Enfermeiras farão partos no Hospital de Clínicas

Enfermeiras farão partos no Hospital de Clínicas

Objetivo do Centro de Parto Normal é reduzir as cesarianas, principalmente as desnecessárias

Cláudio Isaías / Correio do Povo

Lúcia Pfitscher diz que serão usados métodos naturais, como bola suíça e banheira

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Até o mês de dezembro, começará a funcionar na maternidade do Hospital de Clínicas de Porto Alegre um projeto inédito no Rio Grande do Sul: o Centro de Parto Normal (CPN), onde os partos serão realizados por enfermeiros obstetras. A iniciativa faz parte de uma nova atenção ao parto, criada pelo Ministério da Saúde através da Rede Cegonha em março de 2011, que incentiva a consolidação desses centros no país e preconiza um atendimento humanizado à paciente.

A enfermeira Lúcia Chaves Pfitscher, que atua no Centro Obstétrico do Hospital de Clínicas, ressalta que será oferecida uma assistência diferenciada, em que os enfermeiros farão os partos e terão o suporte de uma equipe multidisciplinar. "O CPN funcionará como um projeto piloto. Teremos uma sala no Centro Obstétrico até a construção de um anexo previsto no projeto de ampliação do hospital", explica.

Segundo Lúcia, a unidade continuará com a mesma equipe de profissionais, mas afirma que será necessária a contratação de oito ou nove enfermeiros obstetras. A equipe da maternidade do Hospital de Clínicas fará a capacitação e o treinamento no Hospital Sofia Feldmann, em Minas Gerais, que é referência na humanização do parto. Ela deixa claro que o CPN não atuará como uma casa de parto local que só trabalha com enfermeiros. "A diferença é que o acompanhamento do parto será feito pela equipe de enfermagem e no momento em que identificarmos problemas solicitaremos avaliação médica", destaca.

As pacientes para participarem do projeto serão selecionadas na admissão, com o mesmo critério de avaliação médica. "Se a mãe apresentar um pré-natal de baixo risco, será convidada a ter um parto natural." Um enfermeiro explicará a filosofia de humanização, o que é um CPN, e a gestante, aceitando, será encaminhada ao parto natural. Ou seja, não haverá o uso de medicamentos que hoje causam risco à mãe e ao bebê. "Nesse tipo de parto, não será oferecida analgesia, somente métodos naturais como o uso da bola suíça, estímulo à deambulação e o banho de aspersão", acrescentou. Uma inovação é a colocação de uma banheira. Conforme Lúcia, não existe nenhum hospital no RS que ofereça parto na água como método de alívio da dor. O diferencial no CPN é que o paciente não fará uso da oxitocina - remédio colocado no soro para induzir contrações. Além disso, a mãe terá livre movimentação. Hoje, segundo a enfermeira, a paciente fica restrita ao leito.

A presidente da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras (Abenfo/RS), Virgínia Leismann Moretto, diz que o CPN tem o objetivo de oportunizar um modelo de parto em que as escolhas das mulheres sejam respeitadas. "O Clínicas é um laboratório da Ufrgs e tem o compromisso de ampliar o conhecimento com novas práticas. A ideia do projeto é reduzir as cesarianas, principalmente as desnecessárias." Para Virgínia, os enfermeiros obstetras pretendem trabalhar em conjunto e nunca se pensou em se dissociar de outros profissionais da saúde.

Para médicos, objetivo é ''baratear''

As entidades médicas gaúchas criticaram o fato de que os enfermeiros obstetras do Hospital de Clínicas de Porto Alegre realizarão os procedimentos no Centro de Parto Normal (CPN). Para o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), o interesse do governo federal é "baratear" o custo da mão de obra nos hospitais. O Conselho Regional de Medicina (Cremers) considera um "despropósito" um hospital universitário permitir a realização de partos por enfermeiros.

O presidente do Simers, Paulo de Argollo Mendes, destaca que o tempo de formação de um médico obstetra é mais ou menos equivalente a três vezes o tempo de formação de um enfermeiro. "O médico é um profissional mais caro. É interesse do governo federal que o parto seja realizado por enfermeiros. O gasto dos hospitais será maior se tiverem que contratar médicos para realizar todos os partos."

Para Argollo, o Ministério da Saúde não faz o extremo que seria tirar o médico do Centro Obstétrico e deixar o enfermeiro realizar o parto. "Não fazem porque sabem que a mortalidade fetal é muito maior quando o médico não está presente. O profissional tem um preparo para atender a um parto que o enfermeiro não possui", acrescentou.

Segundo ele, o governo quer "baratear" os partos oferecendo aos hospitais mais recursos caso a instituição adote o modelo dos partos realizado por enfermeiros obstetras. "Os hospitais aceitam até porque as instituições de saúde estão com sérios problemas financeiros. Depois que é montada a estrutura, o governo federal nunca mais reajusta os valores dos procedimentos e fica muito mais barato a realização de partos por enfermeiros", argumenta.

O coordenador da Comissão de Fiscalização do Cremers, Antônio Celso Ayub, concorda que existe estímulo para que os hospitais adotem o sistema pagando muito bem no início do projeto e depois a médio prazo as instituições de saúde não são reajustadas. Para ele, seria mais fácil de se entender se o projeto, por exemplo, fosse desenvolvido no interior da Amazônia, mas não em um hospital universitário.


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