2022 de esperança: pessoas afetadas pela pandemia relatam seus desejos e anseios por um ano melhor

2022 de esperança: pessoas afetadas pela pandemia relatam seus desejos e anseios por um ano melhor

Ainda que a pandemia não tenha terminado, o avanço da vacinação, o surgimento de novos tratamentos e a diminuição dos casos graves da doença trazem novas expectativas

Correio do Povo

A enfermeira Giovana Paggiarin Skonieski trabalhou na ala de Covid-19 e deseja, em 2022, poder voltar a abraçar os pacientes

publicidade

No início de 2020, Rodrigo Azambuja havia recém-concluído sua formação em massoterapia. Estava trocando de área. Tão logo começou na nova profissão, veio a pandemia. “Precisei ficar um ano e meio fechado”, lamenta. A história de Rodrigo representa a de muitos outros afetados pela pandemia em todo o país. Os últimos dois anos foram pesados, a pandemia trouxe novas preocupações, inviabilizou geração de renda para alguns fez adoecer tantos e deixou outros de luto. Ainda que a pandemia não tenha terminado, o avanço da vacinação, o surgimento de novos tratamentos e a diminuição dos casos graves da doença trazem a esperança de um 2022 melhor.

Rodrigo voltou a trabalhar quando recebeu a segunda dose da vacina, em julho, mas até o momento não conseguiu estabelecer uma agenda de clientes e tem tido dificuldades para manter o espaço que aluga para sua clínica em Porto Alegre. Até o momento, tem atendido mais amigos e pessoas que se solidarizam. “Eu vejo as pessoas ainda um pouco receosas com o vírus e muito financeiramente comprometidas, então fica difícil vender”, relata.

Rodrigo, massoterapeuta, ficou um ano e meio fechado por conta da pandemia. Foto: Ricardo Giusti

O massoterapeuta tem esperança que o número de atendimentos aumente e o sucesso do negócio seja maior em 2022, apesar de ter receios no que se refere à recuperação da economia. “Eu vejo que gradualmente as coisas estão se desenvolvendo para isso, que é possível funcionar mesmo com todas as restrições e todas as dificuldades que viemos enfrentando. Estou mais tranquilo, posso dar conta”, almeja.

A psicóloga humanista Bárbara Bestetti percebe que esse é o ânimo geral. “No início havia um medo, uma insegurança muito grande. Mas agora se nota que as pessoas conseguem lidar com a situação com mais tranquilidade.”, explica. Segundo a psicóloga, ainda que haja uma parcela negacionista da população, muito desse pensamento se deve ao avanço da vacinação. “As pessoas junto a isso conseguem reacender a esperança de dias melhores, a possibilidade de um ano melhor”, avalia. Alexandre Zavascki, médico e chefe do setor de Infectologia do Hospital Moinhos de Vento, também enxerga a aplicação das vacinas como um ponto positivo para o sucesso do próximo ano. “As vacinas previnem o adoecimento grave. É muito importante, sobretudo para os idosos, que tomem três doses. E agora com o avanço da nova variante Omicron, que se vacinem as crianças”, orienta.

Diogo Darkiewicz, mais conhecido como Diogo Darkie, também teve seu negócio afetado pela pandemia. Diogo tem uma produtora musical e participa de mais de uma banda, além de ter carreira como músico solo. Como no caso de Rodrigo, faz pouco tempo que conseguiu voltar a ativa. Durante a maior parte de 2020 e 2021, Diogo precisou contar com a ajuda financeira de amigos, recebeu cestas básicas da Associação dos Músicos do Rio Grande do Sul e se mudou, com a esposa e sócia de negócio, duas vezes, para diminuir custos com aluguel. A última delas para Montenegro, onde ainda reside.

O músico Diogo Darkie passou por dificuldades durante boa parte da pandemia. Foto: Reprodução / CP

A partir de outubro desse ano, com a retomada do setor de eventos, o músico passou a conseguir trabalho. “Foram 23 shows agora em dezembro”, diz animado. Diogo também buscou outras formas de renda, escrevendo e gravando jingles, e se inscrevendo em leis de incentivo e fomento à cultura. “Eu sou muito otimista, eu fiz o possível para me virar com a música sem ter público, apesar de ter sido um período terrível”, comenta.

Na primeira vez que Diogo subiu ao palco depois do início do período de pandemia, teve uma sensação estranha. “Tinha medo. Será que estou fazendo a coisa certa? Será que quem está aqui está em risco?”. Para a psicóloga Bárbara, uma reação comum. “A gente ainda vai sentir os efeitos desse período por bastante tempo na saúde mental. Ainda que lentamente as coisas melhorem a partir de agora, nós vivemos praticamente dois anos de catástrofe. Os traumas foram muito grandes”, pondera. Diogo tem fé em um 2022 melhor, onde se saberá lidar melhor com a doença. “Fé principalmente na ciência”, defende.

Ciência que realmente está avançando para um futuro de mais opções de tratamento. Recentemente, uma nova droga, da farmacêutica Pfizer, contra o coronavírus teve sua eficácia comprovada e teve seu uso aprovado em alguns países. “Temos em vista que, ainda no início do ano, esse e outros remédios estarão disponíveis no Brasil”, projeta o infectologista Alexandre Zavascki. O avanço científico, porém, não significa um relaxamento nos cuidados. “Houve um recrudescimento da pandemia nas últimas semanas, especialmente na África, na Europa e na América do Norte. O mais importante é se vacinar e manter os ambientes ventilados, a Omicron começa a predominar por aqui também e é necessário se prevenir”, frisa o médico.

Giovana Paggiarin Skonieski também foi diretamente impactada pela pandemia, mas de forma diferente. Ao contrário de Rodrigo e Diogo, o trabalho de Giovana aumentou muito, pois ela é enfermeira no Grupo Hospitalar Conceição, em Porto Alegre. Hoje trabalhando com pacientes de câncer no ambulatório da ginecologia e mastologia, entre março e setembro de 2020 Giovana se dedicou a atendimentos na ala específica para pacientes infectados com coronavírus. “Eu sou enfermeira há 26 anos e a Covid-19 é diferente de tudo que eu já havia visto. Nós não estávamos preparados para a chegada desse vírus”, afirma.

Durante seu tempo na ala-Covid-19, Giovana precisou desempenhar certas funções pela primeira vez. Como os pacientes ficavam completamente isolados de suas famílias, as enfermeiras se tornaram o elo que uniu os pacientes aos seus parentes do lado de fora do hospital. “As famílias ficavam muito angustiadas, então era importante que nós fizéssemos essa conexão dos pacientes com seus familiares”, conta a enfermeira, que fez inúmeras ligações de vídeo com as famílias e os pacientes no CTI. “O que nós mais tentávamos fazer era trazer a esperança, era o que eles mais precisavam além do tratamento. Isso nos uniu muito.”

Giovana se sentiu próxima de seus pacientes enquanto estavam internados na ala de Covid-19. Foto: Alina Souza

Mesmo não atendendo mais os pacientes de Covid-19, Giovana segue observando o impacto da pandemia nos casos que atende. “As pessoas deixaram de fazer os exames preventivos, por conta do distanciamento social. Muitos casos de câncer que chegam para nós são de pessoas que estavam há tempo sem fazer seus exames”, lastima. A enfermeira reitera a importância de não relaxar nos cuidados com a saúde. “A Covid está aí, ela vai seguir ainda por um tempo, mas não podemos deixar de lado os outros problemas de saúde. Não deixem de fazer os exames”, alerta. “E também o cuidado com o próximo. Não é porque eu estou bem que vou deixar de me precaver.”

Para 2022, Giovana deseja poder abraçar. Trabalhando na ala oncológica, o afeto sempre se mostra necessário. “A Covid nos tirou essa possibilidade, os pacientes nos pedem abraços, obviamente a gente não nega, mas não é aquele abraço apertado como antes. Desejo abraçar os pacientes, meus amigos e minha família”, espera.

A comerciante de Capão da Canoa, Roberta Ramos, também viveu de perto os efeitos da doença, mas do outro lado, como paciente. Roberta, seu marido e sua filha passaram pela doença em fevereiro de 2021. A família mora a duas quadras do local onde foi instalada a tenda para atendimentos específicos da doença na cidade do litoral. “Foi bem na época em que faltavam leitos. Não tinha sequer cadeiras para atender a todos. Foi aí que eu vi a real gravidade da situação”, recorda.

Roberta Ramos, o marido e a filha mais velha tiveram Covid-19 no ínicio do ano. Foto: Arquivo pessoal / Divulgação / CP

Roberta teve muita febre durante duas semanas e passou mal diversas vezes. Teve que fazer mais de um tratamento. Quando finalmente testou negativo para Covid-19, continuava sentindo as sequelas da doença, falta de ar e dor de cabeça, que sente até hoje. Roberta teve que fazer sessões de fisioterapia e segue em acompanhamento médico, tratando dos pulmões. O marido da comerciária, Marcelo, também teve sequelas e outros familiares faleceram em decorrência do vírus. Como Giovana, Roberta também frisa o cuidado com o próximo, e para 2022 deseja mais empatia e tolerância. “Sempre temos esperança de que as coisas melhorem”, completa.

Com um 2021 que chega ao fim repleto de incertezas, a psicóloga Bárbara resume o sentimento que fica para o vindouro 2022: “se tem uma coisa que o brasileiro sabe fazer é ressignificar as coisas. Talvez em função da fé, que é muito importante nesses momentos. 2022 vai ser um ano de retomada, aos poucos, de ressignificação. Não vai ser fácil, a incerteza continua, mas vamos nos reerguer”, opina, otimista.


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895