“Não como nem durmo, é uma dor muito forte", diz sobrevivente das chuvas em Pernambuco

“Não como nem durmo, é uma dor muito forte", diz sobrevivente das chuvas em Pernambuco

Governo estadual confirmou 91 mortes e ainda há 26 pessoas desaparecidas na periferia de Recife e em Jaboatão dos Guararapes

R7

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"Não como nem durmo porque é uma dor muito forte". É assim que Lúcia da Silva, moradora do Jardim Monte Verde, em Recife, relata o sofrimento depois que as chuvas torrenciais que atingiram Pernambuco já deixaram ao menos 91 mortos e 26 pessoas desaparecidas. O bairro em que Lúcia vive foi um dos mais atingidos pelos temporais.

Lúcia foi retirada da casa em que vivia, no sábado. O socorro evitou que ela se tornasse mais uma vítima dos deslizamentos de terra na comunidade da capital pernambucana. Os vizinhos dela, porém, não tiveram tanta sorte: 11 pessoas de uma mesma família morreram e outra permanece desaparecida.

"Foi muito triste, foi como perder a minha família [...]. Faz 40 anos que vivo aqui, eram pessoas que eu via desde pequena", revela a dona de casa de 56 anos. "Encontraram os 11 [mortos], que serão enterrados, e falta uma mulher de 32 anos. Ainda não acharam o corpo dela", afirma com a voz embargada e com soluços.

No Jardim Monte Verde, bairro pobre localizado em uma encosta do Recife, e no município de Jaboatão dos Guararapes, dezenas de bombeiros continuam a busca das 26 pessoas que continuam sumidas ainda nesta segunda-feira.

Sobre o morro em que houve a tragédia, algumas casas ainda permanecem de pé. Mas, alguns metros adiante, é possível ver o abismo recém-aberto, praticamente vertical, com uma extensa camada de lama que arrastou tudo o que enfrentou pela frente. Aos pés do morro, uma montanha de escombros, pedaços de construções, roupas, brinquedos e outros objetos pessoais das vítimas do deslizamento.

Parecia um tsunami

O aposentado Mario Guadalupe, de 60 anos, também escapou por pouco do desastre. O deslizamento de terra "quase chegou à minha casa [...]. Vi tudo o que aconteceu", explicou. "Houve um primeiro deslizamento. Pensamos que a enxurrada não viria mais, mas, em seguida, veio uma nova onda de lama como tsunami, que arrastou tudo pelo caminho", acrescentou Guadalupe, que vive há 40 anos na comunidade.

A casa modesta do aposentado, milagrosamente conservada, agora é usada para armazenar alimentos distribuídos às vítimas. "Não foi uma tragédia anunciada porque nunca havia acontecido isso antes", diz.

"O que entendemos é que se trata de um fenômeno típico do aquecimento global porque nunca caiu tanta chuva em tão pouco tempo", completa, temendo outras tragédias similares. "É um aviso importante para o próximo período de chuvas", diz.

Os meteorologistas atribuem as chuvas torrenciais que caíram nos últimos dias sobre Pernambuco a um fenômeno denominado "ondas de leste", comuns nessa época do ano. O fenômeno possui nuvens densas que se deslocam desde o continente africano até a costa brasileira.

Em poucas horas, entre a noite de sexta e a manhã de sábado, choveu 70% do volume total de precipitações previstas para todo o mês de maio. Embora ninguém esperasse a pela tragédia, alguns moradores atacaram as autoridades. "Muitas pessoas aqui perderam tudo: suas vidas, suas casas. Precisamos de remédios e de alimentos", afirmou o pedreiro Jailson Gomes de Souza de 34 anos. "É um grito de ajuda para o Jardim Monte Verde. Se as autoridades vêm nos retirar, precisam dar uma solução. Não é só chegar e fazer campanha para as eleições", acrescentou profundamente indignado.

Sobrevoo de Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro visitou nesta segunda-feira às áreas afetadas pelas chuvas torrenciais na Grande Recife, onde pelo menos 91 pessoas morreram e 26 continuam desaparecidas. "Fizemos sobrevoo em parte da área atingida. Não conseguimos avançar. Tentei pousar também, mas a recomendação dos pilotos era de que, tendo em vista a inconsistência do solo, poderíamos ter um incidente. Então resolvemos não pousar", disse em entrevista com uma delegação de ministros no Recife.

O chefe do executivo federal relembrou a tragédia que acometeu a região serrana do Rio de Janeiro recentemente. "Tivemos problemas semelhantes em Petrópolis, sul da Bahia, norte de Minas. Estive ano passado no Acre também. Infelizmente, essas catástrofes acontecem, um país continental tem seus problemas", afirmou.

"Estamos obviamente tristes, manifestamos nosso pesar aos familiares. O objetivo maior é confortar os familiares e atender a população com meios materiais", acrescentou. O governo federal anunciou uma alocação de R$ 1 bilhão para ajudar o governo local e os municípios com a resposta humanitária, o restabelecimento dos serviços básicos e, posteriormente, a reconstrução das casas.


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