Segurança é o desafio do avanço da Internet das Coisas

Segurança é o desafio do avanço da Internet das Coisas

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A segurança é o maior desafio do avanço das Internet das Coisas. O mundo dos “The Jetsons”,desenho animado que falava sobre a vida do futuro, já é realidade. Não temos carros voadores, mas temos drones que transportam coisas e até com capacidade para levar pessoas. O que falta é massificar a sua presença. Porém, tanta tecnologia e interligação tem um preço. E é neste ponto que está o maior desafio: a segurança. Não só a privacidade dos dados pessoais, mas entre os países. Essa é a avaliação do porta-voz do Instituto de Engenheiros, Eletricistas e Eletrônicos (IEEE) e CEO da consultoria Questera, Raul Colcher, que aponta também quais outras transformações estão a caminho com os avanços tecnológicos.

É notável as mudanças que a tecnologia trouxe às nossas vidas, em especial a Internet. As pessoas têm consciência da dimensão dessa mudança?
As pessoas em geral ainda não têm total consciência. Estamos num processo de maior divulgação, mas o ritmo de incorporação de novas tecnologias suplanta a velocidade de aculturação pelas pessoas. Assim, vai sendo falada e parcialmente compreendida.

Uma dessas mudanças incorporada à nossa vida é a chamada Internet das Coisas (IoT, sigla em inglês). O que ela significa exatamente?
A Internet das Coisas envolve basicamente a comunicação entre dispositivos e processos através de redes. A rigor não é alguma coisa nova. Mas está sendo disseminada e envolve muitas novas aplicações, progressivamente mais sofisticadas e com padrões. Essas aplicações são muito impactantes. Na área médica, por exemplo, é possível controlar por dispositivos sinais vitais de pacientes ou que estão dentro de ambientes de UTI. É possível monitorar a situação de pessoas que sofrem de algumas doenças que precisam de controle. Praticamente em todos os setores, temos e teremos saltos de qualidade e eficiência em função da IoT.

E essa evolução está dentro de um contexto de avanço tecnológico.
É uma nova onda na Internet. Já tivemos várias. A Internet surgiu como demanda militar, para prover redes que fossem mais eficientes em locais hostis. Uma configuração que depois tinha aplicações civis e comerciais. A primeira grande onda foi a comunicação entre pessoas, como e-mail, que explodiu na década de 90. A segunda onda era de comunicação entre pessoas e processos, com a explosão da web. E, como consequência, vieram as aplicações, como o comércio eletrônico, o avanço da multimídia e a comunicação em vídeo e áudio. Agora temos a última onda que é a de dispositivos. Há mais dispositivos conectados pela rede atualmente do que usuários. E vai explodir. O Brasil ainda está começando. Temos um atraso. Mas está se disseminando muito rapidamente.

Já estamos rumando ao mundo dos “The Jetsons” ou de outros filmes de ficção científica, em que equipamentos fazem as coisas sozinhos e que conversam entre si?
Já vivemos o mundo dos Jetsons. Cada coisa tem seu endereço e se conversam. Esses avanços trazem promessas, mas também desafios, como a questão da privacidade. Teremos o uso disseminado em alguns anos. Acredito que em cinco anos já poderemos ver transformações radicais. Talvez os carros não voem, mas temos drones. Já existe. A questão é tornar viável economicamente. No ambiente técnico, estamos neste mundo. Carros autônomos são exemplos. Eles vão mudar radicalmente a maneira de vivermos. A economia de compartilhamento e de aplicativos está mudando o mundo agora. No primeiro momento parece que afeta só a locomoção. Mas afeta tudo. A indústria automobilista precisará se reinventar. O próprio marketing vai ter que mudar, porque o desejo de compra precisa ser repensado. Nos planos político, econômico e social, as mudanças também vão ocorrer.

Um dos pontos ignorado pela maioria das pessoas é o que trata da segurança das informações. Estamos em vulnerabilidade?
Esse é o grande desafio e também o mais imediato. Parte do problema tem a ver com a massificação. Estamos falando de milhares de processos conectados, sensores e redes de milhares de pontos. Redes muito mais complexas que as atuais. Serão necessários novos serviços e tecnologias de telecomunicações para apoiar, como a 5G. A Internet das Coisas é a grande impulsionadora desse avanço. Existe ainda a questão da padronização, as centenas de normas técnicas que precisam ser elaboradas e aprovadas. Há grandes desafios técnicos, comerciais, econômicos e regulatórios. A questão da privacidade nesse contexto também é complexa e tem vários níveis. Num nível direto, a sua geladeira, estando conectada com o supermercado, é obvio que o supermercado vai saber o que tem nela e como são seus hábitos de consumo. E vai usar isso. Assim como somos bombardeados por propagandas após fazermos uma busca na Internet. Você deu autorização? Ou você deu autorização e nem sabe? Entram em cena então os contratos e os aspectos regulatórios, a necessidade de adequação da proteção ao consumidor.

Essa é só uma ponta do problema.
Exato. Existe, por exemplo, o uso, por grandes empresas, de ferramentas poderosas. Análises de dados e inteligência artificial que permitem o desenvolvimento de “processos inteligentes” de tomada de decisão, capazes de aprender e se aperfeiçoar com o uso. Nossas transações e interações em diversos contextos permitem a coleta sistemática de grandes massas de informação, cuja análise vai permitir, por exemplo, a criação de critérios para conceder ou negar crédito para determinado perfil de pessoas, orientar procedimentos de abordagem policial, etc. Mas isso pode tornar-se perigoso, na medida que cristaliza e sanciona preconceitos e procedimentos pregressos e torna difícil a discussão objetiva e transparente dos critérios empregados. E o que pensam as pessoas que são atingidas? O Facebook está fazendo uso extensivo de nossos dados, outros têm se aproveitado desses dados com finalidades duvidosas e sem autorização expressa e não se está dando nada em contrapartida ao usuário. Alguns governos já pensam em regular. Claro que isso depende de decisões políticas e há muitos outros interesses envolvidos.

Como garantir segurança e privacidade? E, em um contexto mundial, como muda a relação entre os países em caso de guerra cibernética?
Não vamos conseguir deter ou controlar os processos científicos ou o desenvolvimento tecnológico. Devemos adotar procedimentos pessoais, corporativos e regulatórios de segurança. Mas é preciso reconhecer que o assunto é bastante complicado. Na relação entre países, a incorporação dessas ferramentas tem produzido novos instrumentos de inteligência e guerra eletrônica, incorporadas aos arsenais de forças armadas, não ocasionalmente, mas normal e sistematicamente. Com a difusão e massificação das grandes redes de sensores e atuadores, controlando processos críticos, a utilização dessas ferramentas em âmbito militar e de segurança interna torna-se tendência e desafio para os governos.

*por Mauren Xavier

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