Gestores de hospitais alertam que RS está longe de "zerar" óbitos e internações por Covid-19

Gestores de hospitais alertam que RS está longe de "zerar" óbitos e internações por Covid-19

Aumento de casos na Europa e na China e a possibilidade de desenvolvimento de nova variante deixam vigilante a comunidade médica

Felipe Samuel

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Apesar da redução do número de óbitos e casos confirmados para o novo coronavírus em março no Rio Grande do Sul, gestores de hospitais alertam que é preciso manter a cautela e os cuidados sanitários. Embora reconheçam que o cenário atual é de otimismo - principalmente por conta da boa cobertura vacinal -, especialistas são unânimes em afirmar que o Estado ainda está longe de "zerar" as internações e os óbitos em função da doença.

Se em janeiro e fevereiro deste ano o Estado registrou os maiores números de infectados desde o início da pandemia, com mais de 706 mil casos confirmados somados os dois meses, até 28 de março foram 43.625. "Sem dúvida é um cenário mais otimista, mas ainda estamos distantes de ter zero internações e zero óbitos", explica a coordenadora do Grupo de Trabalho de Enfrentamento ao Coronavírus do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Beatriz Schaan.

Mesmo diante desse cenário, o aumento de casos na Europa e na China e a possibilidade de desenvolvimento de uma nova variante da doença deixam vigilante a comunidade médica. Beatriz ressalta que o HCPA recebe pacientes 'bem menos graves' do que em outros momentos da pandemia. "A gente tem sempre leitos disponíveis, quer seja de enfermaria ou de UTI para esses pacientes", assinala. "O cenário realmente é muito melhor do que o anterior, chegamos a ter 300 pacientes internados por Covid-19. Hoje a gente tem 17", compara.

Apesar da maioria da população estar vacinada, ela salienta que pessoas com comorbidades e transplantados, entre outros, mesmo vacinados, podem contrair a doença com mais frequência. E acabam necessitando de internação. Ao lembrar do pico de mortes em março do ano passado, com mais de 8,4 mil vítimas fatais, Beatriz destaca a ocupação dos leitos do HCPA, que chegou a ter mais de 300 pacientes internados por conta da doença. Atualmente, a Covid-19 não é mais a principal causa de internação na instituição.

"Considerando que temos pouco mais de 800 leitos, é uma proporção totalmente fora do usual. Uma única doença ocupando quase 30% dos nossos leitos", frisa. Um ano depois do pior momento da pandemia, a perspectiva de dias melhores é uma realidade. "Temos poucos pacientes na emergência, na enfermaria e na UTI, mas ainda não visualizamos esse 'numeral zero'. Obviamente, se tudo se mantiver com as tendências que nós estamos vendo, nos próximos meses talvez a gente tenha essa grata surpresa", projeta.

Com a redução das internações por Covid-19, o hospital pode devolver leitos destinados a pacientes com outras enfermidades e que estão com tratamentos represados em função da pandemia. "Não estamos desmobilizados, a gente segue mobilizado, mas num quantitativo menor", explica. Beatriz reforça que os cuidados da população para evitar a disseminação da doença devem ser mantidos, como uso de máscaras em ambientes fechados com número maior de pessoas e higienização das mãos.

Chefe do Serviço de Emergência do Hospital Moinhos de Vento, Paulo Schmitz explica que o número de atendimentos na emergência Covid-19 e na ala destinada a pacientes com outras doenças, de internações e de casos positivos para a doença vem caindo. "Em janeiro, no pico, chegamos a ter 55% dos casos atendidos suspeitos de Covid-19. Eram 700 pacientes por semana, cem por dia. De 180 que a gente atendia, por exemplo, cem eram de suspeitos de Covid-19", observa.

Conforme Schmitz, na semana de 14 a 20 de março, dos 366 exames Covid-19 realizados no hospital, apenas 38 deram positivo - o equivalente a 10,4% do total. De 21 a 28 março, os casos confirmados para Covid-19 apresentaram redução. "Na última semana foram 8,2% de positivos", frisa. Nesta terça-feira, a emergência do Moinhos de Vento não tinha nenhum paciente com Covid-19 ou suspeita de Covid internado. "Em janeiro, cerca de 27% dos casos de internação eram de Covid-19, entre confirmados e suspeitos. Agora a gente está só com 10%", explica.

Ele reforça que, 'se nada diferente acontecer', a ideia é que em duas ou três semanas não tenha mais nenhum caso de Covid-19 na emergência do Moinhos de Vento. "Claro que se não começar a aumentar o número de casos pelas variantes que eventualmente possam vir da Europa ou da Ásia", pondera. "Não dá pra baixar a guarda ainda. Sempre tenho medo de dizer que estamos virando o jogo porque daqui a pouco o pessoal acha que não tem mais Covid-19", reforça.

Schmitz avalia, no entanto, que ainda é cedo para classificar a doença como endemia. "Daqui duas semanas esfria, e começam a vir de novo as patologias de inverno que são as gripes. E será que daqui a pouco não começa tudo de novo? A principio, a Covid-19 não vai estar tão presente. Na própria pediatria, que a gente tem tido mais movimento com doenças respiratórias, a gente não tem visto muitos casos positivos, são poucos casos. A tendência é que volte a ser como as patologias de inverno nos anos anteriores a esses dois", assinala.

O Moinhos de Vento vai segui realizando exames em pacientes suspeitos de síndromes gripais. "Tem muitos casos aqui na emergência que vêm por outros motivos que não síndrome respiratória, por outras patologias, e se faz o rastreio e dá positivo. Vamos continuar rastreando pelos próximos dois ou três meses, principalmente no inverno. No momento que nós tivermos um mês sem novos casos, a gente vai poder diminuir a preocupação e o rastreio também", destaca.

No Grupo Hospitalar Conceição (GHC), o impacto da boa cobertura vacinal e a menor gravidade da variante Ômicron também refletiram na queda das internações no hospital Nossa Senhora da Conceição, que é referência no tratamento da doença. O diretor-técnico do GHC, Francisco Zancan Paz, afirma que o último óbito registrado na instituição ocorreu no dia 21 de março. "Estamos hoje com dois pacientes na UTI e quatro na enfermaria. E ninguém esperando para 'baixar'. Esses números são os mais baixos que já tivemos este ano", afirma.

Na avaliação de Paz, 'salvo' o surgimento de uma nova variante, a tendência que se observa é o término da pandemia. "Ainda não está encerrada, pois têm notícias de casos em outros lugares do mundo", ressalta. No GHC, a situação é tranquila. "Estamos vivendo um momento de plena tranquilidade, tanto que a gente está flexibilizando as visitas", observa. "Tivemos quase 50 pacientes na UTI em alguns dias e custou a descer essa curva, com pacientes novos todos os dias", lembra.

A diminuição dos casos de Covid-19 permite atendimento da demanda represada por conta da pandemia. E os pacientes com outras enfermidades voltaram a buscar serviços médicos. "Estamos sentindo agora um aporte muito grande de casos não-Covid, que ficaram represados durante dois anos, surgindo em grande número nas emergências. As nossas emergências de Porto Alegre estão lotadas com pacientes que têm outras doenças que não a Covid-19", frisa.


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