Fase confirma que unidade para adolescentes de perfil menos agressivo não reabrirá até o fim de 2024

Fase confirma que unidade para adolescentes de perfil menos agressivo não reabrirá até o fim de 2024

Centro de Atendimento Socioeducativo Porto Alegre 1 deve fechar as portas na próxima terça-feira

Marcel Horowitz

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Uma estrutura de 3,750 mil metros quadrados já chegou a receber 170 adolescentes infratores na Vila Cruzeiro, na zona Sul de Porto Alegre. Dentro do espaço, contudo, não há mais nenhum interno. "Provavelmente a casa será saqueada, por moradores de invasões no entorno", lamenta Edgar Costa, diretor do Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e Fundações do RS (Semapi).

Edgar se refere a uma unidade da Fundação de Atendimento Sócioeducativo (Fase) destinada para a internação de adolescentes com perfil menos agressivo, que deve fechar as portas na próxima terça-feira.

O diretor do Semapi conta que o encerramento do Centro de Atendimento Socioeducativo Porto Alegre 1, o 'Case Poa 1', gerou questionamentos em parte dos servidores. Afinal, segundo ele, esse é o único dos seis estabelecimentos da instituição onde internos de diferentes facções convivem em harmonia e que, há anos, não registra motins.

A questão chegou à Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa que, no final da tarde dessa quinta-feira, promoveu a vistoria do prédio.   

"Sou, em tese, contra o fechamento, pois acredito que o trabalho realizado no Poa 1 tem sido de excelência. Espero que os socioeducadores possam retornar ou que a sistemática aplicada por eles [no Poa 1] possa ser levada para outras unidades da Fase", declarou o deputado Leonel Radde (PT), que também é vice-presidente da comissão, referindo-se à metodologia de caráter pedagógico e menos punitivista, que permitia aos internos maior liberdade de circular pela estrutura, passando assim menos tempo enclausurados nos dormitórios.

O parlamentar não descarta a existência de defasagens na estrutura do prédio, conforme alegado pela diretoria da Fase — em nota divulgada exclusivamente aos quadros da entidade — como sendo um dos motivos para o fechamento da unidade. Radde, no entanto, aponta que a decisão foi tomada de forma pouco transparente e sem que houvesse diálogo com os funcionários. 

"Acredito que tenhamos servidores comprometidos e qualificados no Poa 1, por isso é importante que eles sejam ouvidos. A partir das demandas deles, espero que exista um espaço adaptado para que possam trabalhar com adolescentes desse mesmo perfil [menos agressivo]", declarou o político. "Se houver a compreensão que o espaço coloca em risco os agentes, então podem ser feitas adaptações no prédio para que eles retornem." 

A diretora socioeducativa da Fase, Cláudia Redin Patel, reconhece que houve falta de diálogo entre gestão e servidores na tomada de decisões. Não obstante, ela enfatiza que a arquitetura do prédio coloca em risco a segurança de trabalhadores e internos, principalmente por não dispor de espaços de isolamento adequados. 

"Essa estrutura não atende aos parâmetros do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). A arquitetura deveria contemplar um espaço humanizado e que tivesse módulos e setores mais isolados, contemplando também cursos, atendimentos técnicos e quadras poliesportivas", afirmou ela. "Atualmente, em casos de intercorrência disciplinar ou de manejos de risco, os adolescentes conseguem enxerga uns aos outros. Isso potencializa essas situações."
 
Ainda de acordo com Cláudia, após um ano, há chances do Poa 1 voltar a receber internos." Temos um plano de manutenção do prédio. Nossa proposta é a suspensão de um ano do programa, quando será feita uma avaliação. Temos a possibilidade de reutilizar esse espaço, mas isso vai ser dialogado entre gestão e servidores", destacou. 

A diretora também negou que o esvaziamento do Poa 1 tenha sido feito às pressas, conforme alegado por servidores, por conta da visita parlamentar. "Isso não procede. Temos uma relação dos relatórios de transferência, que foram protocolados há 30 dias. Conforme a juíza [ da 3º Vara da Infância e da Juventude] foi despachando e deferindo isso, fomos movimentando os adolescentes. Todo o procedimento foi feito antes da visita [parlamentar] e os adolescentes foram ouvidos antes, pela Defensoria Pública", disse Cláudia, acrescentando que os internos transferidos vão continuar realizando cursos, adaptados para outras unidades.

Alessandra Maia, representante do Semapi no Poa 1, contesta que a falta de espaços isolados na casa potencialize situações de risco. O que ocorre, explica ela, é justamente o contrário. Em outras palavras, a proximidade entre os adolescentes em um mesmo ambiente facilitaria a criação de vínculos entre eles, prevenindo episódios de violência.   

"O trabalho baseado no vínculo entre internos e trabalhadores, em uma rotina em que os jovens ficam ocupados com diversas atividades, foi a forma que conseguimos evitar agressões e outras situações mais graves", enfatizou a socioeducadora. "Historicamente, essa sempre foi a casa de menor contenção e, mesmo assim, apresentou menos motins. Em 25 anos, foram apenas dois motins, sem nenhum funcionário agredido e nem fugas, diferente do que ocorreu em unidades mais fechadas e supostamente mais seguras."

Contatada pela reportagem, a assessoria de comunicação da Fase informou que está realizando um mapeamento sobre o funcionamento das unidades. A instituição destacou que, quando o levantamento for concluído, detalhará publicamente os encaminhamentos. 

Leia a nota da Fase: 

A Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) informa que está realizando um mapeamento sobre o funcionamento das suas unidades.

O levantamento leva em conta a rotina, população atual, vagas disponíveis, corpo de servidores, entre outros. 

Quando concluído, a Fase detalhará publicamente os encaminhamentos.


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