Futebol feminino vê novas expectativas a partir de mudanças da Conmebol e CBF

Futebol feminino vê novas expectativas a partir de mudanças da Conmebol e CBF

Clubes serão obrigados a montar equipes caso queiram participar, por exemplo, da Libertadores

Carlos Correa

Clubes serão obrigados a montar equipes caso queiram participar, por exemplo, da Libertadores

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A empolgação é cíclica e tem intervalos regulares. A cada quatro anos, que coincidem com a realização dos Jogos Olímpicos, torcida, imprensa e patrocinadores emocionam-se com o desempenho das brasileiras da seleção feminina de futebol. Então, ouve-se de tudo: “Com mais estrutura, essas meninas poderiam render muito mais” ou “são heroínas, imagina o que não seria se recebessem o mesmo tratamento dos homens”.

A partir de frases como essas e de suas variações, o movimento seguinte é conhecido. Políticos e dirigentes, com ternos bem-alinhados e ideias nem tanto prometem que desta vez será diferente. Que desta vez o futebol feminino receberá o devido apoio. Que desta vez a coisa vai. Todos nós sabemos o que acontece. A coisa não vai.

O futebol feminino, no entanto, é construído por personagens, acima de tudo, otimistas. E aqui estão elas, em 2017, menos de um ano após os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, mais otimistas do que nunca. Desta vez, porém, a esperança reside menos em promessas e mais em atitudes. Por incrível que pareça, em se tratando de Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) e de Confederação Brasileira de Futebol (CBF), a roda andou. E promete andar mais.

O primeiro sinal foi dado em setembro do ano passado. Em uma medida que pegou a muitos de surpresa, a Conmebol anunciou que a partir de 2019, todos os participantes da Copa Libertadores deveriam ter também um time feminino.

Do contrário, estariam fora da competição. Não demorou muito para a CBF se mexer também. A entidade deve confirmar em breve uma decisão que obriga a todos os clubes da Série A, a partir de 2019, a terem uma equipe formada por mulheres. Nos bastidores é dado como certo que a partir de 2020 a medida será estendida também às Séries B, C e D.

Na marra ou não, os sinais de desenvolvimento foram aparecendo. No Rio Grande do Sul, por exemplo, eles são visíveis. A Dupla Gre-Nal, que não contava com equipes femininas há um bom punhado de anos se mexeu e agora tanto o Grêmio como o Inter têm seus times. Afinal de contas, ninguém quer correr o risco de perder uma vaga em uma eventual Libertadores por tamanho descaso. “Em se tratando de futebol feminino, a gente sempre fica com um pé atrás, mas como a CBF vai determinar a obrigatoriedade de equipes femininas, pode crescer sim. Depois desse empurrãozinho, pode se bancar”, prevê Patrícia Gusmão, 38 anos, técnica do Grêmio.

No caso do Tricolor, a montagem do time uniu a fome à vontade de comer. Como o Rio Grande do Sul não contava com um clube no Campeonato Brasileiro feminino há um bom tempo, a Associação Gaúcha de Futebol Feminino (AGFF), presidida pelo professor Carlos Alberto de Souza, decidiu formar uma espécie de seleção gaúcha e buscar um clube para que a representasse na competição nacional.


Até a virada do ano, as tratativas estavam bem encaminhadas com o Brasil de Pelotas. Foi quando a CBF avisou que no caso da equipe rubro-negra, a possibilidade seria dada só no ano que vem. Neste meio tempo, a entidade abriu mais vagas no Brasileirão e tomou como critério o ranking masculino. O Grêmio estaria apto a jogar. Faltava, no entanto, um time. Nasceu então a parceria entre o Tricolor e a AGFF. O clube entra com a “marca” e a estrutura para treinos e jogos e a Associação, com auxílio da Federação Gaúcha de Futebol (FGF) arca com os custos.

A ideia de uma seleção gaúcha permaneceu. Por isso, a base do Grêmio que vai jogar a Série A é formada em grande parte por jogadoras que até o ano passado estavam no Canoas/Duda, campeão gaúcho. Entre elas, está Karina Balestra, 35 anos e com passagens por Inter, Corinthians e Seleção Brasileira, além de uma temporada de três anos no Suwon, da Coreia do Sul. No ano passado, Karina foi a artilheira do Gauchão. Fez 32 gols em nove jogos, uma incrível média de 3,5 por partida. “Nunca havia feito tanto gol em um campeonato só”, observa Karina.

Ao contrário do futebol masculino, no entanto, a maioria das jogadoras do Grêmio não vive apenas do futebol — incluindo Karina. Como precisam trabalhar, os treinos são realizados apenas às terças e sextas-feiras à noite e aos finais de semana. Até a estreia, no dia 12 de março, diante do Vitória (o de Pernambuco, não o da Bahia), terão sido menos de dois meses de treinamentos. “A gente costuma dizer que o que vale é a qualidade do treino e não a quantidade”, diz Karina. “Estamos com a seleção gaúcha, a base de um time que foi praticamente imbatível nesses últimos dois anos”, completa.

Apenas um clube no País tem contratos profissionais

O empurrão da CBF e da Conmebol é importante, mas a consolidação de um futebol feminino mais desenvolvido no Brasil passa necessariamente por um processo de autossustentabilidade. Para que se tenha ideia da atual situação, de todos os clubes do país, apenas o Santos assina a carteira de trabalho das jogadoras. Em todos os demais, os contratos são de amadores, o que significa que na prática as atletas recebem apenas uma ajuda de custo.

Gerente do recém-lançado projeto de futebol feminino do Inter e principal nome da modalidade no Rio Grande do Sul, a ex-jogadora Duda Luizelli traz previsões otimistas neste sentido. De acordo com ela, graças à força de uma marca como o Inter, estão sendo viabilizadas parcerias e patrocínios que vão tornar o departamento rentável no curto prazo. Mais do que isso, a esperança é de que já em 2017 o clube também assine a carteira de trabalho de todas as atletas.

“É o momento do futebol feminino no país. Quem souber se organizar neste novo começo, vai largar na frente”, analisa Duda. A intenção de um contrato profissional vai além da simples valorização. Os planos pelos lados do Beira-Rio são de que, com o crescimento da modalidade no país, o clube possa começar a lucrar com a transferência de atletas da mesma forma que já o faz no masculino.

Sem uma vaga no Brasileirão em 2017, o projeto capitaneado por Duda no Beira-Rio mira resultados a médio e longo prazo. Apesar de o Canoas/Duda ter dominado o cenário gaúcho no último biênio, com a parceria da AGFF e o Grêmio, quase todas as jogadoras migraram para a Arena. Assim, o time colorado começa praticamente do zero e aposta em descobrir novos talentos. Mão de obra não deve faltar. Divulgada a avaliação técnica que acontece no dia 5 de março, em menos de 24 horas, mais de 230 meninas procuraram o clube.

Tanto para a Dupla Gre-Nal como para as demais equipes do nnterior do Estado, no entanto há outros obstáculos a serem superados para se alcançar uma consolidação. A começar por uma balança que mostra um desequilíbrio visível. “Hoje, um guri que fizer 30 embaixadinhas já tem algum clube interessado em comprar. Em termos de mercado, as meninas não valem o que vale um guri de 12 anos”, lamenta o presidente da AGFF, Carlos Alberto de Souza.

O dirigente lembra outras dificuldades bem mais práticas e restritas ao universo do futebol feminino. “Se eu for comprar um conjunto de camisetas, vai lá ver se tem o tamanho feminino. Se eu quiser comprar um troféu para a goleira menos vazada do campeonato, vai lá ver se tem uma taça com uma mulher? Meião tem até o tamanho 35. Até chuteiras são difíceis de encontrar”, relata Souza, observando que há apenas um fabricante de material esportivo que produz os calçados femininos. “O futebol feminino ainda vai crescer muito”, aposta Duda. Como se vê, até mesmo em termos de mercado, possibilidades não faltam. Tomara que dessa vez finalmente a coisa ande.


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