Classe média engorda endividamento

Classe média engorda endividamento

Desemprego e difícil adaptação a ganho menor é um dos fatores da perda do controle financeiro

Karina Reif

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Um grupo de pessoas que mudou o padrão econômico por motivos como perda de emprego, separação ou doença tem encorpando o número de endividados. No Brasil, 78,5% das famílias estão neste cenário, segundo dados mais recentes da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic). E o maior avanço na proporção de endividados foi verificado entre os que ganham de cinco a dez salários mínimos. Uma das saídas para quem entra na bola de neve dos empréstimos é tentar negociar com o credor. Na Defensoria Pública do Estado, cresce o número de pessoas buscando ajuda para encontrar soluções.

A coordenadora da Câmara de Conciliação Cível, Ana Carolina Sampaio Pinheiro de Castro Zacher, observa que há dois perfis bem definidos. Um deles é o que não consegue arcar com despesas básicas só com seus rendimentos. Já o segundo é quem teve mudança no nível financeiro e enfrenta dificuldade de se adaptar à nova realidade. “Antes da pandemia, esse não era nosso perfil de atendimento. São pessoas que recebiam mais de dois, três salários mínimos e tiveram diminuição da renda. Com o aumento do custo de vida se viram obrigadas, ou deveriam se ver obrigadas, a mudar os gastos”, explica. São famílias que tinham filhos em colégio particular, carro e outras comodidades. “Infelizmente, são confortos que hoje não poderiam mais ter. Elas têm que entender que o perfil de consumo mudou. Que os filhos terão que ir para a escola pública, que terão que usar transporte público”, observa, lembrando que é muito difícil a aceitação da nova condição.

O diretor da FGV Social, Marcelo Neri, lembra que a pandemia acentuou desigualdades e a classe média está entre os que mais sofreram. O Mapa da Riqueza divulgado em fevereiro mostrou queda de 4,2% na renda desse grupo de 2019 para 2020. Pessoas desta classe passaram a pedir empréstimo para manter o estilo de vida.

De janeiro a junho a Defensoria Pública assistiu a 7.290 consumidores em busca de acordo extrajudical. Os atendimentos mensais somam 1,2 mil. “A gente tenta ajustar o conflito de forma que não precise entrar com processo. Não há ilegalidade necessariamente que possa ser atribuída ao credor, fraude ou abuso. Negociamos para adaptar a nova realidade dessa pessoa às obrigações que contraiu”, diz Zacher, destacando que só em 2023 foram obtidos descontos de R$ 2,1 milhões na soma das contas dos assistidos.

Outro fenômeno presente nos atendimentos da Defensoria é o superendividamento. Em 2022 foram 66 procedimentos de superendividamento e só nos seis primeiros meses de 2023 há 134. “A tendência é que o número dispare”, projeta a defensora. Diferentemente do endividado, que é aquele que inclusive pode estar com parcelas de cartão, carnê e empréstimos em dia ou pode estar inadimplente, o superendividado é aquele que tem mais dívidas do que recebe de renda. “Pagando moradia, alimentação e tudo o que precisa para a saúde, está sempre no negativo”, assinala.

Conforme Zacher, uso inadequado do cartão é um dos principais fatores a acelerar débitos e levar ao superendividamento. “Pagam o mínimo e entram no rotativo, que tem a taxa de juro mais alta. Vira uma bola de neve”, alerta. Ela ressalta que muitas pessoas contraem empréstimos pela aparente facilidade. “As financeiras ligam, mandam WhatsApp”, diz. O cliente pega empréstimo para gastos mensais como supermercado, por exemplo, e no mês seguinte terá a receita diminuída pela parcela. O comprometimento com esse tipo de despesa imediata pode levar anos até ser resolvido.

Aprender a administrar as finanças pessoais não é tarefa fácil e, muitas vezes, depende de ensino. Professora da Escola de Negócios da Fadergs, especialista em controladoria e finanças, Caleandra Martins Velho entende que é possível desenvolver conhecimentos específicos para aplicar dentro de casa. “Varia de pessoa para pessoa. Algumas têm facilidade em aprender e aplicar conceitos enquanto outras podem precisar de mais orientação”, destaca. Por isso, buscar ajuda com cursos ou com especialistas financeiros pode ser uma opção para aprimorar a gestão de recursos. Ela ressalta que cada caso é específico e que as informações devem ser aplicadas à realidade dos grupos familiares ou dos indivíduos que pretendem se aprimorar. “Podem ajudar a desenvolver estratégias de investimento e planejamento de orçamento, gestão de dívidas e outros aspectos relacionados às finanças pessoais”, ressalta. Os cursos, orienta a professora, representam uma ótima maneira de adquirir conhecimento financeiro, desde noções básicas até investimentos mais avançados.

Hoje, pessoas em situação de rua poderão tirar dúvidas em uma atividade da Defensoria Pública do Estado denominada “Conheça seus direitos”. O encontro está marcado para as 9h no Centro POP 2, localizado na rua Gaspar Martins, 114, sala 120, bairro Floresta, em Porto Alegre. A reunião contará com as defensoras públicas Ana Carolina Zacher, Mariana Fenalti Salla, dirigente do Núcleo de Defesa da Pessoa Idosa, e Alice Backes de Leon, dirigente do Núcleo de Defesa Ambiental.

Dez dicas para se reorganizar

1.Estabelecer metas financeiras individuais ou em conjunto de curto, médio e longo prazo, como economizar para comprar a casa própria, se aposentar, fazer uma viagem ou pagar dívidas;

2.Criar um orçamento com todas as despesas e receitas e priorizar as necessidades básicas para alocar os recursos;

3.Acompanhar regularmente o orçamento e fazer ajustes caso haja necessidade;

4.Ter uma comunicação aberta e transparente com as pessoas que eventualmente compartilham das contas, como parceiro ou família, e discutir regularmente o estado financeiro;

5.Tomar decisões em conjunto caso a renda seja compartilhada;

6.Reservar uma parte dos rendimentos para economizar regularmente;

7.Estabelecer uma reserva de emergência para cobrir imprevistos e para atingir as metas de longo prazo;

8.Se houver dívidas, trabalhar em conjunto para eliminá-las, priorizando as que têm juros mais altos e considerar estratégias como uma renegociação para facilitar o pagamento;

9.Evitar gastos desnecessários, identificar gastos supérfluos e trabalhar por uma redução.

10.Analisar os hábitos de consumo como gastos fora de casa e encontrar maneiras de economizar. Também é importante fazer comparações de preços antes de ir às compras.

*Fonte: Caleandra Martins Velho, especialista em controladoria e finanças.


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