Dia dos Avós: idosos conectados superam desafios e marcam presença no universo digital

Dia dos Avós: idosos conectados superam desafios e marcam presença no universo digital

Correio do Povo conta histórias que retratam a presença expressiva de pessoas mais velhas na internet

Brenda Fernández e Camila Souza

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A representação de idosos no acesso à internet cresceu nos últimos anos. Um dos principais motores para isso foi a pandemia, que fez com que esse grupo - considerado de risco à doença - ficasse mais isolado socialmente e, assim, usasse celulares e computadores para encurtar a distância de amigos e familiares. Uma pesquisa elaborada pela Confederação Nacional dos Lojistas SPC Brasil e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) mostra esse cenário em números: de 2018 a 2021, o número de idosos com acesso à internet dispara de 68% para 97%.

Além do isolamento, outro fator também contribui para esse leque de públicos com interesse na tecnologia: a longevidade. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a parcela de pessoas com 60 anos ou mais representava 14,7% da população em 2021, frente à estimativa de 11,3% em 2012. Além disso, apontam que o Rio Grande do Sul é o estado com o segundo maior percentual de idosos: 18,6%.

A longevidade não só ampliou a representação de idosos no meio digital, mas criou uma nova direção para pensar políticas e outras experiências com mais inclusão. “As pessoas estão vivendo por mais tempo e estão mais engajadas no tecido social. E a inclusão digital faz com que os idosos se sintam pertencentes a esse mundo”, explica Denise Ceroni, professora de Pedagogia da UniRitter. A especialista lembra que conforme a revolução tecnológica avança, mais produtos são desenvolvidos para pessoas idosas, como aparelhos de celular.

Além disso, destaca que essa inclusão digital já vinha acontecendo há cerca de uma década, mas se intensificou durante a pandemia. “Isso se aprofundou em função do próprio isolamento social. Passou a ser a única forma de comunicação para falar com seus parentes, netos e amigos.” 

É o caso da Francisca Terezinha Cabral, 87 anos, que mora em um residencial particular para idosos, em Porto Alegre. Por conta da pandemia, passou um período sem visitas dos filhos e netos. Como sabia mexer no celular, usou o aparelho para manter contato diário e, inclusive, compartilhar receitas com a família.


Francisca Terezinha usa a tecnologia para compartilhar receitas com a família | Foto: Mauro Schaefer

“A tecnologia facilita a conversa com os netos e os amigos, estamos sempre trocando mensagens”, contou a avó de Alícia e Henrique. Segundo ela, a interação é diária pelo WhatsApp, com mensagens de bom dia e boa noite.

O Whatsapp – rede social lançada em 2009 – é o aplicativo de mensagens compartilhadas mais utilizado pelos idosos (97%), seguido do Facebook (85%), conforme a pesquisa do CNDL - que ouviu 414 pessoas acima dos 60 anos. 

Crescendo com a tecnologia

O celular faz parte da vida de Zulma Vasconcellos Barreto, 87 anos, desde que o aparelho era uma novidade no país. Quando surgiram os primeiros modelos, ela já aderiu entusiasmada. E não foi só isso. Além de fazer questão de ter um celular atual, ela também levou a tecnologia para seus principais hábitos, como ler jornais pela tela. “Eu gosto muito de ficar por dentro do que acontece no mundo, por isso tenho assinaturas de jornais.”

A tecnologia também contribui para que a professora aposentada mantenha contato com os dois netos e um bisneto - com apenas 1 ano. Apesar de a família morar na mesma cidade, em Porto Alegre, a pandemia dificulta as frequentes visitas. “Mas eu recebo uma foto por noite do bisneto pelo WhatsApp”, conta

Zulma se considera uma pessoa “em movimento”. Os encontros com a família e amigos hoje são organizados pelas redes sociais. 


Zulma levou a tecnologia para seus principais hábitos | Foto: Arquivo Pessoal / CP

Conexões para além do Brasil

Quem também marca presença nas redes sociais é Janete Borba, de 80 anos. Conversa com a família, participa de grupos, assiste vídeos e posta selfies. Ela mora em Viamão, mas suas conexões vão muito além do território gaúcho: coleciona amizades virtuais de Portugal e até da França.

Com a ajuda da neta Madu Porto, 22, Janete começou a usar as redes sociais há dois anos e hoje está conectada ao Facebook, ao Messenger, ao Instagram e ao WhatsApp. Ela conta que se adaptou fácil à tecnologia e hoje já consegue navegar pelas redes sozinha. “Peguei um manual e fui aprendendo. Agora já faço tudo. Já aceito e peço amizade no Facebook”, conta.

Lá, ela participa de grupos de crochê, de gastronomia e muitos outros. Já chegou a acumular quase 900 amigos na plataforma, entre eles pessoas da França e de Portugal. Mesmo não falando outros idiomas, a comunicação se torna possível, porque a avó de Madu também aprendeu a usar as ferramentas de tradução. 

Além de colecionar amizades, ela se conecta com a família que mora longe. Uma filha, um neto e um bisneto estão em Curitiba, enquanto alguns primos moram em Santa Catarina.“Todo dia a gente manda mensagem um pro outro. Às vezes são cinco horas da manhã e eles já estão me dando bom dia”, lembra. 

A avó e bisavó afirma que se sente muito bem utilizando a internet e não tem medo de se falar com pessoas estranhas. “Eu me cuido. Quando não gosto da situação, já bloqueio. Não dou informação nenhuma”, ressalta. 

Distração e fortalecimento de relações sociais e familiares estão entre os benefícios do acesso ao universo digital pelos mais velhos. “É uma forma de manter o desenvolvimento cognitivo e emocional. É assumir um protagonismo”, enfatiza a pedagoga Denise Ceroni.


Janete Borba ao lado da filha Dirlene Porto (esquerda) e da neta Madu Porto (direita) | Foto: Arquivo Pessoal / CP

Experiência que transita entre a internet e o rádio

Mariza Parmegiani, de 90 anos, resume sua relação com o celular como “indispensável”. “Me comunico com a família, faço contas na calculadora, tenho grupo com moradores do prédio”, lista a avó e bisavó.

“Na minha geração foi difícil enfrentar essa tecnologia moderna. Temos muita dificuldade de assimilar. Mas com o tempo e minha filha sempre me ensinando, agora domino”, conta Mariza sobre as primeiras tentativas com o celular. Mas ela faz questão de lembrar que também mantém hábitos mais clássicos, como ouvir rádio. 

Quando a neta e o bisneto de Mariza que moram nos Estados Unidos não conseguem vir ao Brasil, é pelas redes sociais que a distância é encurtada. Na pandemia, devido à emergência sanitária que fechou as fronteiras, esse recurso se tornou ainda mais importante. Além da neta e do bisneto, Mariza tem dois filhos e outros quatro netos. 

Já suas amigas não tiveram tanta facilidade com o meio digital. Mas não foi por falta de incentivo, ela conta. “Quando eu não entendia, ficava clicando até achar o que queria. Eu digo para elas: peguem o celular e mexam.” 

Ainda que o uso da tecnologia traga vantagens, também causa o problema de exclusão daqueles que não têm acesso, seja pelas condições financeiras ou nível de escolaridade. “Isso cria um nicho de exclusão muito ruim para a autoestima e para a capacidade de acreditar que são capazes. Também ficam apartados de uma série de benefícios, como o da informação. Isso é preocupante”, alerta a pedagoga.

Velhice ganhou visibilidade

Uma evidência de que os idosos estão cada vez mais dominando o universo digital é a diminuição de oferta de capacitações de informática para este público. Para Denise, isso não acontece pela falta de interesse, mas porque muitos já foram atendidos e hoje tem mais autonomia. 

Ela lembra que a UniRitter realizou, de 2010 a 2017, cursos com turmas lotadas. Porém, o último contou com apenas dez inscritos. “Eles passam mais tempo conectados. Começaram de forma tímida e acabaram descobrindo as possibilidades que a internet tem.” 

Se tornou comum encontrar os idosos assumindo protagonismo em diversos setores da sociedade. Conforme a especialista, o perfil de idosos já não é o mesmo de antes. “Aquela imagem da vovozinha em casa, de pijama, fazendo um tricozinho está desgastada. Cada vez vai ter pessoas grisalhas à frente de negócios, estudando e trabalhando. A velhice se tornou visível”.  Por isso, a tendência é de que esse público siga superando desafios e esteja cada vez mais conectado à tecnologia.


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