Ciclistas tentam conscientizar motoristas apressados

Ciclistas tentam conscientizar motoristas apressados

Enquanto cresce adesão à bicicleta, amigas criaram bike shop para estimular cultura urbana

Fernanda Pugliero / Correio do Povo

Apesar das ciclovias, Jean prefere andar no meio dos carros

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Janaísa, 34 anos, conhecia apenas de vista Patrícia Silva de Figueiredo, 21, e Daíse Duarte Lopes, 19, que morreram no mesmo dia depois de serem atingidas por ônibus no mês passado. As três já haviam pedalado juntas em um dos encontros do Massa Crítica, que se reúne na Capital em todas as últimas sextas-feiras do mês. O cartaz dizendo “Eu sou Daíse. Eu sou Patrícia. Sou jovem e a sua pressa levou a minha vida”, em uma das quatro bicicletas de Janaísa, confeccionado logo após o acidente, que aconteceu no dia 20 de março, fez um automóvel parar a bicicleta de Janaísa quando estava na avenida Farrapos. No banco do carona estava a mãe de Patrícia, que logo desceu para abraçá-la.

Janaísa, que só se desloca de bicicleta na Capital, atribui à pressa o incremento da brutalidade no trânsito. “Todos querem tudo para ontem e ficam nervosos se não conseguem transitar com a mesma velocidade na qual comem um sanduíche em um restaurante de fast food.” Ela deixa claro que não é radical a ponto de ser contra os veículos motorizados, mas defende com gosto o mote “Mais amor, menos motor”, utilizado pelo Massa Crítica durante os encontros. “Não sou contra carros. Todos merecem ter carro próprio, moto, caminhão ou um carrinho de pipoca. Mas que os usem conscientemente.”

Os ciclistas urbanos, que cada vez mais crescem em número em Porto Alegre, serviram de inspiração para Sílvia Pont, Tássia Furtado e Isadora Lescano abrirem, em junho de 2013, a Vulp Bici Café, no bairro Rio Branco. “Existem várias bike shops hoje em Porto Alegre, mas ainda são muito direcionadas ao esporte e ao lazer”, conta Isadora, 31 anos.

A proposta é ser um espaço dedicado à cultura urbana da bicicleta. O principal meio de transporte das três sócias é a bicicleta. “Eu me sinto tão segura pedalando quanto se eu andasse de carro. Transportar-se é uma questão de atenção. Deve-se ter atenção conduzindo qualquer tipo de veículo ou, até mesmo, andando a pé”, opina Isadora, que afirma ser adepta do capacete, apesar de o equipamento não constar como obrigatório no Código de Trânsito Brasileiro.

Além de servir para deslocamento diário, a bicicleta ganhou, há um ano, um novo significado para Jean Winck, 22 anos. Ele é um dos da Veló Courier, cooperativa que oferece o serviço de entregas utilizando bicicletas. Os 10 quilômetros que separam a sede da empresa, no bairro Tristeza, do Centro são vencidos em 20 minutos pela bicicleta de Jean. “Eu ando rápido, mas sempre opto por circular o mais devagar possível. Muitas vezes, a via é que acaba ditando o ritmo”, explica.

Apesar de a cidade já contar com 20,2 quilômetros entre ciclovias e ciclofaixas, Jean prefere andar no meio dos carros. “Ninguém é obrigado a circular nela. As pessoas têm que entender que não é todo mundo que anda ali e aprender a não hostilizar os ciclistas por isso.”

Com a prática diária, Jean foi vítima de um acidente no trânsito. Ele quebrou a clavícula após chocar-se com um automóvel e cair na via. “Um motorista saiu de um estacionamento e tirou o espaço de reação que eu tinha. Ele saiu, ocupou o espaço, eu tive que puxar o freio da frente e capotei”, recorda. O ciclista, que teme se acidentar novamente, afirma que nenhum motorista desceu do carro para socorrê-lo. “Estavam todos os carros buzinando porque eu estava caído no chão e abriu o sinal. Ninguém parou para me ajudar.”

Conscientização é vacina, afirma Diza

Para Diza Gonzaga, presidente da Fundação Thiago Gonzaga, além da violência natural no trânsito, os motoristas porto-alegrenses andam mais irritados ao volante devido ao estreitamento de pistas por causa das obras viárias na cidade. Ela destaca que o trânsito brasileiro está entre os três mais violentos do mundo. “Os acidentes no trânsito lotam 78% dos leitos dos hospitais públicos no Brasil. A média de internação de um acidentado é de três a seis meses. A vacina para isso é a conscientização.”

Veículos não coexistem bem

Mauri Panitz, engenheiro de trânsito, acredita que os veículos e as bicicletas, por serem tecnologias de transporte diferentes, não têm condições de coexistência na mesma via. Segundo ele, o problema é que a Capital não oferece boas condições para implantar ciclovias, devido ao desenho urbano e à topografia irregular. “Os políticos que jogam para a torcida implantam ciclofaixas, que deveriam ter 2 metros de largura. As de Porto Alegre são muito estreitas.”

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