Papais Noéis aproveitam última semana como temporários

Papais Noéis aproveitam última semana como temporários

Agência paulista diz que só 40% da carta de 118 profissionais foram contratados para Natal deste ano

Karina Reif

Matheus ficou à vontade ao posar para a fotografia do encontro com o Noel Romeu Costa

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No final de ano, quando a economia fica mais movimentada pela injeção de 13º salário e vendas do comércio, as pessoas que precisam de emprego alimentam mais esperança de obter uma vaga temporária, ou garantir uma renda extra. Os Papais Noéis, símbolo do Natal, são alguns dos beneficiados com esses serviços sazonais. A procura pela contratação dos “bons velhinhos” começa, normalmente, em setembro. Cerca de 40 dias antes das celebrações natalinas, os homens com barba branca já começam a vestir as roupas vermelhas para tirar o máximo de sorriso das crianças. Eles são a atração mais valorizada do mercado.

Shoppings, lojas, farmácias, escolas e festas particulares demandam o serviço dos Papais Noéis. Mas, devido à crise deste ano, a procura diminuiu bastante. Uma agência especializada de São Paulo, a Papai Noel Brasil, informou que apenas 40% da carta de 118 profissionais conseguiram uma colocação neste fim de ano. No passado, a renda poderia chegar a quase R$ 20 mil, dependendo da carga horária e do período de atuação. Atualmente, fica entre R$ 14 mil e R$ 15 mil. Em outros anos, a procura era tão grande que chegava a faltar pessoas para atuar na área.

Apesar da recessão, o empresário Jorge Occhiuzzio, dono da agência Papai Noel Brasil, avalia que alguns estabelecimentos não abriram mão da tradição e contrataram os “bons velhinhos”. Porém, os locais menores que decidiram manter a contratação reduziram o turno, ou o número de ajudantes.

Conforme Occhiuzzio, o ofício tem algumas especificidades e exigências. Ele também atua como Papai Noel há cerca de 15 anos e observa que, quanto mais qualificado e adequado ao personagem, maior a chance de o trabalhador conseguir concorrer às vagas, escassas este ano. Ele lembra que até mesmo cursos são realizados para os Papais Noéis saberem como se portar. “É preciso ter boa aparência, falar corretamente, ser educado, gostar de crianças e ter fino trato”, observa.

Eles também necessitam ter jogo de cintura para lidar com as mais diversas situações. Perguntas impertinentes das crianças e postura inconveniente em festas de trabalho devem ser contornadas com bom humor.

Dinâmica de grupos e experiência


Criadora da confraria Clube do Noel, que completa 25 anos em 2016, a empresária Alice Storck observa que o mercado reduziu as contratações, mas alguns profissionais têm vaga garantida. “O Papai Noel que faz um bom trabalho, a tendência é permanecer nos outros anos.”

Há profissionais que atuam em shopping por vários anos. Romeu Inácio Ramos Pereira da Costa, 67 anos, já é figura tradicional nos Natais. Só no Praia de Belas, trabalha há 23 anos. Ele conta que, assim como o segmento comercial, as famílias enfrentam a crise com o aumento de preços dos produtos e contornando o endividamento.

Por isso, ele tenta ajudar a sensibilizar as crianças. Muitas pedem listas de presentes ao Papai Noel, enquanto os pais fazem sinal dizendo que não terão dinheiro para comprar tudo. “Costumo dizer que vou tentar realizar um dos desejos da lista”, diz.

Embora tenha conseguido manter o posto no shopping, ressalta que as visitas particulares com as quais complementava a renda foram reduzidas este ano. Muitos colegas ficaram sem vaga neste Natal, ou começaram a trabalhar mais tarde do que em outros anos. Alice confirma. Dos 35 Papais Noéis que participam da confraria, nem todos conseguiram trabalho e alguns tiveram o período reduzido. Ela observa que é preciso mais do que ter barba branca e ser gordinho para desempenhar bem o papel. “Eles precisam ser pacientes e ter habilidade com as crianças.”

Na confraria são realizadas dinâmicas de grupo para os antigos contarem aos novatos experiências que podem servir no trato com o público infantil. “As crianças estão cada vez mais rápidas e somente a vivência ajuda a lidar com as situações.”

Empregos refletem a crise

O mercado previa gerar cerca de 107,8 mil vagas temporárias neste final de ano, conforme projeção da Associação Brasileira do Trabalho Temporário (Asserttem). Esse número é 20% menor do que observado no ano passado. Os Papais Noéis encontram-se nesse grupo.
Conforme o pesquisador da Fundação de Economia e Estatística (FEE) Guilherme Stein, tanto os empregos temporários quanto os formais sofrem o impacto da crise econômica. “Este ano, a previsão é que o PIB cresça menos 3,5%. É uma queda muito acentuada. O mercado de trabalho sofre os reflexos. Já estamos observando que a renda do trabalhador caiu em todas as faixas”, declara.

Como a tendência é que as pessoas utilizem o 13º salário para pagar contas e não tanto para fazer compras, o comércio não deve fazer tantas contratações temporárias, nem gastar com atrativos como Papais Noéis. “Naturalmente contratam mais porque existe um volume de vendas maior. É sazonal. O setor de comércio e serviços é movimentado, mas este ano o Natal será mais pobre. As pessoas estarão mais contidas, comprando presentes mais baratos”, diz, ao avaliar que a renda das famílias caiu, elas estão endividadas e os juros, altos.

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