até quatro anos, utilizando basicamente fontes renováveis, como eólica, bioenergias, hídricas e solar, embora esta última não faça parte do sistema centralizado de transmissão.

O investimento em novas frentes geradoras de energias também está sendo avaliado e estruturado pelo Estado. Uma delas está na geração de hidrogênio verde, que pode servir aos setores de transporte e da indústria. Sua principal vantagem está em contribuir de forma significativa para a descarbonização da economia, visto que não emite gases poluentes durante a produção ou combustão. É considerado verde quando a eletricidade que separa o hidrogênio do oxigênio provém de fontes limpas e renováveis, como energia eólica e solar.

Conforme a secretária do Meio Ambiente e Infraestrutura do RS, Marjorie Kauffmann, diferentes regiões gaúchas apresentam condições e características para contribuir nesta nova cadeia produtiva. “Identificamos que somos capazes de produzir e transportar hidrogênio verde tanto para o Brasil como para o exterior a um custo mais atrativo que o praticado no mercado internacional.” Os locais considerados aptos a receber investimentos são Rio Grande, Giruá, São Francisco de Assis, Dom Pedrito, Uruguaiana, Vila Nova do Sul, Santa Vitória do Palmar, Mostardas, Porto Alegre, Arroio do Sal e Cambará do Sul. 

A terceira edição do Fórum de Energias Renováveis foi promovida pelo Correio do Povo e o Sindienergia-RS, com o patrocínio de AEGEA, BRDE, Badesul, Senar-RS, Famurs e CIEE-RS.

Protagonismo frente às mudanças climáticas

O apagão que afetou todo o país nos últimos dias, incluindo o Rio Grande do Sul, intensificou o debate sobre a geração e distribuição de energia. De acordo com especialistas, a diversificação de fontes ajuda a tornar o sistema mais flexível e robusto para atender emergências como a que ocorreu recentemente.

A previsão da meteorologia alerta ainda mais para a necessidade de prevenção de possíveis novos apagões nos próximos meses. O fenômeno El Niño tende a trazer grandes volumes de chuva para o Rio Grande do Sul, resultando em possíveis alagamentos, cheias de rios e até deslizamentos de terras.

Por isso, uma matriz energética diversificada é importante e o Estado pode ser protagonista nesse assunto pela disponibilidade abundante de recursos. O diretor do SindienergiaRS, Frederico Boschin, afirma que uma fonte complementa a outra e torna o sistema como um todo mais seguro. Na instabilidade ou na redução de disponibilidade de uma ou outra fonte, as demais suprem. Em períodos de seca, por exemplo, em que as hídricas podem ser afetadas, as solares e as eólicas podem atuar.

Por outro lado, as hidrelétricas reforçam a matriz como um todo. “O assunto do momento é o apagão. Ainda não existem causas esclarecidas do que ocorreu, mas uma constatação é que a segurança do Brasil está nas hidrelétricas. Dados do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) mostraram o comportamento das fontes. A nuclear e a hidrelétrica permaneceram inalteradas. A capacidade de recomposição do sistema é que permite a retomada mais rápida”, observou a presidente da Associação Brasileira de Pequenas Centrais Hidrelétricas e Centrais Geradoras Hidrelétricas (Abrapch), Alessandra Torres.

De acordo com o ONS, as redes de transmissão do sistema são planejadas para que, em caso de desligamento de qualquer componente, o sistema seja capaz de permanecer operando sem interrupção do fornecimento de energia.

Biodiesel está à frente na transição energética brasileira

A lta disponibilidade de matéria-prima vegetal e capacidade instalada aceleram avanços para que o Brasil cumpra sua parte nos acordos mundiais climáticos. A transição energética se tornará a maior fonte de progresso do país nos próximos cinco anos e tem nos biocombustíveis, especialmente no biodiesel, a ferramenta mais rápida e qualificada para que a nação cumpra os compromissos assumidos internacionalmente para diminuir a emissão dos Gases de Efeito Estufa e a temperatura da Terra até 2030.

do Conselho de Administração da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), Francisco Turra, que participou, nesta semana, do Fórum de Energias Renováveis, promovido pelo Correio do Povo e pelo Sindicato da Indústria de Energias Renováveis do Rio Grande do Sul (Sindienergia-RS), em Porto Alegre. A projeção do ex-ministro da Agricultura leva em conta tanto as oportunidades abertas pelo mercado de etanol, produzido no país desde 1975, como pelo de biodiesel.

“O Brasil é uma das maiores potências mundiais em biodiesel, assim como os Estados Unidos e a Malásia. É um país que tem tudo, inclusive uma diversa e abundante biomassa como matéria-prima, com uma safra de 320 milhões de toneladas de grãos e de 650 milhões de toneladas de cana-de-açúcar.” O avanço, entretanto, depende do aumento do percentual de biodiesel misturado ao diesel fóssil, atualmente em 12% (B12). “Já temos alguns estados norte-americanos operando com 30% e, na Malásia, a mistura já está em 20%”, diz Turra.

A possibilidade de desenvolvimento do país também é percebida na agregação de valor à soja, fonte de 70% dos 6,6 bilhões de litros de biodiesel produzidos nas 59 usinas do país. “É fundamental que a soja não seja apenas um instrumento de troca com a China e outros países e que estejamos preocupados em não somente vender commodities. Temos que vender produtos com valor agregado”, afirma Turra. Na lista dos itens de maior valor comercial, também estão carnes de aves, de suínos, leite e ovos, cujos animais alimentamse do farelo oriundo das usinas. 

A utilização da biomassa de soja também já começou a resultar na produção comercial de etanol hidratado. O feito foi anunciado pela Caramuru Alimentos, processadora de grãos e produtora de biodiesel. O biocombustível é fabricado no complexo industrial de Sorriso, em Mato Grosso. Com capacidade anual de 9,5 milhões de litros do biocombustível, a planta destinará 72% do produto para o mercado interno e consumirá o restante como insumo. Além de ser usado como biocombustível, o etanol hidratado pode servir como matéria-prima industrial na fabricação de produtos como perfumes e tintas.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895