Grupo de voluntárias apoia pacientes de câncer de mama no Hospital Conceição

Grupo de voluntárias apoia pacientes de câncer de mama no Hospital Conceição

A maior parte das voluntárias também foi paciente do hospital

Giullia Piaia*

Bia, Dr. Pedrini e outras voluntárias do grupo, na última caminhada organizada em prol do outubro rosa, em 2019.

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O serviço de mastologia do Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Porto Alegre, é referência mundial em estudo de novas drogas. São milhares de referências na literatura mundial. Há poucos meses, uma nova medicação testada no hospital teve sua eficácia comprovada contra uma forma agressiva de câncer de mama. Mas não é apenas nisso que a mastologia do Conceição se destaca. Um grupo de voluntárias participa ativamente do acolhimento das novas pacientes e as apoia durante todo o período no hospital. “Elas são tão importantes quanto o médico durante o tratamento”, afirma José Luiz Pedrini, chefe do serviço de mastologia do Hospital Conceição e diretor da Sociedade Brasileira de Mastologia.

O voluntariado do Grupo da Mama Conceição é formado por antigas pacientes da mastologia, que voltam para retribuir os cuidados que receberam durante o tratamento. O grupo não é fechado para participantes externos, apesar da maior parte das integrantes terem feito tratamento no hospital. As voluntárias se fazem presentes diariamente no hospital, prestando atendimento às mulheres que estão chegando, recebendo o diagnóstico, fazendo a cirurgia e os demais procedimentos, como a quimioterapia. “Elas recepcionam e acolhem as pacientes com um calor humano que não é do médico. Eu sou médico, posso dizer isso. Não temos essa capacidade, somos técnicos, enquanto as voluntárias são mais emocionais. Elas já passaram pelo processo e transmitem uma segurança muito grande para as pacientes”, explica Pedrini.

A comerciária Beatriz Dias, a Bia, descobriu um câncer de mama fazendo exames preparatórios para uma cirurgia plástica, em 2013, e foi encaminhada ao Conceição. “Quando eu sai do consultório com o diagnóstico eu me desesperei. Comecei a chorar muito”, lembra. Bia sentou na sala de espera da mastologia e foi abordada por algumas pessoas. Eram as voluntárias do grupo. “Elas me disseram que passaram por aquilo e isso foi me dando um bem-estar. Uma sensação de ‘se elas podem eu também posso’”, conta.

Na sequência, Bia passou pela cirurgia de mastectomia e, quando acordou da anestesia, não estava sozinha. “Tinha uma voluntária segurando minha mão, me dizendo que tinha dado tudo certo”. Cerca de 30 dias depois, já recuperada da cirurgia, mas ainda em tratamento, Bia resolveu se dedicar ao grupo como voluntária. Naquele mesmo ano, assumiu a presidência do grupo e por lá ficou durante oito anos.

O vínculo entre as voluntárias e com as pacientes é muito forte. “São parentes de uma forma diferente. Todos os dias damos bom dia. Nos ajudamos sempre. É algo sem explicação”, relata Bia. No grupo, as pacientes encontram um apoio que por vezes não encontram nem na própria casa. “Nós somos muito felizes e como ficamos felizes em ajudar. Inclusive a quem não está sofrendo de câncer de mama”, resume.

Algumas interações nunca são esquecidas pelas voluntárias. Bia recorda da paciente mais jovem que acolheu: uma menina de 16 anos. “Ela chegou e me perguntou se doía depois da mastectomia. Eu respirei bem fundo, tinha que dar esperança para ela, e disse ‘olha, cirurgia tem que ter cuidado, sentir um pouquinho de dor é normal’”. Uma das maiores preocupações das novas pacientes é a possível perda de cabelo durante o tratamento. “Eu disse que se por acaso isso acontecesse eu iria conseguir a peruca que ela quisesse para ela. Ela ficou muito feliz. Isso foi algo que me marcou muito”, conta Bia, emocionada.

Alguns anos depois, em 2018, o trabalho de Bia tocou a servidora pública, Talita Paiva Tesch Macedo, que havia recém-recebido o diagnóstico de câncer de mama. Talita compareceu sozinha ao seu primeiro atendimento no Conceição e foi acolhida por uma das voluntárias, uma mulher de mais de 90 anos. “Ela me mostrou os caminhos naquele dia e me contou que há 40 anos tinha tido um câncer. Aquilo aqueceu meu coração e me deu forças para ver que existe vida depois do câncer” recorda, com carinho.

Talita e Bia criaram um forte vínculo durante o período que a funcionária pública permaneceu em tratamento. Esse ano, Bia se mudou para Palhoça, em Santa Catarina, e pediu para que Talita assumisse a presidência do grupo. “O trabalho do grupo é um abraço, no momento em que tu mais precisas de um abraço. Como eu fui abraçada, eu vejo que esse trabalho não pode parar. Eu vi como é bom tu olhar para frente e ver o sorriso de alguém que passou pelos mesmos percalços que tu vais passar”, destaca Talita.

Atualmente, o grupo se encontra sem atividades, por conta da pandemia, mas Dr. Pedrini deseja reencontrar as voluntárias o quanto antes, recepcionando as novas pacientes. “A partir de janeiro quero que elas voltem, porque elas fazem muita falta mesmo”, frisa. O médico notou que as pacientes que chegaram ao hospital durante o hiato do grupo ficaram mais inseguras durante o tratamento. “Qualidade de vida não é só a ausência de doença. O que essas mulheres fazem é espetacular”, enaltece.

Com a pausa provocada pela pandemia, muitas voluntárias saíram e outras entraram. O grupo voltará em 2022 renovado, mas mantendo os mesmos ideais. O plano de Talita para seu primeiro ano atuando como presidente é continuar com o suporte e criar algumas oficinas, como uma oficina de lenço. “E trabalhar a autoestima, que é muito afetada durante o tratamento”, afirma.

Apesar de não morar mais em Porto Alegre, Bia segue em contato com o grupo e com o Dr. Pedrini, que considera uma referência em todos os sentidos. “O trabalho voluntário feito de coração é extremamente gratificante. Seguir as orientações do médico e ter do teu lado alguém que já tenha passado pela mesma situação têm a mesma importância. Esse foi meu tratamento e hoje eu posso passar isso adiante”, reconhece. “Todos os tipos de doença deveriam contar com um grupo voluntário como o nosso”, opina.

*Sob supervisão


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