Venda de artesanato pela internet é alternativa de sustento para kaingang de São Leopoldo

Venda de artesanato pela internet é alternativa de sustento para kaingang de São Leopoldo

Comércialização tenta suprir ausência nas ruas e manter divulgação da cultura

Brenda Fernández

Sueli Khey Tomás é uma das artesãs responsáveis pelas encomendas

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Desde março, com o avanço da pandemia de coronavírus ao Rio Grande do Sul, a comunidade indígena Kainkáng Por Fi e Ga, de São Leopoldo, se viu obrigada a ajustar seu cotidiano. Os artesãos, que antes tomavam as ruas e as feiras de Porto Alegre e região Metropolitana para comercializar os produtos feitos à mão, tiveram seu principal meio de vendas barrado pela Covid-19.

Agora, o comércio, que representa quase toda a renda da comunidade, tem o intermédio de uma grande rede de apoio virtual. De publicação em publicação nas várias redes, a cultura kaingáng de alguma forma consegue chegar às pessoas e ajudar na sustentação dos índios.

“A nossa renda é basicamente 99% do artesanato, que antes vendíamos em ruas e feiras. Achamos essa forma de divulgar: nas redes sociais”, salientou a artesã e enfermeira Suel Khey Tomás. Ela é uma das moradoras da comunidade localizada no bairro Feitoria, que atualmente abriga 236 pessoas.

A pandemia, conforme Sueli, foi um fortalecedor da desvalorização da cultura indígena que já sofre um processo histórico de erosão. “Na verdade, a valorização da cultura Kaingáng, do artesanato, não é aquilo tudo que a gente espera que seja. É muito desvalorizado. São muito precárias as vendas. Nesses últimos tempos, caiu muito", lamentou.

"As vidas indígenas... Elas importam. Nós lutamos todos os dias pela sobrevivência", enfatizou Sueli. "Com a compra dos artesanatos, a pessoa está levando um pouco da cultura Kaingáng, dos povos originários aqui do país e do Rio Grande do Sul. Está levando também um pouco da história que foi, durante muito tempo, contada pela metade”, desabafou, ao lembrar da falta de reconhecimento do trabalho dos indígenas que residem no RS e também em Santa Catarina e no Paraná.

Os artesanatos à venda incluem livros, chás, acessórios, artigos decorativos, flechas e tapetes, com marca própria. A compra é feita pelo contato pelo whatsapp (51) 99597-7998, com pagamento prévio através de depósito ou transferência bancária. A retirada ou entrega ocorrerá após o período de quarentena. “Ainda tem aqueles que olham por nós, pelos indígenas, pelos povos originários do Brasil. A venda é bem procurada porque é mais fácil pra quem compra. A pessoa recebe a encomenda em casa. Alguns eu consigo enviar pelo setor de encomendas da rodoviária e outros pelos Correios. Alguns preferem que eu entregue em mãos, e faço muito questão disso para poder abraçar e agradecer”, explicou a artesã.

Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação / CP

Sueli, que atua na Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e no Espaço de Saúde da Por Fi Ga, afirmou que não houve, até o momento, nenhuma testagem para coronavírus na comunidade, que ainda não registrou nenhum caso suspeito da doença. “Esse é um ponto positivo para nós. Temos muitos grupos de riscos: idosos, hipertensos, diabéticos”, destacou Sueli. A comunidade possui um Espaço de Saúde, para atendimento primário, dentro do território indígena. Já os serviços de média e alta complexidade são realizados nos demais centros de saúde da cidade.

“Quando surgiu a pandemia nós já fomos orientados, avisados. Temos que nos prevenir antes”, ressaltou ao lembrar que os indígenas possuem uma condição de saúde mais vulnerável ao vírus. “Nossa luta pela sobrevivência são todos os dias. Não é essa crise, essa pandemia, que mata os indígenas. Claro, que tem uma visibilidade maior, tem todo um olhar voltado para a pandemia. Morremos todos os dias por falta de território, por falta de saúde e educação de qualidade”.

Ainda sem previsão de quando a rotina voltará à sua normalidade, a comunidade indígena vai aprendendo a conviver com o “novo normal” imposto pela pandemia. O uso da tecnologia na venda do artesanato, por exemplo, é uma das novidades adotadas que não deve ser suspensa com o término da pandemia: “Quero muito poder continuar. Quero seguir trabalhando nesta linha que também é de fácil acesso para as pessoas que estão em casa, que não têm condições de ir até o local em que trabalhamos.”

Foto: Arquivo Pessoal / Divulgação / CP

A comunidade Por Fi Ga também aceita a doação de materiais de higiene e cestas básicas.


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