Movimento pró-democracia desafia Junta birmanesa com protestos noturnos

Movimento pró-democracia desafia Junta birmanesa com protestos noturnos

Repressão já deixou 250 mortos desde o golpe de Estado

AFP

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Manifestantes pró-democracia, incluindo muitos médicos em jalecos brancos, se mobilizaram entre a noite de sábado (20) e a madrugada deste domingo (21) em Mianmar, em desafio à repressão sangrenta da Junta militar - que já deixou 250 mortos desde o golpe de Estado de 1º de fevereiro.

"Salvemos nossa líder!" Aung Sang Suu Kyi, detida em um local secreto pelo Exército há 49 dias; "Salvemos o nosso futuro!", diziam os cartazes dos manifestantes, reunidos esta madrugada em Mandalay (centro).

Outras manifestações noturnas ocorreram em outras partes do país, com militantes pró-democracia carregando velas acesas. Médicos, professores, funcionários de bancos ou ferrovias estão em greve há seis semanas, paralisando parte da frágil economia do país.

"Não temos medo" 

"Nossos médicos são tão corajosos", comentavam os manifestantes nas redes sociais. "Não temos medo do sangue" que o Exército derrama, acrescentaram. Cerca de 250 civis morreram desde 1º de fevereiro, segundo a Associação de Assistência aos Presos Políticos (AAPP). O saldo pode ser mais sério, já que centenas de pessoas desapareceram nas últimas semanas.

Neste domingo, um homem morreu e outros dois ficaram feridos em Monywa (centro), atingidos pelas forças de segurança que abriram fogo contra um pequeno grupo perto de uma barricada, informaram testemunhas à AFP. Dois dos cinco milhões de habitantes de Yangon, a capital econômica, estão sob lei marcial e a situação é muito tensa.

Alguns bairros mergulharam no caos, com manifestantes disparando coquetéis molotov contra o Exército e a polícia, que fazem uso de munição letal. Os tiroteios voltaram a se intensificar no sábado, com pelo menos dois mortos e três feridos em Yangon, de acordo com a AAPP, que relatou mais duas mortes a cerca de 80 quilômetros de distância, em Bago.

Para evitar a violência, muitos moradores de Yangon fugiam neste domingo da cidade, a maior de Mianmar, para retornar às suas regiões de origem a bordo de veículos, bicicletas ou mototáxis. A rodoviária estava cheia de pacotes e malas de todos os tipos. "Não posso continuar vivendo com esse medo, estou voltando para a minha região", disse uma jovem entrevistada por uma mídia local.

Alguns birmaneses também tentam deixar o país. A Tailândia espera um influxo de refugiados, enquanto a Índia já recebeu centenas. Enquanto isso, o funeral de uma mãe de três filhos, Mar La Win, é realizado neste domingo em uma cidade no centro de Mianmar. "Ela tinha acabado de sair de casa. Ouvi tiros e ela caiu", disse à AFP seu marido, Myint Swe, que conseguiu se esconder. "Quando vim buscar seu corpo no necrotério, estava coberto de feridas, não sei se a torturaram", contou. O Exército não respondeu às perguntas da AFP.

Enquanto isso, Mianmar se fecha cada vez mais. As conexões de Internet continuam sofrendo interrupções e apenas a mídia estatal cobre a crise.

Trabalhos forçados

A repressão judicial continua, e mais de 2.300 pessoas foram presas nas últimas seis semanas. Um casal de assessores australianos foram condenados à prisão domiciliar quando tentavam deixar o país por via aérea, segundo fontes diplomáticas.

Três homens do bairro de Hlaing Tharyar em Yangon, cenário de um massacre na semana passada com dezenas de manifestantes mortos, foram condenados por um tribunal militar a três anos de prisão, segundo a mídia estatal.

Membros da Liga Nacional para a Democracia (NLD), o partido de Aung San Suu Kyi, foram indiciados por "alta traição" e podem ser condenados a 22 anos de detenção. Suu Kyi, ex-líder de fato do governo civil, de 75 anos, já foi indiciada por diversas acusações, além de corrupção, e pode ser condenada a muitos anos de prisão e ser excluída da vida política.

Por enquanto, a Junta militar tem ignorado as condenações e sanções internacionais aplicadas por várias potências ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos e pela União Europeia (UE). A UE planeja sancionar na segunda-fira onze autoridades birmanesas implicadas na repressão, segundo fontes diplomáticas. 


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