ONU corre contra o relógio para chegar a acordo para preservação do alto-mar

ONU corre contra o relógio para chegar a acordo para preservação do alto-mar

Apesar de representar mais de 60% dos oceanos e quase metade do planeta, o alto-mar foi ignorado durante muito tempo

AFP

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Representantes dos Estados-membros da ONU passaram a madrugada deste sábado (4) em claro para tentar superar suas diferenças e chegar a um acordo que garanta a preservação do alto-mar. Após 15 anos de discussões informais e, em seguida, formais, as delegações que compõem a ONU já ultrapassaram em várias horas as duas semanas da terceira rodada de negociações em menos de um ano, em Nova York.

As tratativas têm sido uma montanha-russa nos últimos dias, e os delegados ainda se reuniam a portas fechadas na manhã deste sábado.

"Ainda temos algumas questões a esclarecer, mas estamos progredindo e as delegações estão mostrando flexibilidade", disse a presidente da conferência, Rena Lee, em uma breve sessão plenária por volta da 01h30 locais (03h30 no horário de Brasília).

O capítulo altamente político sobre a repartição dos potenciais benefícios dos recursos genéticos marinhos estava ausente do último rascunho do texto.

"É claro que eles ainda estão tentando com todas as forças conseguir um acordo hoje, senão já teriam jogado a toalha", disse Nathalie Rey, da High Seas Alliance, que reúne cerca de quarenta ONGs.

Ainda que sejam alcançados compromissos em todos os demais capítulos, um tratado não pode ser formalmente adotado nesta sessão, disse Rena Lee. Mesmo que não haja um acordo formal, seria "um grande avanço", disse à AFP Veronica Frank, do Greenpeace.

341 compromissos

O alto-mar começa onde terminam as Zonas Econômicas Exclusivas (ZEE) dos países, até um máximo de 200 milhas náuticas (370 km) da costa, e, por isso, não está sob a jurisdição de nenhuma nação.

Apesar de representar mais de 60% dos oceanos e quase metade do planeta, o alto-mar foi ignorado durante muito tempo, já que a atenção se concentrou nas áreas costeiras e nas espécies-símbolo, como baleias e tartarugas.

E isso apesar de os ecossistemas oceânicos serem responsáveis por metade do oxigênio que respiramos, limitarem o aquecimento ao absorver parte do CO2 gerado por ações humanas e alimentarem uma parte da humanidade. Mas estão ameaçados pela mudança climática, poluição de todo tipo e a sobrepesca.

Durantes as negociações, surgiram vários pontos de divergência, como a medida de criar zonas protegidas, que visa analisar o impacto das atividades em alto-mar no meio ambiente e a distribuição dos potenciais benefícios da exploração dos recursos genéticos marinhos.

Nesta reta final, os observadores esperam um impulso da conferência Our Ocean ("Nosso Oceano"), que acontece simultaneamente no Panamá, na presença de vários ministros que discutem a proteção e exploração sustentável dos oceanos.

A chanceler panamenha, Janaina Tewaney, anunciou que foram firmados "341 novos compromissos" para combater a poluição, a pesca ilegal e outras ameaças ao mar, que implicam fundos de 19,9 bilhões de dólares (cerca de 98,7 bilhões de reais).

A França anunciou que se juntará ao "corredor" de conservação no Pacífico Tropical, criado por Estados Unidos, Panamá e Fiji, para "ampliar a cooperação a serviço da proteção dos oceanos e da biodiversidade marinha", segundo o secretário de Estado francês para o Mar, Hervé Berville.

Em dezembro, todos os governos do mundo se comprometeram a proteger 30% de todas as terras e oceanos até 2030. Um desafio que não inclui o alto-mar, do qual apenas 1% está protegido atualmente.

Igualdade Norte-Sul

Um dos temas sensíveis é a mineração submarina, que também está sendo discutida no Panamá, onde a vice-chanceler chilena, Ximena Fuentes, disse à AFP que iniciar tal atividade "com regras muito gerais pode ser a receita para um desastre ambiental", pelo qual o seu país defende "pelo menos" 15 anos de moratória.

"Apesar das diferentes questões pendentes - e a lista é longa -, minha impressão é de que haverá um acordo ao final desta sessão", disse à AFP Li Shuo, do Greenpeace.

Para Li Shuo, há vontade política e tudo se resume "ao Norte contra o Sul, a questão da justiça e da equidade".

Os países em desenvolvimento estão preocupados por não ser parte plena do tratado devido à falta de recursos financeiros e temem ficar de fora da comercialização de potenciais moléculas milagrosas que podem ser descobertas em águas internacionais.

A União Europeia prometeu, em Nova York, 40 milhões de euros (220 milhões de reais) para facilitar a ratificação do tratado e sua aplicação inicial. Além disso, anunciou no Panamá mais de 800 milhões de euros (4,1 bilhões de reais) para a proteção dos oceanos até 2023.

Segundo observadores questionados pela AFP, resolver os aspectos financeiros, politicamente muito sensíveis, poderia desbloquear todo o resto e permitir, finalmente, submeter o texto à aprovação da conferência.


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