Moradores tentam organizar rotina no antigo Hotel Açores
Local ocupado pelo movimento Lanceiros Negros possui reintegração de posse autorizada pela justiça
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Na fachada do prédio, uma bandeira vermelha do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) é símbolo do desejo das famílias que ocupam o espaço desde o dia 4 deste mês: o direito à moradia. As roupas penduradas no portão, que atrapalham os olhadores curiosos dos que passam na calçada, são para doações. “Ganhamos muitas doações. Agora, repassamos para outras pessoas que também precisam”, contou Natanielle, de 24 anos, uma das moradoras. Um brechó também foi organizado no espaço.
Ocupado há menos de um mês, o prédio foi limpo e as suas salas, a maioria amplas e iluminadas, foram direcionadas para abrigar cerca de 40 crianças que acompanham os pais no local, além dos jovens, que participam de debates e atividades culturais, e os adultos, que organizam espaço para desenvolver alguma atividade que gere renda às famílias. O cenário é diferente do encontrado no começo do mês. “Quando chegamos estava tudo muito sujo. Tinha muito bicho, pó e cano de água quebrado”, lembrou.
Divisão de tarefas
Um mutirão de limpeza feito com o auxílio de voluntários durou duas semanas. O local conta com elevadores, que não estão sendo utilizados por falta de manutenção, e carpete em alguns dos cômodos, os quais são priorizados para acomodar as crianças. Os moradores estão organizados por comissões e dividem tarefas. Enquanto alguns limpam a cozinha, outros cuidam das crianças na creche e da segurança. Além disso, alguns organizam festas.
Como muitos dos que estão no prédio, Natanielle, que está no local com uma filha de seis anos, depende das ocupações para conseguir abrigo. Ela morava, inicialmente, na casa da avó em Viamão, na Região Metropolitana, mas mudou-se para a Ocupação Mulheres Mirabal. Posteriormente, foi para a Lanceiros Negros, até a desocupação. Agora, adotou o novo espaço como lar. “Era para ter acontecido a reforma urbana há muito tempo. Pegar esses espaços vazios e destinar para moradia poderia resolver uma boa parte do déficit habitacional do País, mas o governo quer criminalizar o pobre”, comentou.
"Vamos resistir"
Ela, assim como os outros moradores, prometem encarar a reintegração de posse, que pode ocorrer a qualquer momento, com resistência. “Todo mundo aqui trabalha, mesmo que de modo informal. A gente está tentando organizar as nossas vidas e a de muitos que chegam aqui. Vamos resistir”, afirmou.
Questionada sobre o seu futuro e o das famílias com a reintegração, a moradora criticou a disparidade de direitos. “Vou morar na casa da juíza, que recebe auxílio-moradia de quase R$ 5 mil”, ponderou.