Excedente no Rio Grande do Sul, produção de diesel enfrenta gargalos no país

Excedente no Rio Grande do Sul, produção de diesel enfrenta gargalos no país

Apesar de autossuficiência de petróleo, país precisa importar derivados; no cenário gaúcho, a situação é contrária

Karina Reif

Há diferentes tipos de óleo que se adaptam aos perfis de refinarias

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Enquanto o Rio Grande do Sul excede sua produção de óleo diesel – destinando, ao menos, 25% para fora do Estado –, no âmbito nacional, o Brasil tem um problema estrutural no processamento do combustível fundamental para a economia pelo seu uso no transporte de carga, máquinas agrícolas e indústria. Apesar de o país ser autossuficiente em disponibilidade de petróleo, ainda depende do mercado externo. Entre janeiro e setembro deste ano, foram importados 10,3 milhões de metros cúbicos de diesel. 

O pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) Luiz Fernando Ferreira explica que isso está relacionado com o que é demandado nacionalmente, com os diferentes tipos de petróleo e com a capacidade das refinarias. “O déficit de diesel é estrutural por diversas razões. Os projetos originais das refinarias eram otimizados para gasolina e para (processar) petróleo leve. Com o passar do tempo, nossas necessidades foram mudando”, diz. 

Atualmente, há 19 refinarias no país, segundo dados da ANP, sendo dez delas da Petrobras. No entanto, Ferreira informa que a Xisto Paraná e a SSOil Energy, ambas privadas, não apresentam produção. “Assim, na prática, temos 17 refinarias em operação. Há quatro autorizadas para construção e entrada para processamento nos próximos anos com capacidade total de processamento de 112.737 barris por dia”, ressalta o pesquisador do Ineep. 

A mais antiga das unidades para transformação do material bruto em derivados é a Riograndense, da década de 1930. Desde lá, com o incremento da produção de petróleo no Brasil ao longo das décadas, foram necessárias adaptações no parque de refino nacional. Isso porque, no passado, boa parte do óleo vinha do Oriente Médio, que é mais leve do que o encontrado nas reservas brasileiras, incluindo o pré-sal. Considerando a variedade de especificidades da commodity, é preciso importar uma parte para compor um blend mais otimizado para cada produto, incluindo o diesel, e para cada perfil de refinaria instalada no país. Do total refinado entre os meses de janeiro e setembro deste ano, cerca de 15,5% era petróleo importado.

Investimentos necessários em adequações

Com uma tecnologia mais complexa seria possível obter os derivados conforme a demanda, independente do tipo de material bruto disponível no mercado interno. Ferreira analisa que o Brasil precisa aumentar a capacidade de refino, e também fazer um debate sobre o incremento da complexidade das fábricas, o que permitiria trabalhar mais com produto nacional, sem depender tanto do que vem de fora, mesmo que isso significasse colocar mais recursos na comparação com o que se gasta importando. 

“Nos Estados Unidos, por exemplo, o governo prioriza a segurança energética antes de qualquer coisa. Não está em discussão se é mais caro ou mais barato. Mesmo que custe mais, ficaríamos blindados de vulnerabilidade”, argumenta. 

Na mesma linha, o professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Alessandro Donadio Miebach afirma que, ao longo dos anos, o setor brasileiro não cresceu na velocidade necessária para assegurar ao país a completa autossuficiência de derivados. “Para fazer isso, é necessário investimento. Há fatores políticos e geopolíticos que interferem no preço dos combustíveis, como a guerra da Ucrânia e os conflitos na Ásia Ocidental. À medida que a gente necessita importar combustível, fica mais dependente da volatilidade internacional”, avalia. 

Na opinião dele, o repasse de recursos deveria ser tanto do setor público como do privado, a partir da avaliação de retorno financeiro para o segmento. “Em geral, o setor privado comprou refinarias já existentes e não optou por construir novas”, acrescenta o docente. 

Estado tem superávit no refino de diesel

Na contramão da lógica nacional, o RS é autossuficiente na produção de alguns derivados, principalmente o diesel, mesmo não explorando petróleo, que vem basicamente do Sudeste do Brasil. Só a Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), em Canoas, processa 201 mil barris de petróleo por dia e abastece o território gaúcho, além de destinar o excedente para outros estados e também para a exportação. A produção diária de gasolina, por exemplo, é de 9 milhões de litros e a de diesel, de 16 milhões de litros. Outras empresas também atuam no processo de refino no RS, a Refinaria Riograndense e a Braskem, colaborando com uma parcela menor dessa disponibilidade de produtos. 

Segundo o gerente-geral da Refap, Marcus Valenti, de tudo que é produzido de óleo diesel na Refap, cerca de 75% ficam no RS e o restante é destinado a outros mercados. “Por ser um Estado agrícola, historicamente a produção da Refap foi direcionada para maximizar a produção de diesel, que demanda mais. Ao longo do tempo, ocorreu a valorização em relação à gasolina. Hoje é mais negócio produzir diesel, em termos econômicos”, salienta. Além disso, o petróleo do pré-sal, que é o carro-chefe da Petrobras (cerca de 70% da produção),  tende a render mais com a conversão para o diesel. 

Depois de um período de baixa demanda de combustíveis durante a pandemia, a orientação do governo federal, conforme Valenti, é buscar a máxima utilização dos ativos das refinarias. Tudo isso, para suprir o mercado interno e reduzir as importações. 

A destinação de recursos também tem sido priorizada para contribuir com a transição energética e a produção de combustíveis menos poluentes. A partir da divulgação do próximo Plano Estratégico, que deverá ocorrer este mês, a unidade deve começar a colocar em prática projetos, como o da instalação de uma nova unidade de hidrotratamento de diesel (HDT). Com isso, seria possível produzir no local somente diesel S10, que tem menos enxofre na composição, o que reduz a emissão de poluentes. Atualmente, metade da produção ainda é S500, mais prejudicial ao meio ambiente. 

Este ano, a Refap passou por uma grande parada de manutenção, com um investimento de R$ 450 milhões e mobilização de 5 mil pessoas, o que garantiu a recuperação da capacidade. “A cada cinco ou seis anos, a gente precisa fazer (a parada) para realizar inspeções, restaurar as condições de integridade, confiabilidade e  disponibilidade para ter performances e rendimentos bons.” A próxima parada, desta vez menor, está prevista para o segundo semestre de 2024, com destinação de R$ 164 milhões. 

Balança de comercialização

A exploração do pré-sal, a partir de 2008, garantiu a autossuficiência do Brasil na produção de petróleo, diminuindo a importação e incrementando as exportações. De janeiro a agosto deste ano, o país exportou, em média 46,68 milhões de barris de petróleo por mês (1,5 milhões de barris por dia), indicam dados da ANP. 

Na comparação, a importação de petróleo bruto foi menor. Em média, foram comprados cerca de 9,3 milhões de barris a cada mês (0,31 milhões de barris por dia). Com relação aos derivados, o Brasil produziu nos últimos 12 meses, cerca de 1,99 milhões de barris por dia. 


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