Vinicultura projeta retomada em 2023

Vinicultura projeta retomada em 2023

Segmento de vinhos e espumantes do Rio Grande do Sul, responsável por 90% da produção do Brasil, experimenta a reacomodação do mercado depois do período de pandemia de Covid-19, quando bateu recordes históricos

Por
Nereida Vergara

A expertise dos gaúchos na produção de vinhos e bebidas provenientes da uva é fruto de uma história centenária, ancorada nos conhecimentos trazidos pela colonização italiana. Não é por acaso que o Rio Grande do Sul responde por cerca de 90% da produção vinícola do Brasil, o que representou, em 2022, um total de 242,6 milhões de litros, entre vinhos de mesa, vinhos licorosos e os desejados vinhos finos. De acordo com os dados do Sistema de Declarações das Vinícolas (Sisdevin) da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), o setor também processou 35 milhões de litros de suco de uva e 11 milhões de litros de espumantes. São mais de 600 vinícolas, em pelo menos 120 dos 497 municípios do Estado. 

A geração de ICMS aos cofres estaduais somente no ano passado, conforme a Secretaria do Desenvolvimento Econômico do Rio Grande do Sul, ultrapassou os R$ 197 milhões. “É um segmento muito importante para a economia do Estado, não apenas pela comercialização de bebidas e pela produção agrícola, mas também pelo apelo ao enoturismo”, pontua o secretário de Desenvolvimento, Ernani Polo.

Mesmo com todo o retrospecto positivo, o segmento vitivinícola gaúcho ingressou em 2023 com desafios a serem enfrentados. Em um país com economia deprimida depois da pandemia de Covid 19, o consumo de vinho caiu. Durante o período de restrição sanitária, os brasileiros consumiram mais vinho, como aponta um relatório divulgado em 2022 pela diretoria de agronegócio do banco Itaú. Foram 430 milhões de litros da bebida em 2020, 18,4% a mais sobre o ano de 2019 e o maior volume registrado desde 2000. Já o instituto Ideal Consulting apurou um consumo médio per capita dos brasileiros, em 2021, de 2,64 litros de vinho. Os argentinos consomem 30 litros per capita por ano, e os portugueses, 69 litros.

"O recuo verificado nas vendas de vinho no final do primeiro quadrimestre deste ano se estende a todo o setor de alimentação e tem a ver com a situação econômica do Brasil, pois na hora de fazer suas escolhas o consumidor opta pelos produtos essenciais", reconhece Rodrigo Valério, gerente de marketing da Cooperativa Vinícola Aurora, de Bento Gonçalves, líder nacional na comercialização de vinhos finos e suco de uva integral. Valério ressalta que ainda há um caminho a percorrer para convencer de vez o consumidor nacional a optar pelo vinho brasileiro, mas que isto passa por políticas governamentais. Mais do que a qualidade da bebida gaúcha, reconhecida internacionalmente, o consumidor se deixa seduzir pelo quesito preço, mais atrativo em vinhos estrangeiros como os fabricados na Argentina e no Chile. "Esta situação existe realmente, uma vez que nossa produção tem uma tributação que ultrapassa os 40%, enquanto que os chilenos e argentinos pagam cerca de 15% de impostos", aponta Gabriela Potter, enóloga e proprietária da Vinícola Guatambu, de Dom Pedrito.

O presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Daniel Panizzi, afirma que, mesmo que o setor vitivinícola tenha vivido seus revezes nos primeiros quatro meses de 2023, com a queda nas vendas de vinhos finos e espumantes, houve crescimento, em média, de 12%, nas vendas de vinhos de mesa e suco de uva. Ele ressalta que desde 2020 as safras de uva que se registraram no Estado foram de alta qualidade para a viticultura e afirma que o segundo semestre deve ser de retomada nas vendas gerais.

Panizzi observa também que, hoje, em todo o Brasil, já estão estabelecidas cerca de 1 mil vinícolas, em 10 estados e 16 regiões produtivas. “E há ainda muitas regiões a serem descobertas para aproximar o país até de produções como as que se registram na Europa por exemplo.” O crescimento do segmento, entretanto, avalia o dirigente, enfrenta o desafio de lutar por uma carga tributária mais justa. “Estamos presentes na discussão da reforma tributária e esperamos que os governos entendam que o vinho, além do aspecto cultural, é bebida que tem benefícios à saúde e merece taxação diferenciada”, completa.

Felipe Bebber, presidente da Associação dos Produtores de Vinhos de Altos Montes (Apromontes), na região de Flores da Cunha, vê o atual momento da vitivinicultura do Estado como "uma curva de ajuste", com a estabilização do consumo aos patamares a que a indústria está capacitada. 

Bebber diz que neste ano as 18 vinícolas que compõem a associação devem produzir 6,5 milhões de garrafas de bebidas, entre vinhos e espumantes, oriundas de uma produção de 115 hectares de vinhedos. O empresário acredita que o vinho gaúcho perde em competitividade ante os vinhos chilenos e argentinos, mas entende que não só a questão tributária deve ser revista, mas também a entrada de vinho contrabandeado no país. 

Conforme Bebber, há ainda de se considerar a variabilidade nos hábitos do consumidor. "Temos, entre nossas vinícolas, um bom índice de fidelidade. Mas hoje há um público na faixa dos 30 a 40 anos que gosta de experimentar o novo, então é importante a diversificação de rótulos para atender esta parcela", complementa. 

Assim como outras empresas, a Salton, com sedes em Bento Gonçalves e Sant’Ana do Livramento, realinhou metas para o ano. Em jornada realizada na Serra, no último dia 30, reunindo cerca de 300 fornecedores de uvas, a vinícola com 112 anos de tradição apresentou suas ações na área de marketing, lançamentos, sustentabilidade e governança, além de fornecer aos agricultores informações técnicas para a gestão da propriedade. 

Confira abaixo as reportagens especiais sobre cada uma destas vinícolas(Clique): 

Hoje, 4 de junho, é o Dia Nacional do Vinho. A data é comemorada desde 2017 no primeiro domingo do mês de junho e serve para promover e celebrar a qualidade das marcas. A bebida é democrática e pode ser apreciada em todas as comemorações. No entanto, para quem deseja tornar a degustação do vinho uma experiência, as vinícolas e os enólogos fazem as seguintes recomendações:

  • Conheça as uvas e suas origens. Por exemplo, malbec, pinot noir, cabernet, riesling, merlot.

  • Escolha o vinho de acordo com a degustação, se com um prato específico ou se com petiscos.

  • Escolha a taça correta, de preferência a conhecida como ISO, com a boca menor que a base, e que pode ser usada para qualquer tipo de bebida, com ou sem borbulhas.

  • Observe os aspectos visuais, como cor, transparência e viscosidade.

  • Aprecie o aroma e o sabor.

  • Aprenda a harmonizar: brancos e rosés com carnes brancas e massas com molho branco; tintos com carnes vermelhas e massas com molhos vermelhos; licorosos com sobremesas.

  • Espumantes com petiscos, saladas, sobremesas e frutas.

  • Não tenha medo de experimentar. Nem só os vinhos caros são de alta qualidade, vinhos mais em conta podem surpreender.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895