Esquema de pirâmide financeira que causou prejuízo de R$ 4,1 bilhões é alvo da Polícia Federal

Esquema de pirâmide financeira que causou prejuízo de R$ 4,1 bilhões é alvo da Polícia Federal

Em conjunto com Receita Federal, operação La Casa de Papel foi deflagrada no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás e Maranhão

Correio do Povo

Esquema captou recursos de mais de 1,3 milhão de pessoas em mais de 80 países e criou duas próprias criptomoedas

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A Polícia Federal e a Receita Federal deflagraram nesta quarta-feira a operação La Casa de Papel para desarticular uma organização criminosa responsável por implementar um esquema de pirâmide financeira que captou recursos de mais de 1,3 milhão de pessoas em mais de 80 países. O prejuízo aos investidores é estimado em R$ 4,1 bilhões, cujas operações teriam se iniciado em 2019.

Por meio de sites e aplicativos que mantinha nas redes sociais, a organização criminosa prometia que os investimentos seriam multiplicados em ganhos diários, que poderiam chegar a até 20% ao mês e mais de 300% ao ano. Duas criptomoedas chegaram a ser lançadas pelo grupo criminoso no final do ano passado, sem qualquer lastro financeiro.

A operação La Casa de Papel ocorreu no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás e Maranhão. Houve o cumprimento de seis mandados de prisão preventiva contra os líderes da organização criminosa e de outros 41 mandados de busca e apreensão, expedidos pela 3ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Os agentes cumpriram ainda mandados de bloqueio no valor de 20 milhões de dólares e sequestros de dinheiro em contas bancárias, imóveis de altíssimo padrão, gado, veículos, ouro, joias, artigos de luxo, mina de esmeraldas, lanchas e criptoativos em posse das pessoas físicas e jurídicas investigadas.

Estão sendo apurados os crimes contra o sistema financeiro nacional, evasão de divisas, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, usurpação de bens públicos, crime ambiental e estelionato.

A investigação começou na cidade de Dourados, no Mato Grosso do Sul, em agosto do ano passado, com a autuação em flagrante de dois dos investigados, quando se deslocavam em direção à fronteira com o Paraguai com escolta armada. Na abordagem, esmeraldas avaliadas em 100 mil dólares foram recolhidas. Elas estavam ocultas e não tinham origem legal, pois estavam amparadas em nota fiscal cancelada.

No curso do trabalho investigativo, os policiais federais constataram a existência de esquema transacional de pirâmide financeira. Os suspeitos, com utilização massiva de redes sociais, marketing, reuniões por diversos estados e países, centenas de “team leaders” arregimentados, atuavam para captar recursos e gerir uma empresa, que oferecia pacotes de investimentos e aportes financeiros desde 15 dólares a 100 mil dólares, com promessa de ganhos diários em percentuais altíssimos.

Embora divulgassem em redes sociais que estavam amplamente legalizados na Estônia e que seriam sócios de duas instituições financeiras, todas as empresas do grupo não existiam de fato.

Conforme a Polícia Federal, os investigados não tinham qualquer autorização para a captação e gestão dos recursos levantados no Brasil, na Estônia ou em outro país, tendo ainda diversos alertas de órgãos financeiros em vários países, como Espanha e Panamá, no sentido da ausência de autorização e de que se tratava de esquema de pirâmide financeira.

Os rendimentos prometidos ocorreriam através de transações no mercado de criptoativos por supostos “traders” a serviço da empresa, os quais seriam utilizados para multiplicar o capital investido e, ainda, instando os que ingressavam no negócio a captar novos investidores, em mecanismo que chamavam de “binário”, proporcionando ganhos percentuais sobre os valores investidos por novas pessoas que eram atraídas para o esquema.

A prática ilegal foi se tornando mais sofisticada no curso dos crimes, englobando supostos investimentos decorrentes de lucros advindos de minas de diamantes e esmeraldas que a empresa teria no Brasil e no exterior, em mercado de vinhos, de viagens, em usina de energia solar e usina de reciclagem, entre outros.

Em relação às duas criptomoedas criadas, os policiais federais identificaram manipulação de mercado para valorizar uma das moedas artificialmente em 5.500% em apenas 15 horas, com pico de até 38.000%, dias depois. “Tudo isso para manter a pirâmide financeira o mais tempo possível em atividade, pois as criptomoedas foram também utilizadas para pagar os investidores”, resumiu a Polícia Federal.

“Contudo, após alta meteórica e especulativa promovida pelos investigados, as criptomoedas perderam todo o valor de mercado e a cotação passou a romper em diversas casas decimais abaixo do centavo de dólar, resultando em perda quase que completa da liquidez”, acrescentou. Segundo a Polícia Federal, “valiam-se também de muita ostentação nas redes sociais, com milhões de seguidores em todo o mundo, demonstrando o sucesso pessoal e de investimentos, com demonstração de viagens internacionais para Dubai, Cancun e Europa”.

Para a movimentação do dinheiro, a organização criminosa utilizou as contas bancárias dos investigados, empresas de fachada, parentes, além de terceiros ligados ao grupo, para buscar a ocultação e lavagem de dinheiro dos recursos.

No curso da pirâmide financeira e com a prisão de um dos líderes em Cuba, os “fundadores” da organização cessaram os pagamentos dos valores aos cubanos sob a justificativa, divulgada nas redes sociais, de que o governo daquele país teria impedido a empresa de ajudar o país. Na sequência, ante o volume de dinheiro subtraído pelo esquema criminoso, os investigados começaram a impor dificuldades para realização dos pagamentos aos investidores lesados e, como forma de garantir seus lucros, passaram a estabelecer prazos cada vez maiores para resgate, o que impedia os saques dos valores aportados pelos investidores.

A investigação demonstrou que os investigados combinaram um ataque hacker, plano que foi efetivamente implementado no final do ano passado, no qual os líderes da organização criminosa alegaram um imenso prejuízo financeiro com a ação e retiveram todo o dinheiro dos investidores a tal pretexto, propondo a suspensão de todos os pagamentos sob o argumento da necessidade de uma auditoria financeira.

Meses depois, comunicaram a conclusão da auditoria e anunciaram uma reestruturação da empresa, mantendo o esquema e migração para uma nova rede, a fim de que os investidores efetuassem novos aportes e a continuação do negócio, com ameaças do “CEO” da empresa de que quem processasse ou realizasse registros de boletins de ocorrências seria identificado, processado e não receberia qualquer valor investido de volta.

“As redes sociais passaram a ser inundadas por milhares de reclamações em inúmeros sites, dezenas de páginas sociais e grupos criados no Brasil e em outros países, buscando recuperar o dinheiro investido, tudo sem sucesso, com uma sequência infinita de discursos dos organizadores do esquema criando novas narrativas de problemas no mercado de criptomoedas, prejuízos financeiros, problemas nos sistemas e sites da empresa e de que iriam pagar os valores com um novo sistema em desenvolvimento, além de notícias constantemente lançadas de que alguns investidores estariam normalmente transacionando e recebendo valores junto à empresa, buscando manter a captação ilegal de recursos”, frisou a Polícia Federal.

“O objetivo da operação é desmobilizar completamente a organização criminosa, impedindo que continuem a efetivar golpes através da prisão preventiva de seus líderes, suspensão das atividades das empresas e ampla divulgação à sociedade a respeito do risco desse tipo de negócio nas redes sociais, bem como realizar a descapitalização e buscar o ressarcimento dos recursos subtraídos aos lesados”, complementou a instituição.


Foto: PF / Divulgação / CP


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